quinta-feira, 28 de maio de 2020

Beijando Cadáveres





A previsão do tempo errou mais uma vez. Era para ser um dia ensolarado, não quente, mas com poucas nuvens. Nada disso aconteceu. Desde as primeiras horas daquela quinta-feira a chuva não deu trégua encharcando o asfalto e as paredes das casas sem telhado. Para a família Farias o dia poderia ter sido de sol forte, não faria diferença alguma, afinal de contas, sepultar a matriarca é de uma dor imensurável. Filhos, netos, genros, noras, amigos e conhecidos, todos lotam o cemitério naquela tarde lamacenta. Robson, o filho mais novo de sete é o mais inconsolável de todos. Dona Benedita Farias era mais de que uma mãe para ele. Ela o ajudou a abrir seu negócio. Ela segurou as pontas – financeiramente – quando tudo estava ruindo. Ditinha, como era conhecida, ajudou a salvar a vida de todos os filhos quando eles achavam que tudo estava perdido.
     Benedita Farias se encontra deitada na urna, inerte, com suas mãos magras unidas em cima do abdômen. Todos que se aproximam do caixão não suportam vê-la naquelas condições e choram forte. Ditinha era uma mulher boa, de fala suave, quase uma freira, tinha tudo na dose certa. O que realmente a tirava do sério era a injustiça. Benedita não admitia a injustiça. Quem merecia, merecia e quem não merecia, não adiantava argumentar, não levava de jeito nenhum. Ela também era bastante espiritual, amava a Deus sobre todas as coisas, mas não era religiosa. Frequentava a igreja Batista, tinha fé, tentava ajudar ao próximo. Ditinha era do tipo que se pudesse ajudar ela ajudava, porém se não pudesse não atrapalhava. Uma mulher ponderada.

*

Celso Calixto parou no portão do cemitério quando a chuva apertou consideravelmente. Terno preto, gravata branca, chapéu surrado que um dia foi marrom e sapatos precisando urgente serem engraxados. Calixto está usando um guarda chuva, mas devido os fortes ventos seu paletó na parte de trás se encontra ensopado. Ele entrou pisoteando as poças até alcançar a varanda lotada. Fechou a sobrinha pedindo licença aos presentes. Em meio aos murmúrios, lamúrias, choros e até escândalos ele foi abrindo caminho até a capela mais próxima onde velam um senhor que faleceu de câncer na próstata. Entrou sem ser percebido passando por familiares sentados no canto da capela. Andou até a urna e leu no quadro negro do nome do finado.
    - Jacinto Machado. – olhou para o defunto de pele cor de giz e fez de forma desastrosa o sinal da cruz numa ladainha inaudível.
    Celso Calixto se inclinou perto da cabeça do morto e o beijou na testa balbuciando algo como “volta”. Ele deixou a capela assim como entrou, sem ser notado. Lá fora a chuva deu uma estiada, mas seguia trazendo aquela quinta-feira uma lúgubre sensação de dia preguiçoso. Entrou em outra capela e na entrada alguém o questionou.
     - O senhor é o padre? – perguntou uma jovem de cabelos soltos e olhos inchados.
     - Não, me desculpe, estou apenas de passagem. Posso? – tirou o chapéu.
     - Conhecia minha vó Bernadete? – perguntou aos soluços.
     - Não. Me dê licença por favor.
     Calixto caminhou até o caixão. A morta estava lá, toda enfaixada feito uma múmia. Parou e antes de beija-la ele olhou para a neta enlutada que chorava copiosamente.
      - Qual foi a causa do óbito?
      - O que? – a moça franziu a testa.
      - Do que Bernadete morreu?
      - Acidente doméstico.
      - Fique tranquila, farei uma prece, você pode me acompanhar nesse momento?
      Relutante a menina assentiu com um gesto de cabeça. Fechou os olhos e uniu as mãos segurando o terço. Celso beijou a testa da morta.
     - Volta!
    Até então não se ouvia trovões. A chuva voltou a apertar trazendo com ela os berros celestiais deixando a todos ali presentes com medo e receio. Calixto deixou a capela e antes de seguir com sua jornada ele observou bem aquele lugar. As covas, os jazigos, as gavetas, tudo ali é de uma certa forma causa nele uma certa fascinação. O ser humano teme a morte porque desconhece o outro lado, não consegue mensurar. Celso Calixto é diferente. Ele consegue ver a partida de alguém desse mundo como sendo algo maravilhoso, um verdadeiro ato de misericórdia do Criador. A morte é o ponto final na dor crônica, na solidão, na busca pela felicidade, mas principalmente, ela é o fim de uma trajetória de sucesso ou insucesso. Isso sim é uma obra fantástica para ele.
      Celso Calixto andou até a capela onde dona Ditinha está sendo velada. Lá dentro o clima é dos piores. Muita gente chorando, conversado e outras simplesmente curtindo a dor da perda sozinha. Ele parou na porta e viu um homem de paletó sem gravata segurando uma bíblia e conversando com um rapaz ao lado do caixão.
      - Sua mãe descansou, pense nisso.
      - Eu sei, pastor, mas dói demais, só em pensar que nunca mais a verei parece que meu coração é feito em pedaços.
      - Entendo. – colocou a mão no ombro do filho da finada. – sua mãe foi uma mulher incrível, incansável na luta contra o mal, contribuiu muito para o sucesso de nossa congregação. Nós também sentiremos a falta dela.
      - Obrigado por ter vindo, pastor. – o abraçou.
     Assim que o pastor se afastou o filho caçula da morta visualizou Calixto parado na porta fazendo menção de entrar. Contrariado o rapaz foi até o homem de chapéu tirar satisfação.
       - Olá, o senhor quem é?
       - Celso Calixto, posso entrar? – tirou o chapéu.
       - Olha, a capela foi reservada só para familiares e amigos, me desculpa.
      Calixto deu um passo para trás. Um dos irmãos foi até a porta afim de saber o que estava acontecendo. Calixto explicou com toda paciência do mundo de que só queria entrar e fazer uma prece pela alma da falecida. Foi explicado para Celso de que não havia a necessidade de outro líder religioso ali uma vez que o pastor Bráz já se encontrava no recinto. Calixto insistiu.
      - Faço questão, prometo ser rápido.
     Os irmãos se olharam, o mais velho deu de ombros e se afastou.
     - Vai lá então.

*

Benedita Farias estava lá, olhos fechados, narinas tapadas por chumaços de algodão. Maquiada por opção de sua filha. Calixto se aproximou do corpo e não pode deixar de notar a beleza da mulher.
     - Deve ter sido disputada aos tapas quando jovem.
    Celso sentiu que estava sendo observado. E agora, como proceder? Um trovão estremeceu as paredes fazendo os presentes saltarem de suas cadeiras tamanho foi o susto. Uma luz se acendeu em sua mente, usar a força da natureza a seu favor. Calixto aguardou o próximo estrondo e ele veio, mais forte, mais assustador, eis a oportunidade. O beijo na testa de Benedita foi dado.
      - Volta!
      Houve uma curta queda de energia e quando se restabeleceu Celso já havia saído da capela. Lá fora ele abriu seu guarda-chuva e atravessou o portão do cemitério. Com a chuva batendo forte nos telhados, Calixto olhou para dentro daquele lugar e disse.
      - Voltem! 
     Celso Calixto desapareceu ao atravessar a rua e enquanto isso de dentro das capelas só se ouvia gritos de pavor, pessoas saindo correndo de dentro delas para a chuva. Havia também gente desmaiando, funcionários do cemitério tentando entender que se sucedia. De repente o que era dor e pranto deu espaço para corre corre e gritaria. Ambulâncias foram colocadas a disposição para levarem as pessoas que sofreram mal súbito. Aquele cemitério lamacento se transformou num palco de horrores com pessoas buscando abrigos entre os túmulos. FIM.

