terça-feira, 23 de agosto de 2016

As Cem Ovelhas



Prólogo

Inverno, um rigoroso inverno em Jerusalém. Pela manhã é costume do velho Tobias fazer a contagem de suas ovelhas, porém não suportando o vento cortante ele enviou seu ajudante Baasa a fazer o serviço. Mesmo resmungando o jovem de rosto marcado pelo trabalho deixou a casa enrolado num tipo de cobertor. Olhou para o céu e depois para o campo.
- Desse jeito irei congelar aqui fora.
Baasa caminha com dificuldade devido o vento que bate com força em seu rosto. Até chegar onde as ovelhas estão ele levou um certo tempo. A pequena cabana fica a alguns metros da casa de Tobias. O jovem ajudante retira a tranca que emite um ruido de dar nervoso. Ainda reclamando Baasa abre a porta sentindo o odor forte que vem lá de dentro.
- Argh! - coloca a mão na boca para evitar o vômito. - Deus!
O menino é tralhador, mas gosta de se divertir também. Ao ver uma vara apoiada nas madeiras ela a pega e começa a lutar com um adversário invisível como se fosse um guerreiro.
- Venham seus Romanos covardes, vou livrar o meu povo de suas garras.
Baasa foi deixado por seu pai na casa do velho Tobias para que o garoto aprendesse o trabalho de cuidador de ovelhas. Claro que o jovem magrelo odiou a ideia, tudo o que ele queria ser era um aventureiro ou músico. Agora a realidade é outra, Baasa precisa contar as ovelhas. Ele deixa a vara de lado e se dirige aos animais.
- Vamos lá!

Tobias mexe na barba branca como neve quando Baasa entra desesperado junto com o vento frio.
- Mestre Tobias, uma sumiu.
- O que? - o velho se ergue.
- Estou falando, uma de suas ovelhas sumiu, só há noventa e nove. - diz ofegante.
- Você contou direito?
- Está duvidando meu senhor, claro que contei, duas vezes até.
Tobias se levanta, pega seu cobertor.
- Vamos procurá-la.

1

Todos estão em silêncio, menos Pedro que aperta os dentes de raiva.
- Pedro, pare com isso! - diz Jesus.
- Mas, Senhor, quase foi apedrejado, como posso me acalmar?
- Estamos correndo perigo aqui rabino. - pondera Judas. - realmente os Judeus não acreditam no senhor.
- Sei disso, eles não acreditam por que não são minhas ovelhas, foi o que eu disse a eles lá no templo, minhas ovelhas ouvem minha voz.
- Bom, o que iremos fazer agora? - pergunta João.
Jesus se adianta.
- Vamos para além do Jordão, estão lembrados de onde João batizava?
- Sim ,senhor! - responde Tiago.
- Peguem suas coisas e vamos para lá. - ordena Jesus.

Tobias e Baasa procuram pela ovelha perdida com preocupação. O velho fazendeiro olha para a montanha e fecha os olhos.
- Será que ela fugiu para as montanhas?
- Se o senhor quiser posso ir até lá.- Baasa esfrega as mãos.
- Com certeza morreras congelado antes de achá-la. - anda até o cercado. - fora os animais selvagens que existam lá
- Posso levar uma faca ou…
- Nada disso, você é muito novo para mexer com armas.
- Sei sim, ando praticando lutas de espadas.
Tobias sorrir e olha para seu ajudante.
- Então você queria ser aventureiro? - mexe na barba.
- Sim, ou talvez um rebelde para matar os romanos.
- Tire isso da cabeça Baasa, qual o futuro de um rebelde?
- Fama, imagine o povo falando, Baasa, o libertador de nosso povo. - aumenta o tom da voz.
Tobias meneia a cabeça.
- O futuro de um revolucionário é prisão ou morte, essas pessoas não são bem-vindas aqui, os romanos são implacáveis com esse tipo de gente. Seu pai confiou seu futuro a mim.
- Criador de ovelhas?
- Isso mesmo, é uma profissão promissora você não acha?
- Não sei. - coça a cabeça. - vamos procurar.

Jesus se apoia numa pedra e a seu lado Pedro junta alguns gravetos.
- O que acha de uma fogueira?
- Muito bom, o frio só vai piorar daqui pra frente, estão com fome? - Jesus aperta os braços contra o corpo.
- Temos alguma coisa aqui, mas não vai durar muito. - Filipe abre uma das bolsas.
Passos são ouvidos e Tomé coloca a mão em uma pedra solta. A tensão aumenta e os corações aceleram quando um homem maltrapilho segurando seu braço esquerdo aparece no meio do mato alto.
- Sou de paz, sou de paz, preciso falar com ele. - aponta para Jesus.
- Está armado? - grita Pedro.
- Não. Mal posso aguentar meu braço. - faz uma careta.
Jesus se levanta batendo a terra do manto.
- Se aproxime, o que deseja?
O homem olha para os doze e depois para Jesus.
- Mestre, sou trabalhador do campo, preciso dos meus braços perfeitos para conseguir levar o sustento para minha família, porém desde a semana passada fui a cometido de um mal nesse braço que me impede de trabalhar, minha esposa e filhos estão passando fome em casa, me ajude por favor.
Jesus olha para o braço esquerdo do estranho.
- O que aconteceu com ele?
- Não consigo pegar uma pedra sequer. - diz o homem massageando o membro.
Cristo anda até próximo de Tomé.
- Pegue essa pedra. - mostra.
Sem hesitação o sujeito a pega e se emociona.
- Senhor!
- Vá para sua família e mostre que já consegue trabalhar. - se volta para Filipe. - dê a ele alguns pães.
- Sim senhor! - o discípulo retira da bolsa dois pães. - tome.
- O brigado, muito obrigado, Jesus, obrigado a todos vocês. - se afasta.
Quando o estranho se afasta de vez Judas faz um comentário com Bartolomeu.
- Tirou o nosso pão e deu a um estranho, as vezes não o entendo.
- E o que você faria no lugar dele?
- Só o milagre bastaria. - Judas se escora na rocha.

Pedro em fim consegue acender a fogueira. Os doze se esquentam e comem ao redor das chamas quando Jesus começa a cantar. Os apóstolos se olham e depois de alguns minutos eles também e bem alto.

2

Baasa e Tobias continuam com as buscas. O velho, bastante cansado respira com dificuldade e se abaixa para descansar. Ao ver seu mestre passando mal de cansaço, o garoto volta.
- Mestre, o senhor está bem?
- Só um pouco cansado, não podemos parar agora, preciso daquela ovelha.
- Admiro sua disposição senhor.
- Acho que devemos ir até o Jordão, quem sabe ela não foi beber água. - o velho se ergue.
- Sim, vamos. - passa o braço de velho mestre por seu pescoço.

Uma família se apresenta a Jesus com uma criança de colo que não consegue respirar direito.
- Ela está assim desde ontem, fomos procurar o senhor, mas não o achamos – diz o pai.
- Deixe que eu a segure. - Jesus estende os braços e sua mãe a coloca no colo do mestre. - ela é linda não acham? - pergunta aos seus discípulos. - quer segurar pai? - o pai a segura e a menina está respirando.
- Glória a Deus. - diz o pai.
- Nós conhecemos João o que batizava. - comenta a mãe. - ele não fez sinal algum, mas tudo o que ele disse sobre o senhor é verdade, nos aceite como seus seguidores, por favor.
- Prazer em recebê-los, sejam salvos.
- Obrigado mestre. - o pai aperta o ombro de Jesus.
Quando terminou de despedir a família Jesus pediu para que colocassem mais lenha na fogueira.
- Temos que ficar aqui, muitos ainda viram, aproveitem para ajudar também, vocês conseguem.
- O próximo serei eu rabino. - se adianta João.
- Nada disso. - se acomoda em uma pedra. - Judas, você vai ajudar o próximo que vir. - Judas olha para Jesus com espanto.
- Eu?
- Sim, sei o que se passa em seu coração, você acha que só o milagre é o suficiente, então se se acha capaz de operar maravilhas sinta-se à vontade. Veja, vem vindo mais ali, vá lá. - os outros riem.
Judas sorrir e anda na direção da pessoa. O homem conversa, gesticula e se derrama. O discípulo o ajuda a se levantar. Todos acompanham com atenção o desenrolar da conversa. Depois disso o homem vai embora e Judas volta com uma expressão séria.
- O que houve? - pergunta André.
- Ele tinha asma.
- E ai? - quis saber Mateus.
Judas olha para o mestre que o fita também.
- Ele está bem agora. - todos comemoram.
- Quem diria, o nosso amigo mal humorado fazendo maravilhas. - brinca Filipe.
- Viu, todos podem ajudar. - Jesus se levanta para aquecer as mãos na fogueira. - então, quem será o próximo? - todos levantam a mão começando uma pequena confusão. - tudo bem, tudo bem, João estava na fila, vá você João.
- Obrigado, mestre.

