Ele
a avisou que voltaria, porém, Catarina não acreditou e agora se vê
sem saída e sem esperança. Os saltos dos sapatos se quebraram
durante sua fuga desastrada. Seu vestido curto agora não passa de
retalhos que exibem suas pernas torneadas e longas. Sua maquiagem
está borrada, se misturou ao suor lhe dando um aspecto horrendo.
Catarina, uma mulher que todos os homens desejam, principalmente ele
que sofreu uma terrível desilusão. Enquanto correr ela chora e
soluça. Suas mãos de unhas grandes e pintadas apoiam nas paredes
cobertas por lodo molhado. Ela se cansa e resolve se sentar, ali
mesmo, ao lado dos ratos.
-
Alberto, meu amor. - treme os lábios.
Assistir
o grande amor de sua vida sendo morto foi demais para a estudante de
direito. Alberto foi morto sem chance de defesa. Seu assassino o
matou sorrindo olhando nos olhos dela. Foi algo inimaginável. Seu
futuro marido gritava horrores sendo cortado aos pedaços, sentindo
cada perfuração da faca dele. Assassino desgraçado. Agora ele se
encontra atrás dela e, com certeza, fará o mesmo, porém duas vezes
pior.
Catarina
levanta a cabeça a tempo de ver uma sombra crescendo. Ela só teve
tempo de rolar para junto das latas de lixo e prende a respiração.
Segundos depois lá está ele, alto, pele branca, careca, olhos azuis
e na mão direita a faca que pôs fim a vida de Alberto.
-
Querida, sua vez agora e não adiante se esconder. - diz sussurrando.
Catarina
sente o estômago embrulhar e por duas vezes ela se conteve para não
vomitar. Um rato passou perto de sua perna. Em outra situação ela
sairia dali gritando alarmando a todos que um monstro a perseguia.
Hoje a história é outra. O monstro é ainda mais perigoso e deseja
cortar suas carnes fatia por fatia.
-
Vamos, Catarina, saia de onde está, eu estou disposto a conversar. -
diz um pouco mais irritado.
A
universitária fecha os olhos os apetando. Ela precisa sair dessa,
ela não terminará como seu noivo, assim não. Ao abrir os olhos
Catarina consegue ver um prego, um simples prego jogado debaixo da
caçamba de lixo. Talvez seja seu último recurso. Em silêncio ela
estica o braço e o apanha. Seu monstro perseguidor se aproxima de
seu esconderijo passo a passo, lentamente.
-
Catarina, eu já te vi, agora saia dai e vamos beber alguma coisa, o
que acha? Conversar como duas pessoas civilizadas.
-
Tudo bem, Cris, tudo bem, vamos conversar.
Os
olhos de Cristiano brilham ao ver aquela mulher morena, seminua e
suada bem a sua frente. Ainda é possível sentir o hálito do vinho
que tomava com seu falecido noivo. Cris respira fundo e depois
sorrir, o mesmo sorriso de quando enfiava a faca no abdome de
Alberto.
-
Já te falei que você continua linda?
-
Não, você perdeu muito tempo matando meu noivo, esqueceu?
-
Poxa, Catarina, você sabe, quando fico com raiva, parece que algo ou
alguém toma conta do meu corpo e ai…
-
Você mata.
Cristiano
dá mais um passo. Catarina não se afasta. Seu dedo indicador sente
a ponta aguda do prego. Os olhos negros dela miram sua jugular que
infla cada vez que ele fala. É ali que ela deve acertá-lo.
-
Senti sua falta, sabia? - ele diz com uma expressão séria. - por
que você fez isso comigo, eu te amava. - engole seco. - senti falta
do seu corpo, da sua voz, das juras de amor, lembra?
-
Lembro, porém lembro muito mais das pancadas e das ofensas, você
lembra disso?
Cristiano
abaixa a cabeça. Seria o momento de atacá-lo? Não! Melhor esperar.
Cris levanta a cabeça e sua expressão já é mais fechada, uma
nuvem negra encobre seus olhos cor do céu.
-
Vale lembrar que você também teve uma porcentagem nisso tudo. -
aponta a faca. - você me traiu com Alberto, não foi?
-
Sim, trai sim, dias depois de você quase me matar com socos. -
vocifera.
Cris
abaixa a faca e volta a ter a expressão mais tranquila. Ele olha
para o céu com uma lua cheia linda que joga sua luz em seu rosto
pálido. Seu coração acelera e uma lágrima desce. Cristiano olha
para Catarina.
-
Você me perdoa?
Como
assim? Isso ela não esperava. Cris e ela ficaram juntos dois anos e
em todo esse tempo ele jamais se desculpou, quanto mais pedir perdão.
Será o novo Cristiano acontecendo? Ou será atuação de um monstro
frio?