sábado, 23 de maio de 2020

Rastro Mortal - Conto Policial com Luís Souza e Heloísa Mattos

Para Marcos Fontes, o quarto homem mais rico da cidade, ganhar dinheiro é quase uma coisa comum em seu dia dia. As indústrias Fontes chegam a produzir bilhões em um mês graças ao seu poder de negócio herdado de seu falecido pai Hermes Fontes. Hoje, as indústrias de Marcos Fontes é algo fundamental para a economia da cidade. A Fontes gera milhares de empregos, ela é realmente um dos pilares do país.
Marcos acaba de fechar mais um contrato com o exterior, com o Japão para se mais exato. A reunião durou duas horas e o fluxo das negociações não poderia ser mais tranquilo. Para fechar com chave de ouro, Marcos ofereceu um coquetel para os convidados e jornalistas que desde cedo estão na cobertura dos fatos. Sempre muito educado e prestativo, o dono da Fontes conversou com a imprensa respondendo uma a uma as perguntas.
- Senhor Marcos, a quem o senhor dedica mais essa vitória? - pergunta uma jornalista do maior jornal do estado.
- Como todos sabem sou um pai dedicado e presente na vida de minha família, dedico essa vitória a meu filho João que deve estar me assistindo. Beijo do pai, João.
Bem vestido, simpático e carismático, esse é Marcos Fontes que já passa de seus 45 anos bem vividos.

Ele não é ninguém. Nunca foi e nunca será alguém. Vive um dia após outro sobrevivendo de migalhas. Sinceramente ele já está de saco cheio dessa vida. Ele não tem nome, prefere ser chamado de sombra. Mora num barraco feito de madeira e barro. Sua única companhia é de seu amigo Eloy. Sombra desliga a TV mal sintonizada depois que Marcos Fontes termina de dar entrevista. Dá um grito em Eloy que demora com a sopa.
- Se eu soubesse que demoraria eu mesmo faria.
- Desculpe-me, está aqui. - deixa o prato sobre a mesa. - o que estava vendo?
- A sorte dos outros. - se levanta preguiçosamente. - essa sopa está boa? Por que a de ontem estava uma merda.
- E por que você não levantou a bunda magra do sofá e fez? - Eloy se joga no sofá.
- Você anda muito respondão ultimamente.
- Você anda mandando muito pro meu gosto.
Ele se olham por alguns segundos e depois caem na gargalhada.
- Vamos comer, é o que nos resta. - diz Sombra.


2

Marcos chegou em casa cedo. Queria comemorar junto com a família mais uma conquista. Lúcia, sua bela mulher com quem é casado há 15 anos o recebe na sala com um abraço e beijos calorosos.
- Parabéns!
- Obrigado querida, onde está o João?
- No quarto, jogando como sempre.
O menino loiro de olhos verdes puxou tudo da mãe. Quem o olha não vê nada de Marcos nele. O empresário sempre brinca que João o puxou na inteligência, pelo menos nisso. O garoto de dez anos joga com os olhos fixos na tela da TV e não percebe a chegada do pai.
- E ai filhão, quantos inimigos já derrotou?
Ao ouvir a voz do pai, João deixa de lado o controle e se joga nos braços de Marcos que perde o equilíbrio e ambos caem na cama.
- Opa, assim você mata o pai.
- Paizinho, o que trouxe pra mim?
- Doces e novos jogos. - o menino vibra. - mais antes quero ver o caderno da escola.
- Tudo bem, vou pegá-los.
A noite foi maravilhosa. Mesmo de terno e gravata Marcos sentou-se no chão e experimentou os novos jogos até o menino pegar no sono. Mesmo com dificuldade o empresário conseguiu carregá-lo até a cama. Desligou a luz e fechou devagar a porta.
- Boa noite filho!
No quarto do casal Fontes Lúcia o aguarda para uma noite de amor com direito a champanhe.
- Achei que não fosse subir.- reclama a mulher.
- Pois é, ele custou a dormir. - retira o paletó.
- Quer champanhe?
- Você espera eu tomar um banho?
- Claro que não. - Lúcia o segura pela gravata. - prefiro o natural mesmo.


3

A vida de um miserável não é nada fácil. Ainda mais quando esse miserável não sabe direito o seu nome. Sombra e Eloy buscam incansávelmente o que comer nessa manhã ensolarada. O lixão da cidade é um banquete a céu aberto. Quem chega cedo pega as melhores migalhas, os melhores restos. As cinco Sombra já se encontra com sua sacola nas costas buscando no meio das garrafas pets e sacos plásticos algo comestível. Seu amigo de longa jornada se aproxima dele com um pedaço de inhame.
- Isso aqui dará uma boa sopa, não acha?
- Larga mão disso sujeito, tente arrumar um pedaço de carne.
- Teremos que disputar a tapa com os urubus.
De repente Sombra teve um momento de nostalgia. Antes de sua vida virar de ponta cabeça ele tinha uma vida digna, uma vida em família. Sua mãe trabalhava passando roupa para as vizinhas e com isso conseguia as duras penas sustentar seu irmão e ele. Por ser o caçula da família, Sombra sempre foi privado de certos assuntos principalmente da morte prematura de seu irmão pelo tráfico. Segundo dizem, Romão era viciado e foi morto numa emboscada. Levou vinte tiros e enterrado como indigente.
- Sabe de uma coisa Eloy. - começa Sombra. - estou cansado dessa vida doida. Precisamos mudar.
- Também acho.
- Ninguém vai querer compartilhar sua felicidade com dois sujos mortos de fome, não é mesmo?
- É verdade, o mundo anda muito individual. - Eloy se abaixa para pegar metade de uma maçã.
- Pensando nisso, que tal pegarmos na força bruta.
- Como assim?
- Quando chegarmos em casa te explico melhor.

De cara Eloy parece não concordar com o plano de Sombra. Enquanto seu amigo expõe sua ideia, o cozinheiro oficial do barraco de madeira e barro se limita em cozinhar.
- Mas Sombra, sequestro é um crime grave.
- Sei disso, mas pense na grana fácil que iremos conseguir.
- Tudo bem, mas, quem você está pensando em segurar, o Papa, a presidente, quem?
Sombra se levanta num salto da velha poltrona. Esfrega as palmas das mãos e olha o que tem na panela.
- Lembra daquele magnata que vimos outro dia na TV?
- Marcos Fontes?
- Esse mesmo. Ele tem um filho não é?
- Acho que sim. - Eloy mexe a panela mais amassada do que a cara dele.
- Que tal trazer esse garoto para passar alguns dias aqui?