Tobias e Baasa se aproximam do Jordão e avistam o grupo de homens. O velho faz uma meia parada e olha para seu aluno.
- Serão salteadores? - pergunta Baasa.
- Acho que não, eles estão muito a vista de todos, vamos perguntar se viram a nossa ovelha.
Tobias chega perto e é recepcionado por outro jovem, João.
- Como tem passado senhor, em que o mestre pode ajudar?
- Sou Tobias e esse é meu aluno Baasa, estamos procurando uma ovelha, vocês a viram?
- Não, não vimos nada.
- Quem é seu mestre? - pergunta Baasa.
- Jesus, aquele ali sentado.
- Já ouvi falar nele, por um acaso é o mesmo que deu peixe e pão para uma multidão? - Tobias mexe na barba.
- Ele mesmo.
- Posso falar com ele? - Tobias continua mexendo na barda.
- Sim claro.
Jesus termina de contar um caso e todos riem quando João chega com os estranhos
- Mestre, esses são Tobias e seu aluno Baasa, querem falar com o senhor.
Jesus se levanta se ajeitando.
- Como tem passado?
- Não muito bem. - Tobias admira a Jesus. - sempre achei que você seria um pouco mais velho.
- O que o traz aqui?
- Perdi uma de minhas ovelhas, estamos loucos a sua procura, por um acaso não a viu?
- Não, mas podemos ajudar a procurar. - Cristo olha para seus discípulos.
- Não quero atrapalhar, você deve ser um homem bastante ocupado creio eu.
- Que nada, será uma boa aventura. - nesse momento todos ficam atentos.
- Seus homens são obedientes, quem dera todos os meus fossem assim. - olha para Baasa. - não é?

3

O grupo estava saindo do Jordão quando um homem num cavalo para perto deles. O cavalheiro olha para Jesus e desce do animal.
- Estava a sua procura, fui enviado por Marta e Maria, Lázaro, seu amigo está muito doente e eu acho que é para morrer.
Os apóstolos e os outros ficam atônitos.
- Essa doença não para matar a Lázaro, mas sim para que o poder de Deus se manifeste. Vá e diga isso a elas.
- O senhor não vem? - se espanta o homem.
- Tenho coisas a fazer por aqui. - olha para Tobias. - diga a Marta e Maria que está tudo bem.
O sujeito sobe no cavalo e os deixa. Tobias em seu coração o admira ainda mais. O vento frio continua a castigar e a passos largos os homens andam a beira do rio. Baasa vez por outra olha para Jesus e depois para seus seguidores “será ele um revolucionário?”
Ao chegarem a um certo ponto do Jordão Jesus para e diz.
- Temos que nos dividir. Pedro, vá com Tiago e João por ali.
- Sim senhor. - responde Simão.
- Judas, Filipe e André, vocês darão a volta. - Tobias mexe na barba encantado com o líder. - Bartolomeu, Tiago e Tiago, você ficarão na cidade, Mateus, Tomé, Tadeu e Simão fiquem aqui, certo?
- Entendido senhor. - respondem todos.
- Vou seguir com Tobias e Baasa até a fazenda, nos encontraremos lá ao anoitecer.
O grupo se divide. Jesus anda lado a lado com o velho fazendeiro. Enquanto caminham a conversa segue. Tobias gostou do jovem líder, da maneira como conduz seus seguidores.
- Sabe, Jesus, eu sempre fui um homem de autoridade e de palavra, o pai de Baasa confiou o filho dele a mim, tudo isso por que sempre gostei das coisas certas, nunca deixei faltar nada aos meus trabalhadores, os trato como filhos e filhas, sou influente no meio do comércio, religião e ricos, eles gostam de me ouvir.
- Lhe admiro por isso. - Jesus caminha com suas mãos para trás.
- Jesus. - começa Baasa. - o senhor pretende destruir os romanos?
- Baasa, por favor.
- Deixe-o Tobias, ele é apenas um garoto. Os romanos vêm causando dor e desgraça a todos, mas chegará um dia em que tudo isso se tornará uma antiga história.
Tobias olha ao redor observando o movimento das pessoas envolvidas em seus agasalhos. As palavras de Jesus entram em seus ouvidos com suavidade e transparência. Tudo o que o mestre diz soa com verdade e sabedoria.
- Posso lhe fazer uma pergunta, Jesus? - Tobias para a caminhada.
- Até duas.
- Como fez tudo aquilo em Tiberíades?
Jesus sorrir.
- As pessoas estavam com fome, eu apenas as alimentei.
Baasa solta uma gargalhada.
- Com sobra de pão e peixe!
- Baasa, que comportamento é esse? - o puxa com truculência.
- Calma, velho amigo, o garoto disse a verdade, era só o que tinha.
Tobias aperta os olhos.
- Mas, havia uma multidão e até crianças.
- Sim. - Cristo recomeça a caminhada. - meu Pai se manifestou naquele momento, através de mim.
- Seu pai? - volta a mexer a barba.
- Fui enviado a esse mundo para trazer a luz de meu Pai que está no céu.
Tobias fica constrangido.
- Não está dizendo que é o Messias enviado, está?
Jesus apoia a mão no ombro do fazendeiro.
- Vamos procurar sua ovelha.

4

Judas é o que mais reclama e questiona a decisão de Jesus. Para ele, o mestre deveria partir imediatamente para Betânia e socorrer o amigo que tanto ama.
- Estamos perdendo tempo. - resmunga mais uma vez. - essa ovelha já deve ter sido pega por outro.
- Judas. - diz Filipe. - tem como você ser mais otimista?
- O mestre nos deu essa missão e devemos cumpri-la.
- Bela missão, procurar uma ovelha de um rico soberbo. - arremessa uma pedra no rio. - sabem de uma coisa, eu as vezes acho que estamos seguindo o homem errado.
Todos param de andar. André segura Judas pelos ombros.
- Irmão, você está duvidando do homem que já provou que é o enviado da parte de Deus, que curou um cego de nascença e alimentou uma multidão,
- Que andou sobre as águas, você estava lá, Judas. - completa Filipe. Judas abaixa a cabeça.
- Se ele realmente é o Messias, só o tempo dirá.

Jesus, Tobias e Baasa chegam a fazenda. O dono do lugar convida o mestre para que entre e se abrigue do frio que aumentou.
- Obrigado pela hospitalidade Tobias.
- Mestre Jesus, e seus seguidores? - pergunta Baasa.
- Eles acharão o caminho.
A fazenda de Tobias é de médio porte, além da criação de ovelhas, ele também cria cabras e conta com ajuda de cinco funcionários. O trio anda até os fundos da casa de onde há uma bela vista do Jordão.
- Meu pai e eu costumávamos observar o pôr do sol daqui. - Tobias se debruça na cerca.
- Realmente é lindo. - Jesus sorrir.
Baasa se afasta para procurar a ovelha perdida e Tobias aproveita para ir mais fundo nas perguntas.
- Jesus, sendo você o Messias, como você mesmo diz que é, por que ainda não destruiu os romanos?
Cristo hesita um pouco em responder. Sem olhar para o velho de rosto coberto por rugas, o filho de Maria se apoia na cerca de madeira.
- Minha missão aqui não é destruir, meu caro Tobias e sim salvar.
- Sim, claro, salvar aqueles que são oprimidos pelos malditos romanos.
- Eu vim a esse mundo para libertar a todos de um mal maior que o império romano. - finalmente Jesus olha para o fazendeiro. - a morte.
- A morte? - volta mexer na barba.
- A morte espiritual.
O vento bate no rosto do velho deixando seus cabelos esvoaçantes.
- Explique isso melhor!
- Se me permite, gostaria muito pousar em sua casa, ai poderíamos usar o tempo para que eu explique isso melhor, o que acha?
- Adoraria!