-
Vem, fique mais perto. - a voz sai baixa e embargada.
Catarina
baixa a guarda. Diante de seu ex marido e por um momento se esquece
que ele assassinou com frieza seu grande amor. Dominada por um
sentimento ela se aproxima ainda com medo. Sua mão aperta o prego
até quase entortá-lo. Agora ela está ali face a face com ele, o
homem que a espancou, maltratou e feriu seu jovial coração.
-
Já havia esquecido como é bom sentir seu cheiro. - diz Cris.
-
Você me perguntou se eu te perdoaria, não foi?
-
Sim! - abaixa a cabeça.
-
Por que isso tudo agora? Por que matou o Alberto, se tinha alguém
inocente nessa história, esse alguém era ele.
Num
movimento rápido Cris segurou nos braços de Catarina.
-
Eu não aguentei ver você envolvida nos braços de outro,
principalmente nos do Alberto.
-
Cris, você o matou, gostando do que estava fazendo, em quem você se
tornou?
-
Me tornei num homem apaixonado, saudoso, um cara que ainda ama a ex
mulher e que tudo que ele deseja nessa vida é o perdão dela, foi
nisso que me tornei.
Houve
um minuto de silêncio. Os olhares continuam intensos. Catarina teme
pelo o que Cristiano possa fazer. De repente ele a segura forte e faz
um pedido.
-
Me beija?
-
O que? - aperta os olhos.
-
Você precisa me beijar. - sua expressão fica sombria.
Catarina
dá um passa para trás e vê quando Cris segura firme o cabo da
faca. A melhor defesa é o ataque. O prego precisa entrar em ação
antes que seja tarde demais. A universitária ataca cravando o prego
no pescoço do homem que perde o equilíbrio. O sangue esguicha
sujando o rosto da mulher. Cris solta um grito gutural.
-
Sua vaca!
Catarina
corre para mais fundo da estreita rua tendo seu ex a metros atrás.
Sua respiração volta a ficar irregular. Um filme passa em sua
mente, um filme de horror. Descalça seus pés são feridos pelo
asfalto rústico. Ela chora, chora muito.
-
Vou te matar, sua desgraçada. - grita.
A
mulher não suporta a dor nos pés e cai. Cris a alcança chutando
suas costas e cabeça. Ela grita pedindo misericórdia. Cris não dá
pinta de que vai parar com o espancamento. Ele se ajoelha e senta na
barriga da mulher que perde o folego.
-
Não morra ainda minha bela.
-
Não consigo, respirar. - tosse.
Sorrindo
o assassino começa a socá-la e a insultá-la. A cada golpe ela
sente seu rosto estalar e a dor é alucinante. Aos poucos seu rosto
belo e bem desenhado vai ficando desfigurado. O sangue do pescoço de
seu agressor vai ajudando dar formas diabólicas. Cris não para até
ouvir um estalido.
-
Uau, foi a minha mão se quebrando ou a sua cara?
Ela
não consegue mais falar e simplesmente balbucia algo. Seus dentes
foram quebrados devido à violência dos golpes. De repente sua mente
viaja e Catarina consegue ver Alberto em pé olhando para ela. Ele
ainda tem aquele aspecto de terror no rosto e diz.
-
Ainda não minha flor, ainda não.
-
Me beije. - ela consegue dizer.
-
O que? - Cris para o soco ainda no meio do caminho.
-
Me beije, por favor.
Cris
estranha o pedido, mas aceita. Ele se inclina para beijá-la. Seus
lábios se tocam mesmo feridos. Cris fecha os olhos quando recebe uma
forte mordida arrancando boa parte de seu lábio superior.
Descontrolado e segurando o que sobrou de sua boca, Cris ainda recebe
uma forte joelhada nas partes baixa. Catarina empurra o corpo de seu
ex para o lado.
-
Socorro! - se arrasta. - me ajudem, estou sendo atacada.
Ao
terminar de gritar ela sente uma forte ardência no pulmão e em
seguida em outra região das costas. Ela demora aceitar, mas está
sendo esfaqueada brutalmente. O sangue começa a sair de sua boa e
sua visão falha. Cris enterra com força a faca e até se corta.
-
Merda! - balbucia.
O
sangue vai dando outro tom ao asfalto. Catarina não se mexe mais,
está morta. Cansado e sentindo forte dor, Cris tenta se levantar e
com muito custo consegue. Ele olha para o corpo de sua ex e chora.
-
Maldita seja por me forçar a fazer isso. - limpa as lágrimas. - eu
amava você, sabia disso? Podíamos ser felizes, mas você jogou tudo
no lixo, você me forçou a fazer isso. - vai se afastando. - você,
você me forçou, você causou tudo isso. - desaparece dobrando a
esquina. FIM