O dia é perfeito. Sol queimando as costas, o vento acalentando e muita diversão. A família Fontes aproveita o dia belíssimo para brincar num parque de diversões construído na zona nobre da cidade. João Fontes abre os braços quando a montanha Russa passa em alta velocidade por sua mãe que entra em desespero.
- João, se segure meu filho. - grita.
Marcos Fontes oscila em dar atenção a família e em atender a telefonemas. Para que a imprensa o deixasse em paz o empresário não avisou sequer a seus funcionários que iria passar o dia fora. Lúcia percebe que seu marido se afastou e resmunga – outra vez no celular.
O passeio na montanha Russa termina. O filho único do casal Fontes deixa o brinquedo de olho no carrinho de bate bate. Sua mãe aproveita para repreendê-lo quanto a desobediência. O garoto dá a mínima saindo correndo para a fila do brinquedo. Circulando por ali um sujeito modestamente vestido e usando óculos escuros observa a família milionária. Como uma Sombra ele não é percebido. No bolso um celular velho. Do lado de fora do parque seu parceiro Eloy aguarda . O tempo do carrinho bate bate acaba. O sujeito se aproxima lentamente da saída abordando João Fontes.
- Fala meu amiguinho, será que você poderia me ajudar?
- Se não for demorar!
- Eu não saco nada de tecnologia. - Sombra pega o celular velho no bolso da calça. - será que você poderia me ensinar?
- Tio, esse seu telefone é antigo. Deixa comigo, resolvo isso num instante.
- Veja bem, eu tenho um amigo na mesma situação, você poderia me acompanhar até o portão?
- Lógico!
Lúcia volta da barraca de cachorro quente procurando seu filho. Olha para Marcos ainda no celular.
- Marcos, você viu o João?
- Ele não estava no carrinho bate bate?
- Sim, o tempo já acabou.
- Ele deve estar na casa mal assombrada.
Marcos estava errado. João não estava em lugar algum no gigantesco parque. Depois de meia hora de procura a família começa a entrar em desespero. Lúcia culpa o marido pelo sumiço do menino. O empresário tenta se manter calmo para resolver a situação. Bastante transtornado Marcos vai até a administração do parque exigir que o fechem. Nada resolvido. O máximo que conseguiu foi acionar a segurança do local. Foram feitas buscas em todos os brinquedos e nada do garoto loiro e simpático. Marcos e Lúcia Fontes perdem totalmente o controle da situação.
- Precisamos chamar a policia, Marcos, nosso filho foi sequestrado. - vocifera Lúcia abraçada ao marido.

4
Sombra está nervoso. Fuma um cigarro atrás do outro enquanto Eloy cuida de João deitado na cama de solteiro. O garoto foi amarrado, amordaçado e mantido com um saco de pano preto na cabeça. Tudo pronto. Demorou mais do que o esperado, mas em fim tudo concluído.
- Tudo pronto, qual o próximo passo?
- Temos que deixar que o sumiço desse pirralho se torne publico. Depois iremos fazer contato com a família pedindo o resgate.
- Certo, e a polícia?
- O que tem a polícia?
Eloy aponta para João que se mexe bastante na cama.
- Sombra, se liga, sequestramos o filho do cara mais rico da cidade.
- Sim, sei disso, relaxa, o Sombra pensou em tudo. - acende mais um cigarro.
- Assim espero, não quero mofar na cadeia, eu amo a liberdade.

A mansão dos Fontes se tornou uma grande nuvem negra de sofrimento agonizante. O casal não sabe mais o que fazer. Por enquanto nem a polícia e nem a imprensa foram avisados. Marcos não para sequer para falar com a esposa que se encontra aos prantos no sofá.
- Marcos, por favor, enquanto estamos aqui nosso filho pode estar correndo risco de vida.
- Lúcia, imagina a repercussão que isso terá?
A mulher se levanta com seu rosto desfigurado olhando para o marido.
- Quero que se dane a repercussão que terá, quero meu filho de volta, ligue para a polícia já, agora!

5
Bonita, ruiva, pele bem cuidada, rosto brilhante e dona de um corpo bem desenhado por deuses. Essa é Heloísa Mattos, investigadora experiente. Vestida com calça social e camisa branca com as mangas dobradas até os cotovelos, a mulher esbanja charme e sensualidade. Ela adentra a mansão dos Fontes com sua imponência cheirando a controle total.
- Bom dia senhores!
Apenas Marcos a cumprimenta com um ligeiro aperto de mão.
- Algum contato? - Heloísa deixa sua bolsa em cima de uma mesa de tampo de vidro.
- Ainda não. - responde com voz trêmula.
- Quero saber onde foi o último lugar em que seu filho esteve no parque senhor Fontes.
- Tudo bem, você bebe algo? - Marcos aponta para a cadeira.
- Não obrigado!
Fontes conta tudo para Heloísa que anota tudo em um bloco. Lúcia pela primeira vez desde quando a investigadora chegou abriu a boca. Reclamou do parque, da segurança, e principalmente do marido que não largava o celular.
- Se você estivesse de olho nele nosso filho estaria aqui.
- Lúcia, por favor!
Heloísa foi obrigada a interromper a discussão se levantando abruptamente e sacando seu celular na bolsa.
- Senhores, terei que chamar minha equipe aqui.
Marcos também se levanta mostrando se contrário a decisão da investigadora.
- Quer dizer que a sala de minha casa se transformará numa central?
- Preciso de suporte para trabalhar – responde rispidamente.
Com bastante cuidado Marcos Fontes informa a policial sobre a convocação de mais um agente.
- Investigadora, tive o cuidado de chamar aqui, além da senhora, mais um policial para nos ajudar. - Heloísa franze o rosto.
- Quem seria esse agente?
- Luís Souza, o detetive.

Heloísa não gostou, pra falar a verdade ela odiou a decisão do magnata das indústrias. Claro que ela conhece a fama de Souza e sabe do que ele é capaz. Ela também não fica atrás. Heloísa Mattos é uma investigadora eficiente e premiada. A mais ou menos um mês ela recebeu o prêmio de melhorar investigação pela prisão do maior contraventor da cidade. Foi por esse e outros atributos que fez com que Marcos Fontes a convocasse.
- Tudo bem.- diz entre os dentes.

A sala dos Fontes se tornou uma central com notebooks e aparelhos de escuta espalhados por todos os cantos. Foi preciso fazer da mesa de centro uma espécie de cabine onde um agente com grandes fones de ouvido permanece digitando dados em seu computador. Heloísa faz o tipo manda chuva dando voz de comando para os quase dez agentes ali presentes.
- Em breve eles irão entrar em contato. - ela olha para o policial com pinta de galã com fone de ouvido. - nessa hora quero o viva voz ativo, tudo bem? - o agente faz sinal de ok. - ótimo!


Sombra vai até onde João Fontes está e certifica se tudo está em ordem. Ele confere as amarras e ajeita o capuz na cabeça do garoto.
- Quero água. - pede João.
- Fala sério!
- Eu estou falando sério, quero água.
Sombra vai até a cozinha. Enche o copo plástico sujo. Coloca a máscara e volta para o quarto onde só há uma cama. O sequestrador retira com truculência o capuz da cabeça do menino e o desamarra. A luz bate com força nos olhos verdes do filho de Marcos. Sombra deixa o copo na cabeceira. Antes de beber João pergunta.
- O que querem comigo?
- Isso não é da sua conta, agora beba logo essa água.
- Vocês querem dinheiro não é mesmo?
- Não, querermos sua coleção completa de HQs do Homem-Aranha.
- Sério, mas eu não tenho HQs do Homem-Aranha e sim dos Vingadores.
- Chega dessa conversa mole, termina logo de beber essa água.
Eloy chega com alguns cartões telefônicos e os entrega a Sombra.
- O dinheiro que me deu só deu para comprar isso.
- Você é mesmo um louco, cadê sua máscara? - Eloy faz uma careta. Enfia a mão no bolso de trás da calça e a puxa. - agora já era, o pirralho já viu o seu rosto seu idiota.
- Nossa, o que houve com o seu nariz? - João aponta para a deformidade no rosto do bandido. Muito constrangido o rapaz não responde.
- Agora chega, deite-se. - Sombra volta a amarrá-lo e a colocar o capuz na cabeça do menino.
Ainda envergonhado Eloy volta para a cozinha onde há um pedaço de espelho colado na parede. Ele olha para o nariz torto e tenta colocá-lo no lugar.
- Agora já era, seu nariz nunca mais voltará para o lugar a não ser que faça uma cirurgia plástica. -Sombra conta os cartões.
- Vale lembrar que o autor do soco que quebrou meu nariz e me deixou com cara de monstro foi você.
- Claro, eu fui bastante categórico, não mexa na minha comida na geladeira e o que você fez, mexeu.
- Eu estava com fome. - Eloy volta a se olhar no espelho.
- Tudo bem, com o dinheiro que vamos ganhar você poderá consertar essa sua cara de múmia.