Em outra parte, Pedro, Tiago e João se empenham em procurar a ovelha. O lugar é cercado por pequenas casas e a pouco comércio por ali. Tiago e João já reclamam de fome, Pedro olha para os dois com sinal de reprovação.
- Acho melhor pararmos para comer alguma coisa, Pedro. - sugere Tiago
- Jesus nos deu uma missão, você se esqueceu?
- Pedro. - começa João. - você viu e ouviu, o mestre tem uma missão ainda maior, ir até Betânia e curar a Lázaro.
- Jesus deve saber o que está fazendo. Cabe a nós obedecê-lo. - olha para um minúsculo beco. - vamos por ali.

5

A noite chega e todos estão reunidos ouvindo o mestre falar, inclusive Baasa que presta bastante atenção a cada palavra.
- A verdade é a única coisa capaz de libertar alguém, ela também é responsável por escândalos, dependendo do momento, a verdade pode causar danos, mas. - fala com o indicador em riste. - jamais podemos deixá-la de lado.
Baasa levanta o dedo pedindo a palavra.
- Mestre, e se estivermos com medo, temos que dizê-la mesmo assim?
- Sim! - Jesus é bastante categórico.
- Jesus. - Tobias pede a palavra desse vez. - fala sobre sua missão.
Durante algumas horas o mestre explicou sua missão a qual prendeu atenção de todos. Ele falou sobre a fundação do mundo, qual era o propósito inicial de Deus, falou sobre Adão e Eva, os reis, juízes e também sobre o rei Davi.
- Foi ai que meu Pai, que mora no céu me enviou a esse mundo para salvá-lo.
Houve um silêncio naquela parte da casa. Tobias olha para Jesus e sente seu coração acelerar, “seria ele o messias?”. Ele também olha para seus apóstolos e consegue ver nos olhos de cada um deles a devoção.
- Jesus, vamos descansar, venha, vou lhe mostrar seus aposentos.
Pedro se levanta.
- Mestre, temos que partir logo cedo para Betânia.
- Ainda não encontramos a ovelha.

O dia mal amanheceu e Jesus e seus discípulos junto com Baasa já estavam em busca da ovelha. A subida até o cume do monte foi exaustiva. Cristo e Pedro vão a frente conduzindo o restante. Lá de cima é possível ver toda a extensão do povoado. Jesus se sentiu inspirado e pediu para que todos se sentassem. Fechando os olhos, o filho de Deus fez uma oração por todo o povo perdido de Jerusalém. Depois disso começou a ministrar algumas palavras ao pequeno grupo de homens. Baasa ficou boquiaberto com a sabedoria do santo homem a sua frente. Seu coração se encheu de desejo de segui-lo. Ao término da palavra os aventureiros seguiram com a missão. Lá em baixo Tobias e mais alguns empregados também procuram a centésima ovelha. Ao meio dia todos estão reunidos dentro da casa do fazendeiro rico. Tobias lamenta o sumiço de seu animal. Judas inflama a todos quanto a Jesus demorar a ir até Betânia.
- A essa hora Lázaro já deve estar morto e sepultado. - resmunga perto de Pedro.
- Fique quieto, ele sabe muito bem o que está fazendo. Agora coma.
Tobias agradece a todos pela preocupação quanto a ovelha.
- Jesus, muito obrigado por ficar e me ajudar, infelizmente meu animal não apareceu.
- Não diga isso Tobias, nunca é tarde para recomeçar.
- Quando iras partir, mestre? - pergunta Tobias.
- Ainda hoje, mas antes quero conversar com seu funcionário.
Baasa arregala os olhos.
- Comigo?
- Sim, com você, pode ser agora?
O garoto engole o pão a seco.
- Tudo bem.
Jesus e Baasa se retiram deixando o restante com um ponto de interrogação.
Lá fora o vento diminuiu, mas o frio continua. Lado a lado eles andam até o celeiro.
- Diga, mestre!
- Vejo em você um seguidor fiel, sabia disso? - Cristo passa o braço pelos ombros do jovem.
- Verdade?
- Verdade, mas antes você precisa agir com a verdade, lembra quando falei em ser verdadeiro?
- Como poderia esquecer. - reponde cortando as palavras.
- Então, não importa o que irá custar, devemos agir sempre com verdade. - eles param na porta do celeiro. - me mostre onde escondeu a ovelha.
- O que? - Baasa olha para Jesus com espanto.
- Baasa, na realidade ela não sumiu, você a escondeu, agora seja homem de verdade e me mostre.
O garoto cora as bochechas e faz beicinho.
- Me perdoe, por favor, eu estava saturado dessa vida de mordomo, queria ser revolucionário assim como o senhor, quero destruir os romanos.
Jesus o segura pelo rosto.
- Baasa, Tobias te ama e quer fazer de você um homem, e tem conseguido, agora cabe a você correspondê-lo. Por isso que fiquei aqui com vocês, eu sabia desde-o início que você tinha algo a ver com a história, agora, se quer realmente me seguir, você precisa dar um jeito nisso.
O menino ergue a cabeça e olha Jesus nos olhos.
- Pode deixar mestre, vou agir com a verdade.
- Você é um bom garoto. - o abraça. - seja bem-vindo aos salvos, a partir de agora você precisa converter o coração de Tobias, tudo bem?
- Tudo bem.
- Vou embora agora junto com meus amigos, fique em paz.

Mais tarde, no portão principal da fazenda a despedida é emocionante.
- Outra vez, obrigado mestre Jesus. - Tobias aperta a mão do mestre.
- Fique na paz. - olha para os apóstolos. - vamos.
Um pouco mais a frente Jesus faz uma meia parada.
- Devemos voltar para a Judeia. Nosso amigo Lázaro dorme, mas irei para despertá-lo.
Pedro se adianta.
- Mas, se ele está dormindo, ele está salvo, não há problema.
Cristo fecha os olhos.
- Lázaro morreu!
Todos ficam em silêncio. Judas olha para todos inclusive para Pedro. Jesus abre os olhos.
- Temos que ir, ainda temos dois dias de caminhada, vamos, por aqui.

NOTA DO AUTOR: Escrever esse conto foi muito gratificante por que sempre gostei de criar situações. Eu sempre quis saber o que prendeu Jesus naquele lugar antes de ir ressuscitar a Lázaro, seu amigo. Adorei os personagens que criei, Tobias e Baasa, adorei a trama, em fim, gostei da minha história, espero que gostem.

AS CEM OVELHAS
Baseado no evangelho de João 10.40 ao 11



terça-feira, 16 de agosto de 2016

Guerra Declarada - Nação de Vampiros



PRÓLOGO


        Uma criatura noturna foi capturada e amarrada com cordas grossas e deitada no meio de um campo de futebol. Ao seu redor vários homens com seus uniformes camuflados portando fuzis e metralhadoras. Um sujeito alto, imponente, vestindo o mesmo uniforme e com sua boina verde oliva, abre caminho no meio do pelotão, olha para a criatura e se inclina para falar com o monstro de grandes caninos.
        - Vamos logo com isso seu miserável sugador de sangue, fale logo o que seu líder pretende?
        O bicho solta grunhidos indecifráveis e tenta inutilmente morde o militar:
        - Senhor, o restante do grupo caiu e só restou a gente, eles estavam em maior número.
        - Tudo bem soldado. – volta a olhar para o ser que saliva pelos cantos da boca. – vamos tentar de novo, acho que ele não está entendendo muito bem. – chuta a costela do animal que urra de dor. – fale logo, o que seu chefe pretende? – vocifera.
        - Vão todos morrer!
        - É isso, ele quer guerra não é? – o militar pisa no tórax do noturno. – então é guerra que ele vai ter.
        - Senhor, posso cravar a estaca no peito dele? – pergunta o sargento. O capitão consulta seu relógio de pulso.
        - Não, daqui á duas horas o sol vai nascer, vamos deixar que ele tenha uma morte lenta e dolorosa. – cospe.
        O pelotão reduzido vai se afastando enquanto o vampiro amarrado e deitado no centro do campo grita a plenos pulmões palavras de maldição.
         - Todos morrerão, todos, todos morrerão!

1

         Na sala de reuniões o silêncio é o que fala mais alto. Na ponta da grande mesa oval vestido com seu uniforme caqui, o comandante do exército espera a chegada do capitão Olavo, a espera estão também outros velhos oficiais. O silêncio é quebrado com o girar da maçaneta.
         - Me desculpem a demora senhores. – Olavo está acompanhado do tenente Dias. – tivemos contra tempos.
         - Sentem-se senhores, serei breve. – pigarreia comandante Neves. – de acordo com informações que recebemos, esses vampiros vieram de uma ilha isolada aqui mesmo na América do sul, mais precisamente na Argentina. Algo aconteceu e eles migraram para o nosso país causando todo esse caos a mais ou menos á dois anos. – Neves mexe em alguns papéis. – o número de ataques vem crescendo dia a pós dia e também, o número de vitimas se transformando uma dessas criaturas chega ao absurdo de quase vinte mil, isso até ontem, não tenho aqui as atualizações. – Dias pede a palavra.
        - Senhor, se me permite, aqui estão elas, as atualizações.
        Rapidamente Neves coloca seus óculos de leitura e o desanimo e visto no rosto coberto por rugas do militar por todos.
        - Senhores, uma medida deve ser tomada urgente, chegamos a 50 mil, se continuar assim os próximos seremos nós. – os militares se entreolham. – capitão Olavo, o senhor a partir de agora é o líder do pelotão que enfrentará corajosamente esses vampiros e saiba. – faz uma pausa. – tem meu apoio em tudo que fizer, em qualquer decisão que tomar. – Olavo engole seco.

2

        Durante o dia a vida dos civis segue tranquila, mas, ao cair da noite todo o cuidado é pouco. Quem pode ou quer, anda com crucifixo pendurado no pescoço. O alho nunca foi tão consumido no país. Á dois anos o Brasil foi invadido por vampiros violentos em busca de sangue fresco. O líder da tropa funesta se chama Garcia, ele comanda os ataques e nem os animais são poupados. Além de capturarem pessoas para saciarem a fome, eles as sequestram e as adormecem como um encanto demôniaco. E logo em seguida as morde fazendo dessas pessoas novos vampiros soldados.
         Na gruta que fica escondida as margens do mar, Garcia aprecia a beleza de uma moça captura que dorme envolvida numa espécie de rede.
         - É bastante bela, me faz recordar de Alexandra.
         - Alexandra? – pergunta um de seus súditos.
         - Sim, Alexandra, como era bonita, se não fosse aquele maldito caçador ela estaria aqui a meu lado.
         - Caçador?
         - Sim, Davi, ele transformou nossa vida num terrível pesadelo, eu o temia, era forte, habilidoso, caçava com sua espada de prata. – uma lágrima escorre. – foi com aquela maldita espada que Davi atravessou o corpo de Alexandra. Desgraçado.
         - O que aconteceu com esse Davi?
         - Morreu de velho, cassou até não poder mais.
         Os longos cabelos negros de Garcia cobrem seu rosto bonito devido ao forte vento na boca da gruta. Sua vestimenta rasgada quase em farrapos ajuda a aumentar seu terrível aspecto. Olhando o imenso mundo negro que é o mar por causa da densa noite, o vampiro líder pretende guerrear contra os seres humanos e fazer do país sua nação, a nação dos vampiros. Por isso ele vem recrutando o maior número de pessoas possível. Certamente aquela bela jovem será um de seus soldados.
         - A guerra vai começar, mas antes disso precisamos nos alimentar, saia e vá buscar comida.

3

         A assadeira com pedaços generosos de frango é posta na mesa da família Campos. Miriam percebe que seu marido sequer tocou na comida.
         - Olavo, a comida vai esfriar, amor.
         - Estou sem fome. – mexe com o garfo.
         - Problemas no quartel?
         - Sim, fui nomeado líder do pelotão que vai lutar contra os vampiros. - Miriam muda sua expressão.
         - E por quê estou sabendo disso só agora?
         - Miriam, por favor, não vamos começar uma discussão na frente dos meninos né?
         - Sou sua esposa Olavo, preciso saber o que se passa com você. – Miriam puxa sua cadeira.
         - O papai vai pra guerra mamãe?
       - Coma sua comida Lavinho.
       Cortando a coxa do frango, Olavo é fuzilado pelos olhares de Miriam. O casamento não anda bem das pernas já faz algum tempo. Juntos á 15 anos, o casal caiu na rotina. Com a chegada de Olavo Junior e logo depois de Marcos uma gravidez indesejada por Miriam, as coisas só pioraram. As brigas aumentaram consideravelmente chegando ao ponto de agressões físicas e verbais. Miriam é do tipo de mulher que não aceita se submissa, adora mandar e de tomar decisões sem consultar o marido. Olavo por sua vez é um sujeito autoritário, talvez por ser militar, gosta de ver as coisas em ordem e não admite falhas.
       - Vou sim para a guerra filho, e você terá orgulho do papai. – acaricia os cabelos do garoto.

4

       O vulto circula as árvores. Com o balançar das folhas por causado forte vento é quase impossível ouvir seus passos. A sua futura vitima, uma mulher que anda por ali segurando seu crucifixo, não sabe do risco que corre passando entre as amendoeiras plantadas na beira da estrada. Mesmo com os avisos de que aquela área é considerada perigosa, a mulher caminha, frágil, amedrontada, até mesmo o menor dos insetos poderia fazer com que seu coração venha á boca. Ela para, algo pendurado nos galhos das amendoeiras faz seu corpo congelar. O vampiro saliva só em pensar que daqui a alguns instantes ele estará tomando o sangue quente.
        Sentindo o perigo ela inicia uma corrida entre as árvores. Um filme passa em sua mente, os avisos, os alertas de sua mãe, os parentes que foram mortos pelos noturnos. Sua respiração se torna ofegante talvez pelo fato de ser fumante desde os quinze anos. Ela para buscando ar. O vulto salta de uma árvore para outra como num passe de mágica. Agora ela tem certeza, um vampiro a persegue. O chora é contido – não é hora de chorar Patrícia – retirando os sapatos e os jogando no canto Patrícia lembra uma velocista. Devido ao cansaço e o medo ela tropeça de maneira que seus joelhos foram obrigados a sustentar seus 64 quilos. As feridas sangram e ardem. O sangue misturado a terra não impediu que o cheiro chegasse ás narinas de Sergio o vampiro que a persegue. Ao ver sua vítima caída ele vê a oportunidade de tê-la só para ele. O salto é preciso, fatal, violento. Sergio deixa que seu peso prenda a frágil mulher no chão. Os caninos são cravados na jugular. O sangue começa a escorrer pela garganta queimando.
       - Sua miserável, argh! – Sergio a solta e como um cão agonizando rodopia segurando seu próprio pescoço. – desgraçada. – tenta cuspir.
       Santa sopa de alho. Santos conselhos da mamãe. Antes de sair de casa mesmo com os protestos da família, sua mãe forçou-lhe a tomar uma suculenta sopa de alho. Agora, mesmo ferida ela conseguiu vencer o vampiro que com curtos espasmos vai se transformando num monte de cinzas incandescentes. Certamente o alho cortou o efeito que a transformaria numa vampira.
       Segurando firme os orifícios causados pela mordida no pescoço pelos caninos de Sergio, Patrícia continua sua caminhada com passos vacilantes e joelhos feridos.