6

a funcionaria da mansão do Fontes anuncia a chegada de Luís Souza deixando Heloísa na expectativa. O detetive entra e se sente meio estranho. Marcos o recebe ainda na entrada com sua educação habitual.
- Seja bem vindo detetive, queira me acompanhar.
- Obrigado!
Realmente é de causar espanto tamanho o luxo. O brilho da casa é ofuscante. O carpete é algo de outro mundo. As coisas começam a mudar a partir de outra entrada. O que Souza vê é um verdadeiro arsenal de computadores, cabos e agentes. Um deles o chamou bastante atenção. Heloísa Mattos.
- Essa dispensa apresentações, creio eu. - diz o magnata.
Realmente dispensa apresentações. Heloísa não passa despercebida. Souza teve duas sensações ao vê-la naquele lugar; a surpresa em ver de perto toda aquela beleza ruiva e a outra é, o que ela faz aqui?
O aperto de mão é frio, mole, deixou apenas o cheiro do perfume na mão do agente. Antes que Souza pudesse se inteirar do assunto, Marcos chama os dois em seu escritório. O lugar tem livro até no teto. A mesa é larga coberta por porta-retratos e suvenis. A cadeira onde Fontes se senta caberia facilmente os três nela.
- Muito bem senhor e senhora, chamei vocês aqui por que não só eu mais a cidade os considera os melhores em suas profissões. Tenho certeza de que farão o melhor para trazer meu João de volta. - a voz fica embargada.- peço por favor, minha esposa está sofrendo muito, precisamos do nosso filho de volta. - finalmente as lágrimas descem.
- Senhor Marcos. - Souza limpa a garganta e olha para Heloísa que permanece olhando para o magnata. - tenho certeza de que junto com a agente Heloísa iremos trazer seu filho sã e salvo.
- Por favor! - limpa as lágrimas.
- Se nos permite. - diz Heloísa. - gostaria de voltar para a sala senhor.

Já deu para sentir o clima. Trabalhar ao lado daquela ruiva sensual não será nada fácil. Ao voltar para a sala Souza a ver dando voz de ordem a sua equipe. Para quebrar o gelo ele se aproxima dela que está ao lado do agente com os fones de ouvido.
- Temos alguma chance?
A pergunta pegou Heloísa como se fosse um soco no estômago.
- Como assim? - levanta uma das sobrancelhas bem feitas.
- Isso mesmo, acredita que pode trazer esse menino de volta?
- Não sei onde quer chegar, você pode ser mais específico?
- Quero saber se você tem algum plano?
A agente se desarma e mostra toda a sua equipe.
- Mais confiante que isso não existe.
- Tudo bem, vamos trabalhar então. - Souza dá dois passos antes dela destilar seu veneno.
- Quero que fique bem claro detetive Luís Souza, o comando é meu, tudo bem? - antes de responder ele olha para os agentes em suas devidas posições. - claro!


Lúcia e Marcos Fontes conversam abraçados no quarto do casal. O marido tenta em vão deixar sua esposa menos tensa.
- Se acalme querida, temos a nosso lado os melhores.
- Será mesmo?
- Claro, Heloísa é a melhor investigadora e Souza não preciso nem dizer. Eles vão trazer o João a salvo querida. Quer comer alguma coisa?
- Não!
- Mas Lúcia, você precisa se alimentar, vai acabar ficando doente desse jeito.
- Não quero, Marcos.
- Tudo bem. - a abraça. - fique tranquila.


Sombra termina de dar as orientações a Eloy que anota tudo num pedaço de papel.
- Entendeu?
- Preciso ser direto, disfarçar um pouco a voz e desligar sem aviso.
- Cara, se você falhar num desses itens estaremos perdidos, a essa hora a polícia já está em nosso encalço, com certeza vão gravar a ligação. Por isso quero que ligue de um orelhão bem distante daqui.
- Pode deixar!
- Conto com você.- bate no ombro.
- Só uma dúvida, quanto vamos pedir pelo moleque?
- Deixe isso para o próximo contato.


Souza confere seus e-mails encostado no canto e Heloísa anda de uma lado para outro com os braços cruzados. Vez por outra ela olha para Souza e tenta imaginar de onde vem tamanha calma. Como ele pode ficar ali, olhando o celular. De repente ela se distrai com o charme do detetive negro. Mesmo vestido socialmente é possível ver os músculos bem trabalhados. Heloísa afasta esses pensamentos de sua mente e volta a focar no que está acontecendo ao seu redor. O telefone toca e os corações aceleram todos ao mesmo tempo. Souza se dirige ao telefone mas Heloísa o interrompe pedindo calma.
- Eu falo com eles.
- Certo!
Ela tira o telefone do gancho quando o casal Fontes chega na sala.
- Investigadora Heloísa Mattos falando.
- O papo é o seguinte investigadora, o garoto está com a gente e se fizerem tudo direitinho vocês o terão antes do dia acabar, certo?
- Entendido! - silêncio. - quais as suas exigências?
Essa pergunta deixou Eloy desconsertado.
- Volto a fazer contato mais tarde. - desliga.
Souza coça a calvície e Heloísa olha para os pais de João abraçados na entrada da sala.
- Meu Deus, será que o nosso João está, está. - Lúcia volta para o quarto.
- Calma senhora Fontes, não sabemos de nada ainda. - Heloísa chega perto do agente que ficou responsável por gravar as ligações. - então, o que conseguiu?
- O de sempre, a ligação foi feita de um telefone publico.
Heloísa resmunga algo. Souza sai de onde está. Marcos Fontes volta do quarto sozinho e com os olhos marejados.
- Então, temos alguma chance? - o magnata tenta se manter forte.
- Como eu falei não sabemos de nada ainda, ele não falou muita coisa, alias, ele não falou nada. - Mattos cruza os braços.
Se mostrando impaciente o empresário olha para Souza esperando um outro parecer.
- Exatamente senhor Fontes, temos que aguardar o próximo contato.

7

Eloy está de volta ao barraco. Sombra termina de ajustar as cordas que amarram João à cama. Ao ver o companheiro nervoso, o rapaz magro, quase esquelético teme pelo fato de o amigo ter feito alguma besteira.
- O que houve?
- Nada. - pega a garrafa de café. - eu só acho que nós deveríamos devolver esse garoto.
- Ficou louco, depois de todo o trabalho. O que aconteceu?
- A policia está na casa deles. Daqui a pouco, você e eu seremos os homens mais procurados da cidade, tem noção?
Sombra o segura pelo braço cm violência.
- Não podemos retroceder, já fomos longe demais com essa história, vamos seguir com o plano sem hesitar, tudo certo, posso contar com você? - diante da pergunta Eloy respira fundo.
- Tudo bem!

Uma informação vazou e agora toda a impressa sabe do sequestro do filho do milionário das indústrias Fontes. Alguns jornalistas já montam seus equipamentos na calçada da mansão Fontes. Foi preciso Marcos reforçar a segurança ao redor da casa. Dentro dela Souza e Heloísa ainda não se entrosaram, pra falar a verdade ainda não se falaram direito. O clima de rivalidade é pesado e notório. A rivalidade não parte do lado se Souza e sim da investigadora que conhece bem o curriculum do detetive. Nesse momento ela evita até olhares.
Para não haver ainda mais hostilidades, o detetive sai da sala para fazer uma ligação.
- Oi, Márcia, como vão as coisas por ai?
- Dentro da normalidade, e por ai?
- Sem avanço, estou trabalhando com alguém que se quer olha na minha cara.
- Quem seria?
- Heloísa Mattos. - silêncio. - alô, Márcia, você está ai?
- A ruiva poderosa e premiada? - usa de desdem.
- Ela mesma. A mulher é intransponível, um campo de força praticamente.
- E como ela está conduzindo o trabalho?
- Seguindo o padrão.
- Lhe desejo sorte ao lado da ruiva fatal.
- Obrigado, estou precisando.
Depois de desligar o celular e voltar para a sala, Souza percebe um outro clima entre os agentes junto com a chefe ruiva. Ela olha para o detetive que lhe devolve um olhar de interrogação.
- Algum problema investigadora?
Ela pisca algumas vezes antes de responder.
- Sim, temos um sequestro em andamento.
Souza precisou respirar fundo para não descer o nível. Mentalmente ele contou de um a dez e se dirigiu para uma das mesas. Nesse momento um agente informa a chefe sobre a localização da ligação.
- Como eu falei senhora Heloísa, a ligação foi feita de um telefone publico próximo ao centro da cidade. Isso dificulta o nosso trabalho em cem por cento.
- Se preferir posso pedir um agente que vá a esse lugar e tente trazer imagens de câmera de segurança. - Souza resolve palpitar. Heloísa olha para ele com seu olhar frio.
- Acha mesmo necessário?
- Temos que fazer alguma coisa.
- Está dizendo que estamos de braços cruzados detetive?
Souza se levanta.
- Podemos conversar?
- Sim! - Heloísa permanece parada no mesmo lugar com as mãos na cintura.
- Pode ser lá fora?
- Como queira!


Sombra faz anotações num caderno com suas pontas cheias de orelhas. Ele coça a cabeça com a caneta, faz careta e conta com os dedos. Que falta faz os estudos nessa hora. Sombra chegou a estudar num colégio estadual, mas parou ainda no fundamental. Hoje ele mal sabe escrever seu nome. Eloy passa por ele.
- Que fumaça e essa saindo de sua cabeça? - brinca.
- Estou calculando o valor da grana que iremos pedir pelo moleque.
- Nossa. - Eloy olha para a conta feita no caderno. - só isso de número e sua cabeça já entrou em curto?
- Você acha pouco?
- Sombra, esse garoto nasceu com a bunda virada pra lua. Os Fontes tem muito dinheiro. - Eloy pega o caderno. - peça mais.

Heloísa caminha pelo gramado bem cuidado do jardim da mansão Fontes. A seu lado Souza parece não vislumbrar da paisagem. Antes de chegarem a beira da piscina o detetive começa.
- Heloísa, quero acreditar que você já tenha algo em mente, certo?
- Certo!
- Pode compartilhar?
- Quero fazê-los acreditar que estão no controle, quero que eles mordam a isca.
- E se não morderem? - Souza entrelaça os dedos.
- Vão morder!
- Tudo bem. - estica o braço. - quero que saiba que você tem um aliado e não um rival.
- Ok. - diz secamente apertando a mão úmida do agente. - podemos voltar agora?
- Sim, vamos.

Lúcia Fontes abre o álbum e logo nas primeiras fotos as lágrimas descem com força. Ela se apega a uma onde os três estão sorrindo no último pique nique feito ali mesmo no quintal da mansão. O sol não estava quente e a brisa era fresca naquela tarde de Domingo. Marcos entra no quarto e se junta a sua esposa.
- Quando iremos fazer isso outra vez?
- Minha vida, não entregue os pontos assim, nosso filho vai voltar, tenha fé.
- Você me promete? - ela se vira ficando cara a cara com o marido.
- Prometo, estou disposto a pagar qualquer valor pelo João. - eles se abraçam.

8

Antes de se dirigir ao telefone Eloy se certifica se não há câmeras. Tudo limpo. A única câmera que há é de uma farmácia e o orelhão está juntamente no ponto cego.
- Sou muito sortudo mesmo.
A bandeja contendo chá, café e algumas bolachas foi posta na mesa pela empregada. Demora um pouco até o primeiro agente se servir do café. Souza deu preferência ao chá camomila. O telefone toca. Heloísa para de respirar e atende. Todos se voltam para a ruiva bonita ao telefone.
- Investigadora Heloísa Mattos falando.
- Hum, pelo visto estamos ficando íntimos não acha investigadora?
- Chega dessa conversa, quanto você quer pelo João?
- Andei fazendo as contas e acho que o loirinho vale muito mais. Pergunta ao senhor Fontes se ele quer mesmo filho de volta.
Marcos ao lado de Lúcia confirma com um gesto de cabeça.
- Ele disse que sim.
- Quero ouvi-lo.
Tremendo. Nervoso e em pânico o chefe da família Fontes assume o aparelho.
- Pronto!
- Que honra em falar com o senhor. Então, podemos fechar negócio ou não?
- Posso falar com meu filho?
- Ainda não.
- Por favor, eu lhe peço.
- Tudo bem, se não quer colaborar…
- NÃO, por favor, vamos, me passa o valor.
- Dez milhões!
Nem mesmo Marcos Fontes esperava um valor tão alto. Ele olha para Souza, para Heloísa e finalmente para Lúcia. A mulher engole seco e ele se sente numa encruzilhada. O que fazer? Num gesto rápido a investigadora pega o telefone.
- Veja bem, você terá os dez milhões, mas quero provas se o garoto está realmente vivo.
- O que a senhora prefere, uma orelha, um dedo…
- Quero falar com ele, agora!
- Agora seria impossível. - silêncio. - então, chegamos num acordo?
- Não até que tenhamos provas da vida do João. - Heloísa desliga.
O ambiente de repente ficou insuportável. Lúcia rosnou alto e em bom som.
- Você acabou de matar o meu filho, quem você pensa que é?
Marcos corre para junto de sua esposa que rejeita seu alento. Souza abandona o copo de chá e anda em direção a Heloísa que está visivelmente abalada.
- Investigadora, hora de reunir a equipe, precisamos retomar o controle da situação.

No barraco as coisas estão de ponta cabeça. Eloy conversa com Sombra sobre a conversa que teve com Heloísa. Sombra não gostou nada do que ouviu, não gostou nenhum pouco.
- Vaca. - soca a mesa. - quem ela pensa que é?
- Vai por mim cara, vamos devolver esse menino e cair fora, vamos deixá-lo debaixo de qualquer viaduto.
- Temos que seguir com o plano. - se levanta e esfrega o rosto. - ela pediu prova, então ela terá essa prova. Vou conseguir essa grana nem que seja a última coisa que eu faça na vida.