5

        No centro de treinamento do exército, um grupo de 50 homens pratica tiro á longa distância. O barulho é quase ensurdecedor. Olavo e Dias observam cada um e anotam tudo.
        - Precisamos de bons atiradores, não podemos desperdiçar balas de prata. – comenta Dias.
        - Depois que terminarmos aqui, quero dar uma olhada no grupo especial. – fala Olavo anotando alguns nomes na prancheta.
        O grupo especial ao qual capitão Olavo se refere são os homens irão para a guerra utilizando espadas de prata e escudo. São homens que estão sendo rigorosamente treinados para o combate corpo a corpo. Olavo adentra ao ginásio onde há 60 homens praticando luta com seus quimonos pretos e atrás o brasão do exército. Ao verem o líder o empenho melhoras cem vezes mais.
        - Se a guerra começasse agora, com quem eu poderia contar instrutor? – pergunta Olavo.
        - Com todos senhor! – afirma o oriental com cerca de um metro e sessenta de altura.
        - Ótimo, eles são os meus trunfos, ou melhor, a esperança de uma nação.
        - Meus homens querem e vão dar o sangue por esse país capitão.
        - Legal, posso escolher qualquer um para um desafio? – Dias franze a testa.
        - Senhor, isso é certo?
        - Preciso saber com que vou trabalhar, Dias. – se volta para o instrutor japonês. – então, Miura, quem eu posso desafiar?
        - Eu sugiro o cabo Torres, ele é muito bom.
        - Ótimo, alguém do meu tamanho.
        Torres é avisado e instruído a não facilitar a luta contra o capitão. Ainda desconfiado, o militar negro pesando cem quilos de puro músculo se dirige para o centro do tatame onde seu capitão já se encontra sem a parte de cima do uniforme. Olavo mesmo beirando 45 anos ainda exibe boa forma física.
        - Lembre-se cabo, não vou hesitar em machucá-lo. – ameaça.
        - Como queira senhor!
        Sem mais delongas Olavo levanta sua guarda com a experiência de um pugilista e parte pra cima de Torres. O cabo estuda cada movimento do líder e tenta se manter distante. Olavo por sua vez espera uma brecha que o cabo não deixa. Vendo que seu oponente não dará chance, Olavo desfere um cruzado que passa em branco na bela esquiva de Torre que reage com outro cruzado acertando a fronte do capitão.
        - Capitão, o senhor está bem? – pergunta Dias.
        - Cale a boca Dias!
        Ainda estudando seu adversário, Torres anda em circulo com a guarda baixa. Olavo pressiona seu cabo o forçando a reagir. Com uma bela seqüência de JABs Torres vai minando o rosto imponente de Olavo. A esquiva do capitão não sai perfeita e Torres o acerta com um direto. A visão de Olavo começa a ficar turva e ele precisa ser forte para não cair. Outro direto e Olavo beija o tatame.
        - Senhor, não precisa lutar, já basta! – implora Torres.
        - O que vamos enfrentar. – se levanta. – é algo sobrenatural, pra eles tanto faz perder ou ganhar, já estão mortos mesmo, por isso, temos que treinar até sangrar entendeu cabo?
        - Sim senhor!
        - Agora, levante as mãos, vamos lutar.

6

        O cheiro de azedo no fundo da gruta é como se fosse um aroma do campo para Garcia que aprecia seus adormecidos. A fome que sente faz com que ele morda um homem que se encontra de cabeça para baixo. O sangue está frio, mas não importa, a fome é maior. Os outros vampiros circulam por ali grunhido e rosnando como feras. Ainda saboreando do sangue o vampiro chefe espera a volta de Sergio com seu jantar. Ao terminar de tomar todo o sangue do sujeito e suspeitando de que seu soldado já esteja morto, Garcia anda até a boca da gruta e seus olhos queima devido o sol. Rosnando ele rapidamente volta para o fundo da caverna úmida e escura:
      - Quero que saibam, Sergio é morto!
      - Como sabe disso senhor? – perguntam.
      - Os viventes são fatais, nos odeiam, por isso, quero alerta-los, não facilitam a vida deles no combate, se puderem arranquem também as suas almas. – o vampiro faz uma pausa. – essa noite sairemos dessa caverna maldita e iremos até eles.

7

      - O que quis provar Olavo? – pergunta Dias inclinado na maca onde o capitão se encontra em observação na enfermaria do quartel.
      - Nada!
      - Nada? O cabo lhe deu uma surra, nunca vi alguém apanhar tanto quanto o senhor apanhou hoje!
      - Tem ideia do que vamos enfrentar Dias, são demônios, eles não facilitarão em nenhum momento.
      - Mais capitão, o senhor ficou desmaiado e se não fosse a intervenção de Miura, Torres lhe mataria
      - É isso, eu quero assim, homens sem piedade, com gelo nas veias ao invés de sangue, o Brasil depende de nós, Dias. Se essa praga sair vencedora tudo estará perdido, eu não vou me tornar um soldado de Garcia, nem morto.
      O ódio é visível no rosto ferido de Olavo. O peso de suas palavras convenceram Dias que agora, mais do que nunca, passou a dar mais credibilidade ao seu superior. Dias deixa a enfermaria orgulhoso e também esperançoso.

8

      Olavo teve alta e ainda se recuperando fez questão de passar no alojamento onde estão concentrados os soldados que daqui algumas hora estarão frente a frente com os malditos noturnos falar com o cabo Torres. O mesmo ao ver seu superior entrar com o rosto ainda com alguns curativos, Torres pensou em se tratar de uma revanche.
      - Fique tranqüilo cabo, vim em paz e também. – estende a mão. – para lhe dar os parabéns e dizer que se sairmos vitoriosos eu juntamente com o sargento Dias iremos interceder para que você suba de posição, tudo bem? – petrificado Torres não sabe o que dizer.
      - Senhor...
      - Continue assim filho, é de homens corajosos que o nosso país precisa. – Olavo abandona o recinto deixando um Torres ainda mais nervoso e confuso.

***

      Logo chega a parte da tarde e junto com ela a preocupação. Olavo fez questão que todos os seus soldados permanecessem com suas famílias antes do sobrenatural combate contra os vampiros. No quarto, o capitão verifica pela ultima vez a mira de seu velho e bom arco e flecha quando Miriam entra e o surpreende abraçando lhe por trás.
      - Vê se não morre, por favor!
      Ainda sem entender o gesto da mulher, Olavo resmunga algo. Miriam continua ali grudada ao seu marido que por sua vez insiste em ajustar sua arma de combate. A crise no casamento deu uma esfriada no relacionamento. Por diversas vezes o capitão desejou trai-la, mas, o amor que sente por ela sempre foi maior que qualquer envolvimento extra conjugal. Miriam ainda é uma mulher bonita e bastante atraente. Hesitante Olavo se vira e fica frente a frente com ela. O beijo acontece, um pouco tímido e curto. Não satisfeita, Miriam força a situação, são quase duas semanas sem uma noite de amor.
     - E os meninos? – pergunta Olavo.
     - Estão no futebol, temos meia hora.
     - Então venha aqui. – a puxa contra seu corpo e finalmente o beijo acontece ardente e cheio de desejo.

9

     A despedida é sempre um momento cruel. Em meio aos longos abraços e choros, os oficiais permanecem firmes observando um grande mapa. Comandante Neves, sargento Dias e Capitão Olavo discutem a ofensiva.
      - Não podemos perder o efeito surpresa, esses bichos voam. – diz Dias. – nos atacarão pelo alto.
      - Vou enviar o esquadrão aéreo. – confirma Neves com seu habitual mal humor.
      - E os adormecidos dentro da caverna? – indaga Dias.
      - Eles estão praticamente mortos, a única coisa que podemos fazer e retira-los de lá para que tenham um sepultamento digno. – explica Olavo com o consentimento do comandante.
      - Olavo! – Neves o chama em particular. – não querendo jogar toda a responsabilidade em você, mas, já jogando, o Brasil está esperançoso, veja, toda a imprensa está aqui, então, faça o que for necessário para libertar o nosso país dessa praga amaldiçoada.
      - Estou disposto a dar a minha vida por isso senhor.
      - contamos com vocês!
      Do alto a imensidão verde oliva invade o pátio do quartel general. Os jipes, e outros veículos de combates já estão apostos esperando os corajosos militares. Toda a imprensa do país está cobrindo o fato que com certeza ficara na história da nação. A frente o capitão Olavo dá as ordens e palavras de incentivo.
      - Confio na capacidade dos senhores e creio que hoje será a prova de tudo que passamos em meses de treinamento. – no meio do mar de soldados está o cabo Torres que ao ouvir as palavras de seu líder não consegue conter uma lagrima que escorre. – somos a esperança de um povo sofrido, sofrido em vários aspectos, por isso lutem, lutem até não dar mais, lutem! – vocifera. Os brados ecoam por todo o pátio e imediatamente a ordem de partida é dada.