Heloísa se acomoda e cruza as pernas cobertas pela calça. Os outros agentes aguardam o pronunciamento da líder que antes de falar limpa a garganta algumas vezes.
- Acho que as coisas perderam um pouco o rumo. A vida de um menino está em jogo, a vida do filho do homem mais poderoso dessa cidade. Mais do que a vida de um milionário, a vida de uma pessoa corre risco. Temo que reconquistar essa confiança. - ela olha para Souza. - quer falar algo para equipe detetive?
- Sim. Cometemos um erro. - Heloísa arqueia uma das sobrancelhas. - esse erro pode ter destruído todo o trabalho bem feito até aqui. Mas, tiremos algo bom disso tudo, conseguimos o próximo contato, é nele que temos que nos prender. Tudo certo? - Souza passa a palavra para a líder.
- Vamos voltar para a sala, todos em suas posições.
Na volta para sala Marcos Fontes aguarda na entrada do cômodo os agentes. Ele faz um único sinal para Heloísa e Souza e ambos entendem o recado.

O escritório de Fontes e de deixar qualquer um de queixo caído. Ele se acomoda na cadeira com sua expressão gélida e olha para cada um deles.
- Chamei vocês aqui porque os considero os melhores, mas o que fizeram hoje foi um absurdo. Espero não ter que convocar uma outra equipe.
- Quanto a isso senhor Fontes deixo a seu critério, mas vale lembrar que a investigadora Heloísa está no controle da situação desde o começo. - ela olha para Souza com ar de surpresa. - seu filho está vivo, isso eu posso garantir.
- Como assim? - Marcos se inclina.
- Há coisas em que só devo falar com minha liderança senhor, me desculpe. Prometo trazer seu filho de volta, agora se nos dá licença, temos muito o que fazer.
Totalmente desarmado Marcos libera os policiais.

9

ela sente raiva e ao mesmo tempo uma forte admiração. No banheiro Heloísa se olha no espelho e não vê sua imagem nele. Tudo que ela consegue ver é Souza, aquele deus negro saindo em sua defesa perante o monstro. Ela não quer admitir, mas, ele é melhor que ela. Seria melhor deixar que Souza conduza o caso a partir dali? Ela sai do banheiro de cabeça erguida e ombros jogados para trás. Nesse momento o telefone da casa toca. Souza não se move. Marcos e Lúcia congelam. Heloísa pega no aparelho.
- Quero falar com o João.
- Vamos com calma minha senhora, quero saber se o senhor Marcos aceitou minha oferta.
- Vamos parar com essa palhaçada, me entregue o garoto e você terá seu dinheiro.
- Andei pensado, que tal vinte milhões?
- Que tal você deixar o pai falar com o filho? - a investigadora transpira a mão que segura o telefone.
- Há, sim, a senhora me pediu prova não é? Vamos lá, daqui onde estou falando há uma praça abandonada, aqui existe uma árvore, uma amendoeira, procure nos galhos dessa amendoeira à prova. - desliga.
Heloísa olha para os pais de João que se desmancham. Não há se quer uma ponta de esperança nos olhares. Souza tenta em vão confortá-los. Os outros agentes se empenham em tentar localizar de onde o criminoso fez o contato. Antes que o clima piorasse o policial com o fone de ouvido anuncia.
- Essa praça fica a meia hora daqui. - gira a tela para que Heloísa e Souza possam ver.
- Tudo bem, nada está perdido. - Souza bate com as palmas das mãos fazendo um barulho agudo. - eu vou a essa praça.

Luís entra na viatura e assume o volante. Antes de dar a partida ele é surpreendido por Heloísa que se debruça na janela do carro.
- Posso mesmo confiar naquilo que falou lá dentro?
- Sim!
- Mas…
- Heloísa, não estamos lidando com profissionais, uma hora ou outra eles entregarão o jogo, é só uma questão de tempo. Vamos deixar que pensam que estão no controle.
- Ok, boa sorte.
- Obrigado!
Enquanto olha a viatura se distanciando Heloísa fica a pensar no detetive. Que força o protege das pressões e ataques? De onde ele tirou tanta segurança? Tive sorte em tê-lo a meu lado nesse caso? Estou diante de um colega ou um professor? Quando o carro dobra a esquina e desaparece ela é possuída por um ânimo que a faz sorrir.

Sombra e Eloy comemoram mais um avanço com cachaça pura. O líder já se mostra embriagado com sua voz pastosa. Eloy permanece sóbrio. Ele nunca se embebeda.
- Em breve meu caro amigo estaremos ricos, milionários, vamos sair desse país, dessa miséria em que vivemos.
- Acha mesmo que iremos conseguir tirar dinheiro do Fontes?
- Acho não, tenho certeza. - coloca mais pinga na caneca. - hora de alimentar o passarinho, vá. - bate no ombro do parceiro de crime.

Marcos mais uma vez entra no quarto para tentar confortar sua esposa que parece ter envelhecido uns vinte anos. Algumas linhas de expressão se formaram em sua testa a deixando com ar de cansaço e desespero. Sem dizer uma só palavra o milionário a abraça por trás a beijando no ombro.
- Tenha fé meu amor. - diz Marcos.
- Minha fé se foi a muito tempo, tudo que restou dela foi o ódio. Quero que esses sequestradores apodreçam na cadeia.
- No meu caso ainda me resta fé. Tenho esperança de que João estará conosco. Lembra, eu lhe fiz uma promessa.
- Como consegue confiar em Souza e Heloísa, eles já provaram que não são capazes de resolver esse caso. - chora.
- São sim, Souza é o melhor detetive que temos na atualidade, tenho certeza de que ele trará o nosso João.
- Seja o que Deus quiser.

10

A praça realmente é como o sequestrador falou. Feia, abandonada, os únicos ocupantes é o mato e o lixo. Souza sai da viatura com sua pistola em punho. Logo atrás um agente com uma metralhadora. A árvore é localizada. O detetive ergue a cabeça para olhar os pequenos prédios e casas.
- Consegue ver algo suspeito? - Souza continua a olhar para cima.
- Acho que eles não seria tão burros de ficarem aqui.
- Concordo, vamos.
Souza anda até debaixo da amendoeira onde há uma camisa pendurada num dos galhos. Mesmo com dificuldade o agente consegue pegá-la. Ele a joga para Souza. A camisa está manchada de sangue.
- Como imaginei. - sussurra Souza.

Heloísa se serve do café quando Souza entra segurando a camisa. Faz sinal para quela o siga. Atônita a investigadora anda apressadamente até a cozinha que está vazia. Ela olha para a camisa suja de sangue e prende a respiração.
- Como falei, ele não são sequestradores.
- Temos que fazer um exame. - Heloísa olha para os lados.
- Nem precisa. - Souza dobra a camisa. - o fato é, os Fontes não podem saber da existência dessa camisa. Faça o exame se quiser, mas acho desnecessário, nem sabemos se essa é realmente a camisa do garoto. Estamos a alguns passos de pegá-los. Devemos aguardar o próximo contato ai então daremos um avanço nas negociações.
Souza já estava saindo da cozinha quando Heloísa o segura pelo braço.
- Você assume o caso a partir daqui, tudo bem?
- Como?
- Isso, você agora é o líder.

Souza além de conversar com a equipe montada por Heloísa, também convocou Márcia e outros amigos de departamento. Exigiu empenho nas buscas. Pediu para que as patrulhas fiquem atentas a qualquer ação suspeita. Para a investigadora ficar apenas seguindo ordens foi algo novo e complicado. Ela está acostumada a está de pé diante de homens e mulheres ouvindo suas instruções. Por outro lado, fazer parte de uma operação liderada por Luís Souza é algo importante, é como estar na sala de aula. A imprensa continua fazendo campana em frente a casa dos Fontes que até agora se quer apareceram na janela. Tudo o que se sabe até agora é que Heloísa e Souza estão no caso. O detetive termina a reunião com voz de comando.
- Vamos trazer esse garoto de volta para casa dele.