***

       Num sincronismo perfeito o pelotão de capitão Olavo vai abandonado o quartel e se dirigindo para a costa. Num blindado conduzido pelo cabo Torres, Dias e Olavo conferem mais uma vez o mapa. O capitão exige que os homens de frente não hesitem em atirar. A tomada da gruta terá que ser imediata e se for possível com o menor número de baixas. Pilotando o blindado, o cabo se sente orgulho e um filme passa em sua mente, de repente ás dificuldades que enfrentou antes de ingressar nas forças armadas se tornaram vivas, como se ele as tivesse vivesse naquele momento. Nem o barulho incomodo do motor do blindado foi capaz de fazê-lo esquecer do momento em que ele se despediu da família para enfrentar o rigoroso processo de seleção de uma semana no meio da floresta. Seu velho e saudoso pai o abraçou e o abençoou com essas palavras:
      - Dê o seu melhor, faça tudo de boa vontade e sairás vencedor!
      - Valeu coroa! – agradece com os olhos marejados.
      E com esses mesmos olhos marejados ele vai guiando o blindado de quase duas toneladas estrada a fora. Olavo vez por outra olha para o seu condutor e percebe nele uma certa emoção. Suas mãos pesadas e enormes repousam nos ombros do cabo que sorrir ao sentir o afago do líder:
      - Diga senhor?
      - Conheci sua história, você não está aqui a toa, não é mesmo?
      - É isso mesmo, senhor!
      - Conto com você cabo Torres!
      - Não vou decepciona-lo senhor!

***

      Na entrada da gruta Garcia organiza seu exercito lúgubre. Os longos cabelos negros os deixa ainda mais aterrorizante. Sua capa e suas botas gastas pelo tempo o tornam ainda mais poderoso diante de seu pelotão de noturnos.
      - Irmãos, o dia chegou, a vida humana está em nossas mãos, faremos dela uma grande nação dos seres que amam a noite. – sua gargalhada ecoa invadindo os ouvidos dos vampiros. Os amaldiçoados que estão á frente batem as asas e começam uma revoada meticulosa pelo céu negro da noite Brasileira.

10

       O som das ondas chicoteando as pedras amenizam a tensão vivida naquele momento. O bandeira Brasileira tremula no alto dos blindados com o forte vento que corre por ali. Em locais estratégicos os soldados aguardam ansiosos as ordens de Olavo que olha insistentemente para o céu com seus binóculos de visão noturna. Se alguns dos soldados o perguntasse se ele está com medo, certamente sua resposta seria que não, porem, o que sente verdadeiramente é uma mescla de medo e revolta e por que não dizer uma tênue vontade que isso tudo acabe logo. Imediatamente esses sentimentos se extirpam quando seus olhos atrás das lentes dos binóculos contemplam os bichos sugadores de sangue voando para o combate:
       - Em suas posições! – vocifera.
       Em menos de dois minutos os noturnos chegam ao costa com suas unhas e caninos afiados, sedentos por carne e sangue. O primeiro pelotão com suas flechas especiais disparam e vampiros são abatidos ainda no ar. Conforme vão sendo atingidos seus corpos se transformam em cinzas cobrindo o céu com nuvens de centelhas. Olavo também atira, uma das coisas que o capitão faz bem é atirar, quando aluno, foi o mais novo soldado a receber graduações por sua bela pontaria. A flecha acerta a testa de um vampiro que perde a direção de seu voo e atinge com força as pedras.
       Finalmente a nuvem funesta dos seres das trevas alcançam a praia. Os soldados são atacados com violência. A carnificina toma proporções maiores quando um bando de vampiros monstros também pousam nas areias do mar e devoram as carnes dos militares. Aos berros Dias ordena que o pelotão lança chamas entre em ação imediatamente. Cerca de vinte homens com galões de combustível nas costas iniciam uma ofensiva ateando fogo nos noturnos que não param de pousar na praia. Os clarões das chamam dão aos combatentes uma dimensão do que estão enfrentando, são vampiros com rostos desfigurados, verdadeiros demônios de caninos crescidos. O medo também é inimigo, alguns soldados abandonam seus postos e correm.
      - Seus bando de merda, fiquem e lutem. – grita Olavo ao ver um de seus homens correndo e logo em seguido tendo a cabeça mordida por um vampiro monstro. O capitão ainda tenta livra-lo da morte atirando sua flecha de ponta de prata. A pontaria perfeita de Olavo outra vez se mostra a seu favor, o olho do bicho é vazado transformando-o em cinzas.

***

       Garcia no ponto mais alto do rochedo observa o combate ansioso para entrar em ação. Segurando seu cajado o vampiro líder pretende utilizar um elemento surpresa para acabar de vez com os humanos.
        - O nosso exército tem um trunfo Olavo, espere e verás!

***

        Em terra a batalha continua violenta e rápida. Corpos de vampiros em chamas, soldados dilacerados, sangue e carne dão novas cores as areias da praia. Olavo e Dias buscam novas estratégias abrigados entre os blindados.
         - Senhor, estamos perdendo força! – alerta o sargento.
         - Mande o pelotão das espadas, agora e me arrume uma também.
         - Quer uma espada?
         - Sim, pratiquei esgrima á algum tempo. – se gaba Olavo.
         - O que mais o senhor sabe fazer? – brinca um soldado.
         - Churrasco de vampiro também é o meu forte.
         Pelo radio Dias chama o pelotão das espadas e escudo. Homens com armaduras similares a de soldados romanos estão apostos. As espadas reluzentes erguidas intimidam os vampiros. Os rosnados diminuem o volume e os olhos de flamejantes se tornam com velas no final do pavio.
         - Quem são esses miseráveis? – questiona um vampiro com rosto de homem.
         - Sei lá, vamos destruí-los.
         O ataque acontece simultaneamente com mordidas e unhas afiadas. As espadas cortam a carne pálida e podre com uma certa facilidade.
         - Cuidado irmãos, são espadas de prata. – vocifera um vampiro depois de ver um parceiro se transformando em cinza após ser retalhado.

11

         Toda a população acompanha pelos telejornais o grande embate entre humanos e vampiros. Miriam a esposa do capitão, devora as unhas só em imaginar que seu marido está frente a frente com criaturas diabólicas. Sua confiança é também um ponto forte. Ela acredita que Olavo trará a paz para o país junto com seus homens. Abraçada aos filhos diante da tela da TV, Miriam se pega falando com o criador, mesmo sendo ela descrente.
         - Por favor, que ele possa voltar para mim.

***

         A espada atravessa o peito do demônio que grunhe desesperadamente. Seu corpo logo se torna um monte de cinzas. Olavo realmente é um exímio esgrimista. Ao ver seu líder fatiando os inimigos noturnos com uma certa facilidade, Torres consegue sorrir ante aquela situação.
         - Boa meu capitão! – elogia o cabo.
         - Não perca o foco soldado.
         - Sim senhor!
         Para cada cinco vampiros mortos, um soldado é abatido, esse é o índice até o momento da batalha. Sem demonstrar cansaço, o grupo de Olavo vai avançando e causando destruição no reino das trevas. Torres mira sua arma com munições especiais e acerta a testa de um noturno que se preparava para atacar Olavo pelas costas.
         - Fico lhe devendo esse cabo!
         - Está tudo certo capitão, estamos juntos!

***

         Eis o momento. Garcia pousa como um pena na entrada da gruta e mesmo no escuro ele caminha com facilidade no interior da caverna. Uma imensa urna de madeira bruta é aberta por suas mãos calejadas e em seu interior Raimundo dorme como uma criança recém nascida.
         - Meu trunfo! – sussurra.
         Mordendo seu próprio pulso, o vampiro chefe deixa que seu sangue goteje até a boca carnuda do gigante noturno. Aos poucos o monstro vai abrindo os olhos. Garcia sorrir quando de fato seu melhor guerreiro desperta após passar muitos anos. Raimundo sempre foi um gigante. Antes de se tornar um demônio, ele trabalhava na lavoura junto com seus pais. Era temido por todos por causa de seu tamanho e físico. Com muitos pêlos pelo corpo, Raimundo era chamado de o lobo gigante pelos fazendeiros. Depois de ser mordido por Garcia, sua força triplicou além de ganhar novos poderes sobrenaturais.
         - Meu rei! – a voz de Raimundo ainda possui um tom alto e ruidosa.
         - Meu guerreiro, tenho uma missão para ti.