Eloy alimenta João enquanto Sombra mais uma vez faz contas e mais contas em seu velho e amassado caderno. João usa uma camisa dez vezes maior que o seu número. Seus pulsos estão feridos devido as cordas. O garoto perdeu alguns quilos e tosse bastante.
- Esse garoto precisa de cuidados. - Diz Eloy dando a última colherada de arroz e feijão.
- Por que? - Sombra continua a escrever.
- Ele não está bem, tossiu muito.
- Não sou médico e também não sou babá.
- Mas, Sombra…
- Cale a boca, você trouxe o celular que pedi?
- Está no armário. - responde entre os dentes.
O aparelho é velho, quebrado. Pertenceu a Eloy assim que o modelo foi lançado a cinco anos. Sombra se apossa do telefone. Antes de sair deixa recado.
- Vou fazer contato com os Fontes, dessa vez a grana é nossa. - Eloy apenas meneia a cabeça.

Sombra caminha com seu andar firme. Seu olhar é enigmático e sua face é mais gelada do que o frio ártico. Nem mesmo os vizinhos o conhecem. Sabem apenas que ele reside num barraco feito de madeira e barro. Ele anda e mal olha para as pessoas. Elas é quem olham para ele. Bastante nervoso ele percebe que está trancando os dentes. Melhor manter a calma. Ao dobrar a esquina que lhe deixará de frente com a avenida principal, ele bate de frente com duas viaturas. Sem ser percebido Sombra dá meia volta. Xinga baixinho. Decide pegar o caminho mais longo. Sombra não passa despercebido por ninguém. Ele atrai olhares e dos mais diversos. Quem o olha percebe logo que se trata de um indivíduo de índole duvidosa. Ou é um bandido ou coisa parecida.
Ele entra numa lanchonete. O balconista lhe oferece o menu que ele dispensa.
- Posso usar o banheiro?
- Para usar o banheiro precisa consumir algo senhor.
- Por favor, é urgente. - finge ter ânsia de vômito.
- Vai, primeira porta a direita.
Dentro do banheiro ele certifica se está realmente sozinho. Tranca a porta e disca o número da casa dos Fontes. No segundo toque Souza atende. Sombra engole seco.
- Então, gostou da prova que pediu?
- Desse jeito será difícil chegarmos num acordo.
- Quero os meus vinte milhões hoje.
- Você os terá assim que liberar o João. Tem alguma conta onde possa depositar esse dinheiro?
Sombra perde totalmente o rumo diante da pergunta de Souza. Demora um pouco para responder.
- Não, eu não tenho conta.
- Como será então a nossa troca?
- Você deve conhecer bem a cidade detetive, não é mesmo?
- Acredito que sim!
- Lixão da cidade. Existem dois caminhões abandonados lá, vou colocar o garoto dentro de um deles, eu e meus comparsas estaremos de olho. Eu mesmo vou pegar o dinheiro, caso eu percebe que é uma armadilha eu mato o moleque. Podemos fazer isso hoje?
- Agora se for possível.
- Gostei de negociar com você detetive Souza. As 18 horas de hoje então. - antes que Souza pudesse responder ele desliga. Retira o chip e o joga no vaso e depois dá descarga.

11

Souza, Márcia e Heloísa conversam com Marcos e Lúcia Fontes no escritório. O magnata o questiona.
- Souza, que garantias temos de que esse desgraçado está falando a verdade?
- Senhor Marcos, esses caras não são profissionais, eles se que tem conta em banco. Me passe os vinte milhões, vamos fazer conforme o combinado, ele são amadores mas não são burros, eles não tem nada a perder. - Marcos está hesitante. - Marcos, toda a polícia da cidade está envolvida nesse caso, não tem como escaparem, vamos pegá-los agora.
- Tudo bem.
- Ótimo. - Souza olha o relógio. - temos algumas horas até as seis.

João continua tossindo. Eloy está preocupado. Ele decide tirar o saco de pano que cobre a cabeça do menino um pouco.
- Obrigado, tio.
Ser chamado de tio deixou o bandido com o coração partido.
- Sente falta do papai e da mamãe?
- Sim, muita.
- Sabe, diferente de você, eu fui abandonado por meus pais, fui deixado para morrer numa calçada, até que uma alma caridosa me acolheu e me levou para um orfanato. Lá eu conheci o inferno. Me batiam todo santo dia. Havia um garoto que liderava a pancadaria. Os diretores tentavam dar jeito na situação, mas nada podiam fazer.
- Qual era o nome desse garoto que te batia tio?
- Luciano!
- Ele te batia e te machucava muito?
- Sim. - Eloy abaixa a cabeça e mexe nas unhas encardidas. - houve uma vez em que tomei uma surra durante quase meia hora. Precisou os monitores do lugar interferirem, acho que Luciano queria me matar. Fiquei internado cinco dias, esses foram os únicos dias em que tive paz.
- Que pena tio.
- Bom, isso ficou para trás, vou deixar você respirar só até o Sombra chegar, tudo bem?
- Tudo bem.- fala resmungando.
Antes de Eloy sair do quarto João diz.
- Tio, o senhor é legal. - com os olhos marejados o bandido faz sinal de positivo.

Márcia e Souza aguardam Marcos Fontes que está ao celular conversando com seus conselheiros. Conseguir vinte milhões assim líquidos é algo impossível. Por mais que a causa seja nobre, vinte milhões são vinte milhões. Depois de muito negociar os conselheiros cedem e Marcos agradece. Desliga o celular e se dirige ao detetive.
- Tudo pronto Souza.
- Ótimo, agora resta apenas esperar dar a hora.

Bastante alterado e nervoso, Sombra chega ao barraco alarmando a todos. Eloy se assusta com a chegada do parceiro de crime.
- Arrume as coisas Eloy, estamos a poucas horas de ficarmos ricos.
- Para onde vamos?
- Tire o garoto do barraco, temos uma troca a fazer.
- Posso conversar um pouco com você? - Sombra arqueia as sobrancelhas.
- Qual o assunto?
- Sabe quando você tem um pressentimento ruim, acho que não vamos conseguir. O melhor a fazer é deixar o garoto em qualquer canto da cidade e irmos embora.
- Eloy, eu sei que você sempre foi covarde, mas agora você está se superando. - abre o armário e começa a revirá-lo. - agora deixe de conversa fiada e prepare o garoto.
Eloy coça a cabeça e faz uma careta.
- Sombra, eu não vou.
Com sangue nos olhos Sombra fecha a gaveta com força.
- O que disse?
- Eu não vou. - gagueja.
O soco no estômago faz Eloy dobrar. Em seguida ele recebe outro golpe no rosto o fazendo cair em cima da mesa.
- Seu merda, levante-se, estou cansado de carregar você nas costas, vamos levante-se.
- Tudo bem, tudo bem, só não me bata mais.