***

         Outra mordida e o braço do soldado é arrancado totalmente. O sangue jorra sujando o rosto de seu parceiro. O jovem militar ainda consegue se levantar, mas, é devorado a sangue frio. A violência dos noturnos não tem limites, as vísceras são retiradas e exibidas como troféus. São criaturas forjadas no calor do inferno, odeiam os seres humanos, para eles, os seres criados por Deus não passam de estrumes apodrecidos.
         Olavo gira a espada e corta o peito de um deles. Dias atira a flecha e atravessa o tórax do vampiro.  Torres dispara seu fuzil fazendo do corpo do ser uma verdadeira peneira ambulante. O trio age em perfeita harmonia em meio a uma batalha mortal. Aparentemente o pelotão de seres humanos ganha consideravelmente e já há quem conte vitória antes do tempo. No centro de comando, Neves recebe atualizações sobre o embate.
          - Comandante. – diz um oficial manuseando um laptop. – nossas tropas avançam rapidamente e as baixas por enquanto estão abaixo da média. – Neves ergue o punho cerrado num gesto comemorativo.
          - Quer dizer que em breve tomaremos a gruta e resgataremos os adormecidos?
          - Acredito que sim, senhor!

***

          Abrindo caminho para livrar seu soldado da morte certa, Olavo retalha dois vampiros de uma só vez com uma agilidade de poucos. O sangue pútrido escorre pela lamina prateada chegando até suas luvas de borracha. O soldado atacado é socorrido pelo capitão ainda com vida.
          - Você está bem? Acha que consegue correr até o tangue?
          - Acho que sim capitão. – responde pressionando o ferimento no braço.
          - Ótimo, fique atrás de mim.
          Um herói, um verdadeiro herói, é assim que aquele soldado vê seu líder. Correndo lado a lado com Olavo, pela primeira vez desde quando a batalha começou ele pressentiu uma coisa boa “vou sair vivo dessa”. Enquanto corre, Olavo tinge de sangue as areias da praia. Três vampiros voadores em alta velocidade consegue tirar o capitão do caminho. Com as unhas negras e afiadas, eles rasgam parte das mangas do uniforme do líder.
           - Demônios! – grita o soldado tentando acerta pelo menos um disparo com sua pistola.
           - Continue correndo soldado, não pare.
           Focando as asas dos noturnos, Olavo fica a arquear com a espada no ar. Depois de muita insistência, em fim uma asa é cortada em diagonal. O bicho gira no ar e cai comendo areia. Sem demora Olavo enterra sua arma branca no peito do vampiro que grunhe desesperadamente. Ao retirar com truculência a espada do corpo do vampiro, o capitão é alertado quanto a um outro ser voador que se aproxima.
            - Cuidado senhor, esse é dos grandes.
            Como um canhão disparado a queima roupa, Raimundo soca o rosto do capitão que voa até atingir os blindados. O barulho que faz ao cair é surdo e Olavo demora a se levantar. Preocupado com o estado de saúde do capitão, o soldado corre para auxilia-lo mas é atingido por um chute tão forte no estomago que ele vomita sangue na mesma hora. Um fio grosso de sangue escorre da boca de Olavo quando finalmente ele consegue se levantar. Raimundo com seus olhos flamejantes o fuzila faiscando. A espada é erguida em sinal de desafio. O gigante das trevas abre os abraços alcançando 3 metros de envergadura. Os soldados se urinam ao verem aquele colossal sugador de sangue gente a frente com seu capitão que o chama para briga.
           - Vem, desgraçado!
           A guerra parece que parou e tudo ficou focado nesse duelo entre Davi e Golias. Raimundo, o gigante do inferno respira ofegante forçado suas narinas se abrirem de ódio. Olavo permanece com sua espada erguida. O medo está presente e também os olhares de seus liderados. Dias e Torres se entreolham e como telepatia eles dizem um ou outro “dessa ele não escapa, temos que agir rápido”
           O primeiro a avançar é Raimundo levantando areia com seus pés tamanho 60. O golpe passa em branco com a esquiva perfeita de Olavo. O corte feito na lateral de seu corpo sangra e o gigante se enfurecer grandemente. Outra vez ele tenta investir com murros e nada acontece. Olavo o corta mais uma vez. O poder do gigante Raimundo é percebido por todos, afinal, ele já foi atingido duas vezes pela espada de prata de Olavo e não se transformou em cinzas. O próprio Olavo desconfia que ele seja uma outra raça de noturnos, uma mais perigosa e imune ás armas.

12

          Neves deixa transparecer sua preocupação ao saber que surgiu na praia um monstro gigante com cerca de 3 metros de altura e pesando 190 quilos só de músculos. Antes de tomar qualquer decisão, ele se comunica com o contato do pelotão de Olavo.
           - Filho, vou enviar reforços! – diz com a boca colada ao rádio comunicador.
           - Por favor comandante, a coisa ficou feia por aqui!
           - Vou enviar o apoio aéreo. Cambio desligo!

***

           O soco acerta o rosto de Olavo em cheio. O corpo atlético do capitão mais uma vez é jogado pelos ares até cair na areia úmida. Dias se prepara para disparar sua flecha.o medo o faz tremer e o disparo passa de raspão no ombro de Raimundo. Os olhos do bicho faíscam e ele corre em tom ameaçador. Para livrar o companheiro do golpe certeiro do animal do inferno, Torres descarrega sua arma no peito peludo de Raimundo que tenta se proteger com os braços. Fragmentos de carne podre do vampiro monstro se espalham. A cena é perturbadora, mesmo com os braços em pedaços, Raimundo consegue acertar um incrível soco em Dias que vai parar nas águas salgadas do mar.
          Exausto e muito ferido, Olavo se levanta se apoiando em sua espada. Do ângulo onde está é possível ver um novo exército de Vampiros se aproximando da costa. Seu coração palpita e um frio na espinha o faz crer que tudo está perdido. É preciso reforços imediatamente.
           Raimundo segue socando e chutando soldados humanos com se eles fossem lixo. Vários soldados já foram mortos de maneira brutal. Torres mantém a resistência atirando. Dias em fim consegue sair da água, mas está nocauteado. Sua visão é turva e disforme. Olavo cospe sangue e ergue sua espada e parte pra cima do assassino com veemência. Ele pega impulso saltando de um blindado e enquanto Raimundo trucida um soldado, Olavo enterra sua espada nos pulmões do bicho. Olavo não é um homem baixo, pelo contrario, o capitão mede um metro e noventa, mas, perto do vampiro, ele se torna uma criança de colo. A dor da espada penetrando em sua carne é alucinante e Raimundo gira o corpo para se livrar de outro golpe. A saliva misturada ao sangue denuncia que seu órgão foi perfurado e mesmo assim, ele encontra força para socar varias vezes o rosto de Olavo. A mão do gigante é duas vezes maior que o rosto do militar e o estrago é grande.