As bolsas com dinheiro ocupam quase que todo o carro. Faltando pouco para o decisivo encontro Marcos e Lúcia rezam juntos no quarto. Souza e Heloísa trocam as últimas instruções. O detetive quer que o lixão fique cercado. Ele convocou também um atirador. Toda a impressa se aglomera com seus microfones e câmeras. A todo instante flashs ao vivo acontecem nas principais TVs do país. Aos poucos as viaturas vão deixando as calçadas ao redor da mansão. Marcos e Lúcia Fontes saem pela parte de trás da casa escoltados por dos gigantes policiais. Antes de deixar o portão que dá acesso a rua, o mega empresário conversa com Souza pelo celular.
- Lembre-se detetive, eu fiz uma promessa para minha esposa, eu disse a ela que eu traria o nosso João de volta, posso realmente confiar em vocês?
Acomodado dentro da viatura ao lado de Márcia e Heloísa, Souza confirma com a voz e gesto de cabeça. A investigadora ruiva se deixa dominar por um outro sentimento sem ser o de rivalidade. Sentada no banco do carona, sentindo de perto toda carga positiva que emana do homem negro a seu lado, ela percebe que seu coração bate de forma diferente, como se precisasse de um afago dele, quem sabe um beijo carinhoso. Estaria ela atraída por ele, justo por ele?
- Vamos buscar o João!

12

Quem olha os dois homens empurrando um carrinho de compras de supermercado, não imagina que ali estão os dois criminosos mais procurados pela polícia levando um garoto. Um é branco, cabelos ralos e tem o nariz torto. O outro tem o rosto marcante, mas sem expressão, possui um bigode falhado que parece ter sido feito de carvão. Dois mendigos, dois seres marginalizados, ninguém faz caso algum deles, apenas dois sujeitos que precisam urgentemente de um banho. O menor deles empurra o carrinho com algumas tralhas como, cobertor, latas de cerveja vazias e garrafas pets de refrigerante. Sombra e Eloy. Sequestradores. João sofre debaixo daquele lixo todo.
Subindo uma estreita rua antes de chegar ao lixão, Eloy percebe algo de estranho ,mas não diz nada. O lugar é arborizado e o perigo cresce dentro dele. A morte parece segui-los, Eloy consegue sentir o cheiro. Rapidamente ele puxa algo pontiagudo de dentro de seu bolso. Uma chave de fenda a qual ele fez uma ponta, quase um espeto de churrasco. Sem pensar muito ele a introduz no abdome de Sombra que solta um grito gutural. O homem se afasta segurando a ferida que começa a vazar sangue.
- O que está fazendo desgraçado?
- Me vingando. - Eloy aproveita a vulnerabilidade de Sombra para golpeá-lo mais uma vez.
Eloy fura o peito do companheiro que arquejante sente o frio do metal entrar em sua carne. A dor é aguda e ele sente fraqueza nas pernas. Eloy sorrir ao vê-lo naquele estado.
- Então, como se sente, Luciano?
Sombra ainda tenta reagir, mas recebe mais um furo, dessa vez o pescoço é o alvo. A jugular é rompida jorrando sangue como um chafariz escarlate.
- Isso é por você ter me batido naquele orfanato todo o tempo em que passei lá. - Luciano, o Sombra, tenta falar algo, mas suas forças estão se esvaindo assim como sua vida também.

O agente que os seguia chama Souza pelo rádio.
- Tem algo errado, dois mendigos estão brigando, um deles acaba de enfiar algo no crânio do outro.- Silêncio.- espere senhor, tem alguém dentro do carrinho de supermercado, é o João, é João Fontes.

Eloy e João entram no lixão. O bandido ainda segura a chave de fenda manchada de sangue. Ele olha ao redor e consegue ver os caminhões abandonados.
- João, é o seguinte, vou deixar você lá e cair fora, tudo bem.
- O senhor vai pra onde?
- Não sei, vou fugir, vamos.
Eles chegam ao local. O cheiro de podre é de causar ânsia de vômito em qualquer um. Tudo pronto. João fica sentado no para-choque do caminhão. Eloy olha para o garoto que sorrir para ele.
- Tio, não acha melhor o senhor se entregar?
- Claro que não, não vou ficar preso igual a um passarinho na gaiola.
Eloy vai se afastando quando a voz de Souza ecoa por todo o lixão.
- Fique onde está e solte essa arma.
O bandido volta e toma João como refém apontando a chave de fenda para a cabeça do garoto.
- Me deixem ir embora ou eu mato o pirralho, eu não estou brincando.
- Tio?
Souza aparece com sua pistola na mira de Eloy.
- Solte a arma e deixe o garoto ir, agora. - vocifera.
- Cale a boca, me deixe passar.
Souza tem um aparelho de escuta e ouve quando o atirador diz que tem Eloy na mira.
- Tio, se entregue, vai ser melhor para o senhor. - João implora.
- Isso mesmo, qual o seu nome?
- Isso não importa, eu nunca fui um nada mesmo.
- Eloy, o nome dele é Eloy. - João grita.
- Fique quieto garoto. - pressiona a chave de fenda contra a cabeça do menino que aperta os olhos.
- Eloy. - Souza começa. - sei que você não quer fazer isso. Me entregue essa arma, será melhor para todo mundo.- Souza joga a pistola no chão. - veja, eu não sou mais um policial. Venha comigo, tudo vai ficar bem.
Eloy tem os olhos esbugalhados. Sente medo, pânico, transpira e aperta o pescoço do João. Por um instante ele pensa em se entregar, mas logo a fúria o possui e ele volta a ser uma ameaça a vida do garoto.
- Vou matá-lo agora.
Souza age rápido dando a ordem.
- Quando quiser!
- O que? - essas foram as últimas palavras de Eloy antes da bala do rifle do atirador esfacelar seu crânio.
O corpo sem vida cai. João corre para junto de Souza que o abraça.
- Você está bem?
- Sim, estou bem, ele era bom tio. - diz olhando o corpo de Eloy.
- Sim, acredito, mas foi o caminho que ele escolheu, vamos, seus pais estão lá na rua.

13

Marcos e Lúcia abraçam o filho enquanto choram. Souza e Márcia acompanham a retirada dos corpos. Heloísa conversa com aluns agentes. A noite é fresca e a imprensa tenta a duras penas conseguir imagens da família milionária.
- Achoque o nosso trabalho acabou. - Márcia bate no ombro do chefe.
- Também acho.
Na saída do lixão Marcos e Lúcia abordam o casal de detetive para aos agradecimentos finais.
- Muito obrigado e desculpe tudo o que houve. - Marcos aperta a mão do policial.
- Devo desculpas ao senhor, Souza.
- Entendo, ter um filho nas mãos de monstros não deve ser nada fácil.
-Mais uma vez obrigado. - dá um abraço nos dois.
Heloísa também recebe os cumprimentos. Aos poucos o lixão vai voltando a ser aquele lugar sujo e fedorento de sempre.

Luís Souza está deitado e quase dormindo quando seu celular começa a tocar. Não querendo atendê-lo ele rola na cama até seu braço poder alcançar o criado mudo. Ele não reconhece o número. Resmunga achando se tratar de um repórter querendo uma exclusiva. O celular insiste em tocar ele atende.
- Alô?
- Luís Souza
Souza reconheceria aquela voz em qualquer lugar do mundo.
- Heloíza Mattos?
- Sim, pode falar agora?
- Sim, aconteceu alguma coisa?
- Não, só queria conversar com você um pouco.
- Sou todo ouvido.
- Essa conversa pode acontecer sem ser pelo telefone?
- Pode sim, quando você acha pode passar aqui, vou lhe passar meu endereço…
- Não precisa, estou no portão do teu prédio.
O sono passou na hora. Num salto ele se levanta e coloca a calça e uma camisa.
- Calma, vou liberar sua entrada. - diz quase gritando.
Enquanto se arruma ele fica a pensar, a final, o que Heloísa Mattos, a investigadora premiada queria com ele, um detetive como ele? Bom isso é uma outra história.

Fim