***

           Ao ver a chegada dos aviões, Garcia enlouquece de ódio e resolve ele mesmo conferir a batalha de perto. As asas negras se abrem e o vampiro alça voa juntamente com seus comandados. Os rasantes nas águas escuras do mar formam ondulações com o bater das asas. O chefe dos noturnos se transforma ainda em pleno voo. Seu rosto bonito se torna diabólico coberto por veias finas e negras. Seus dentes se tornam salientes semelhante aos de um peixe. Seus grunhidos são ouvidos pelos outros demônios como se Garcia estivesse anunciando sua chegada. Imediatamente todos os outros vampiros olham para o alto e num gesto reverenciável Garcia é recebido em terra.
         - Até que em fim resolveu dar o ar da graça Garcia.- debocha Olavo.
         - Hoje, será o ultimo dia do resto de sua vida capitão, é inútil a sua luta.
         - É mesmo? Que pena, hoje eu acordei com vontade de matar vampiro. – corre na direção de Garcia que abre os braços num gesto convidativo.
         - Venha para a morte seu idiota!
         O choque é catastrófico. Os corpos quase que se fundem. Garcia consegue segurar o golpe da espada que dividiria seu crânio em dois com apenas uma das mãos. Olavo tem o peito perfurado pelas unhas malignas e sangue bastante.
         - Eu estou mais poderoso agora capitão, você percebe isso? – sofrendo dores horrorosas, Olavo mal consegue responder a provocação do vampiro. O soco também é bastante forte, capaz de fazer o sangue da boca jorrar nos ares. Torres atira nas costas do vampiro mas Raimundo o ataca com um chute violento na cabeça. O militar cai desacordado. Dias grita seu nome e outros vampiros o atacam com unhas e mordidas. Olavo não desiste e empunhe sua arma na tentativa de transpassar o corpo do vampiro chefe. A agilidade de Garcia é sobrenatural, sua velocidade é fora do comum. Em segundo o capitão é atingido por vários golpes em diversas partes do corpo.
         - Você não tem chance Olavo, desista e se torne um de nós. – propõe o vampiro.
         Em posição fetal, Olavo mesmo que na mente responde “prefiro morre ao me render a você seu maldito”.
          Raimundo continua com seu rastro de destruição arremessando corpos de soldados para todos os lados. A vitória dos vampiros agora é questão de tempo. O pelotão de Olavo não irá resistir por muito tempo. Garcia já se vê sentado no trono comandando o país de dentro de sua gruta.
           Tremendo, dolorido, sem esperança, assim é o estado do capitão diante de milhares de vampiros. Por um instante Olavo pensa em sua família que ficou lhe esperando, pensa na nação que depositou esperança em seu pelotão. Agora, próximo da morte ou da rendição, ele vê uma nova revoada, o sorriso de Garcia, a gloria infernal. Mesmo com os olhos embaçados ele consegue ver que não se trata de uma nova safra de vampiro e sim o apoio aéreo, o milagre. Reunindo forças ele ordena.
            - Todos, para os abrigos! – grita.
            As rajadas disparadas pelas aeronaves perfuram os corpos dos vampiros com se eles fossem papéis molhados. Os bichos ainda tentam reagir, mas inutilmente, por segundo dez vampiros são abatidos. Raimundo corre tentando se desviar das balas. A velocidade do gigante é impressionante e o seu poder de desviar também. Torres ao ver que seu inimigo foge sem ser incomodado, dispara um tiro certeiro em seu calcanhar. O tombo é feio, com direito a duas cambalhotas nas areias. Garcia novamente se transforma num demônio e desafia o poder das potentes metralhadoras das aeronaves que dão rasantes na praia.
            - O inferno é o lugar de vocês! – vocifera.
            Garcia alça voo na tentativa de derrubar um dos aviões. Ao perceber o plano do inimigo, Olavo deixa o abrigo e resolve encara-lo frente a frente.
            - Senhor, não vá é arriscado demais. – Dias tenta impedi-lo.
            - Se Garcia derrubar um dos aviões não teremos chance, temos que destruí-lo agora, vou atraí-lo e você e Torres acabem com ele, tudo bem? – Dias e Torre assentem com um gesto de cabeça.
            Correndo como um desesperado, Olavo deixa o abrigo chamando atenção do vampiro chefe que transformado num morcego gigante, saliva em imaginar o sangue quente de seu principal inimigo.
             - Olavo, seu idiota, provarei de seu sangue e você se tornará um soldado meu! – Garcia mergulha como um ave de rapina. Em terra o capitão corre e é alvo certo. Com sua espada ele vai fatiando os soldados infernais de Garcia. O barulho das metralhadoras perfurando os corpos apodrecidos é quase perturbador. Garcia se prepara para agarrar os braços do capitão quando uma flecha a certa no peito. Perdendo o controle do voo Garcia cai nas águas frias da praia grunhindo bastante. Dias comemora com Torres o belo tiro.
         - Ótimo tiro sargento, aquele bicho já era!
         - Vamos lá!
         Olavo em tom ameaçador entra na água com sua arma branca apontada para Garcia.
         - Está acabado Garcia, tudo acabou. – Garcia cospe a água salgada que o engasga.
         - Mentiroso, não será assim o meu fim. – ele tenta retirar a flecha do peito mas a dor é lancinante. Cambaleante o vampiro já em sua forma humana se coloca de pé e desafia o capitão. – você é apenas um humano, fraco, vulnerável, eu sou o rei da noite, ela me pertence.
         O ataque é repentino mais o reflexo do capitão anda em dia. Transformado num demônio Garcia abre as asas, mas é novamente perfurado pela espada de prata e seu corpo começa a se desmanchar em cinzas. Torres e Dias chegam a tempo de ver seu capitão triunfante.
         - Conseguimos! – grita Torres.
         Um vulto negro passa e recolhe o corpo de Olavo que deixa para trás sua espada. Torres ainda tenta acerta-lo mas é tarde, Raimundo o leva.

13

          Trocando socos no ar Olavo e Raimundo agora não passam de um pontinho no céu pra quem vê de baixo. O capitão sente pela primeira vez o cheiro da morte, se ele conseguir matar seu oponente, morrer caindo daquela altura, mas, uma decisão deve ser tomada. Usando sua técnica de pugilista ele dá uma seqüência de JABS que deixa Raimundo sem ação. Se aproximando da entrada da gruta o gigante arremessa o corpo do capitão que bate com força nas pedras. Com o impacto seu braço é quebrado.
         - Argh!
         O cheiro de azedo é algo repugnante se o estomago de Olavo não fosse forte certamente ele vomitaria e muito. Segurando o braço quebrado ele entra na gruta escura com auxilio de uma lanterna. O frio lá dentro é esquisito, tenebroso. O capitão sente o perigo a cada passo dado. Raimundo pousa na gruta com os olhos vermelhos de ódio.
        - Soldadinho maldito, vai morrer.
        Indefeso Olavo é golpeado sem pena no rosto, no braço quebrado e tórax. Caído e sem saída Olavo é pisoteado com violência. Raimundo é puro ódio e não é por menos, seu líder foi derrotado pelo miserável a sua frente e ele não hesita em chuta-lo.

***

         Pelo radio o líder do pelotão no momento, Dias, pede que uma aeronave pouse o mais rápido possível.
         - Acho que o gigante levou o capitão para a gruta, vamos lá.

***

        Com algumas costelas fraturadas e sangrando pela boca e nariz, Olavo ainda é torturado pelas botas tamanho 60 de Raimundo.  O capitão não emite nenhum som apenas suas expressões demonstram o seu sofrimento. O ultimo chuta o faz voar para o fundo da gruta ainda mais escuro e ao cair ele sente um volume no bolso. Uma granada, seu ultimo recurso. Raimundo o procura rosnando e salivando.
        - Chegou á hora de você se tornar um imortal soldadinho. – Olavo o surpreende mesmo sentindo dores horrorosas saltando e se agarrando ao seu pescoço. O vampiro monstro rodopia na tentativa de se livrar do parasita pendurado. O pino é retirado da granada e em breve palavras em pensamento ele se despede de sua mulher e filhos “foi necessário!”
        Os grunhidos de Raimundo ecoam por toda gruta e a explosão acontece deixando seu corpo e do capitão em pedaços e até mesmo alguns dos adormecidos ali.
         O avião conduzindo Dias e Torres se aproxima da gruta.
          - Veja senhor, fumaça. – aponta Torres. Dias engole seco.
          Não é possível pousar por isso os dois militares são abrigados a saltarem e a subir pelas pedras. Mesmo a metros da entrada o cheiro impressiona. A paisagem vista daquele lugar é maravilhosa e já é possível ver o tom alaranjado do sol que daqui a algumas horas irá iluminar o céu.
           Torres e Dias chegam à boca da gruta que ainda fumega. As lanternas são acionadas e em poucos passos é possível ver sangue e pedaços de roupas. Sentindo o frio misterioso os militares avançam para o fundo da caverna. De repente o corpo de Raimundo chamuscado é visto por ambos. Para garantir, Dias atira sua flecha no peito do vampiro que começa a se transformar em cinzas. Os adormecidos também são localizados e pelo radio o sargento pede apoio.
           - Gruta explorada, já podem enviar o resgate. – ao desligar o radio, os olhos de Dias localizam o corpo de Olavo em estado lastimável. Os lábios do sargento tremem e ele prende o choro. Torres ajoelha e retira seu capacete. Olavo está morto.

14

          Toda a imprensa cobre os sepultamentos. O cemitério dos heróis de guerra também é cercado por microfones e câmeras das maiores televisões do Brasil. Miriam e os filhos estão no reservado para a família e não falam com a imprensa. Dias e Torres por fora se mostram fortes, porem o coração de cada um deles está em pedaços. Olavo morreu como herói disso ninguém tem duvidas. Seu legado será para sempre lembrado por aqueles homens. O país agora está livre das ameaças noturnas, os cidadãs podem circular livremente sem se preocuparem com o crepúsculo. Neves faz seu discurso diante do corpo presente com uma eloqüência de poucos exaltando a bravura do capitão e de todos os soldados.
           - Em nossa memória ficará os atos heróicos do capitão Olavo em doar sua própria vida para livrar o nosso Brasil dos vampiros, estamos livres graças a Deus a esses homens.