quarta-feira, 20 de julho de 2016

Guerra no Mundo sem Luz



 Depois de muito correr e flutuar numa fuga frenética por matas e terrenos pedregosos, o vampiro soldado de Conde Prado em fim foi capturado e amarrado no chamado canil dos homens lobo do cruel líder Abrantes. Com suas presas salientes e o rosto totalmente transformado, o noturno tenta de todas as maneiras se livrar das amarradas. Sob vigilância do braço direito de Abrantes, Hugo, um homem com quase dois metros e meio de altura e pesando 150 quilos de puro músculo, observa seu rival se mexendo desde a hora que chegou.
   - Esqueça morceguinho, fui eu quem fez esses nós ai. – diz com ar de riso.
   - Espere só eu poder sair daqui, Hugo, sugarei todo seu sangue de cachorro. – fazendo um rabo de cavalo em suas longas madeixas negras, Hugo se aproxima do rosto do vampiro.
   - É uma pena eu não poder fazer o que eu quero, senão meu querido, você já estaria em pedaços e essa hora. – fala jogando seu hálito natural de lobisomem no rosto jovial do vampiro.
   Nesse momento entra no recinto lúgubre o líder dos homens lobo, Abrantes, ostentando uma bela forma física e seus longos cabelos loiros.
   - Ora, ora o que temos aqui, uma "morceguinha" raivosa. – cumprimenta Hugo com um abraço. – ele falou alguma coisa Hugo?
   - Não senhor, só se mexeu muito. – cruza os braços semelhantes a troncos de árvores.
   - Muito bem, vamos começar então. – Abrantes se acomoda na frente do vampiro e o olha fixamente. – diz ai, o que Prado pretende?
   - Seu monte de lixo, acha mesmo que vou falar?
   - Sim!
   - Como tem tanta certeza?
   - Veja isso. – nesse momento entra outro homem com um jarro com água benta. – senão colaborar vou derramar isso na sua cabeça. – diz sorrindo.
   - Não vou trair meu líder jamais. – vocifera.
   - Tudo bem então. – se levanta e pega o jarro das mãos do assecla. – tem sua ultima chance agora, vai falar ou não? – um clima de pavor e ódio se instala no recinto mal cheiroso.
   - Louvado seja Conde Prado! – grita o vampiro aparentando ter seus 18 anos. Sem hesitar Abrantes derrama a água sagrada no alto da cabeça do noturno que vai derretendo como manteiga.

***

   A mansão é algo monstruoso, uma verdadeira construção colossal feita a mais de 600 anos. Em seu alojamento que se encontra no subsolo da mansão, Conde Prado se delicia beijando o pescoço e seios de Sâmela sua mulher e serviçal.
   - Como sempre deliciosa minha querida. – diz abrindo a blusa justa da vampira que ofegante deixa seus seios ainda mais volumosos.
   - Tudo que meu Conde quiser assim farei.
   Conde Prado é o líder da legião de vampiros do mundo sombrio. Cruel e sanguinário, o vampiro deseja a liderança total do mundo sem luz a qualquer custo. O casal de noturnos se deita na imensa cama com lençóis mais que brancos trocando calorosos beijos e toques nos sexos. O alojamento foi criado para que Prado não seja interrompido em momentos de decisão e principalmente nas horas de diversão, porém o clima lá fora não ajuda e seu fiel escudeiro, Sião, se aproxima com péssimas noticias.
   - O conde se encontra em seu alojamento? – pergunta a um vampiro escalado para montar guarda na gigante porta do alojamento feita de madeira bruta.
   - Sim senhor, e ele está acompanhado pela senhora Sâmela. – o vampiro de meia idade faz uma careta e respira fundo.
   - O assunto requer uma certa urgência. – coloca as mãos na cintura coberta por um cinto grosso de couro marrom.
   - Tenho ordens de não interrompe-lo senhor Sião!
   - Desde quando Prado mordeu essa vagabunda a mais de 200 anos ela vem atrapalhando a administração. – Sião olha ao redor. – vou esperar na sala.

***

   Com os cabelos empapados de suor, a serviçal e amante se deixa ser penetrada com fúria por seu homem que ao chegar ao clímax tem o rosto que outrora delicado, transformado num demônio furioso com dentes pontiagudos. Ela grita ao sentir o líquido denso e ardente a inundando por dentro.
   - Oh Sâmela minha diva fique mais um pouco em meus braços ainda lhe desejo ardentemente. – a mulher se envolve nos braços longos do vampiro e o indaga.
   - Jura que só há Sâmela em sua vida?
   - Sim minha rainha, somente ti. – responde ofegante. – por que?
   - Ouvi rumores de que você se deitou com outra aqui mesmo nesse leito. – Conde Prado franze o cenho.
   - Quem foi capaz de levantar tal calunia contra mim? Fale? – a segura pelo braço com truculência.
   - Joaquim!  - diz com pavor nos olhos.
   - O garoto Joaquim?
   - Sim meu Conde.
   - Vou matá-lo. – gira o pescoço. – guarda. – grita. A porta do aposento é aberta imediatamente e o jovem vampiro treme ao ver Sâmela nua e olha diretamente para o Conde.
  - Sim senhor!
  - Mande chamar Joaquim aqui. – nesse momento Sião adentra ao alojamento anunciando.
  - Joaquim foi capturado por Abrantes meu senhor. – Prado se veste com seu roupão e Sâmela se envolve nos lençóis.
  - Quando foi isso Sião?
  - Há algumas horas senhor. – engole seco.
  - E por que sou avisado só agora Sião? – Sião entrelaça os dedos e responde hesitante.
  - Perdoe-me Conde, o senhor estava ocupado com a Condessa senhora Sâmela. – a vampira olha para Sião furibunda.
  - Tudo bem, tudo bem, Sâmela, saia, vá tomar um banho, Sião, me espere na sala.

***

  Na enorme sala onde a mobília reflete a grandeza do império de Prado, Sião aguarda seu líder em pé ao lado da mesa de centro. Vestido com um lustroso sobretudo preto Conde Prado surge na porta que dá acesso a sala.
   - Então o nosso menino de ouro foi capturado por aquele cão raivoso do Abrantes?
   - Sim e se eu estiver certo a essa hora ele já deve estar morto ou coisa pior. – Prado levanta uma das sobrancelhas.
   - Há coisa pior que a morte?
   - Sim senhor, esses lobisomens são cruéis demais e se de repente resolveram tortura-lo?
   - Tem razão meu caro Sião, vamos montar uma equipe de busca.  – faz uma pausa e depois de se servir de um vinho o Conde pergunta. – soube dos rumores que rondaram o meu império?
   - Que rumores senhor? – diz Sião dissimulando.
   - De que eu me deitei com outra!
   - Não estou sabendo de nada senhor. – abaixa a cabeça. – devo montar a equipe senhor?
   - Imediatamente!

***

   Hugo montado num tordilho branco galopa com o corpo disforme de Joaquim no lombo do animal. Ele passa a todo vapor na frente da mansão do Conde e o joga com violência sem parar. O barulho do corpo ao entrar em contato com o solo produz um som estrondoso chamando atenção dos guardas. O situação em que se encontra o rosto e mãos do vampiro deixa todos com um único desejo; vingança. Prado chama todo seu exército na sala da cúpula faiscando pelos olhos.
   - Temos que agir logo e com força contra esses vira latas malditos. – soca a mesa.
   - Apoiado senhor. – bajula Sião.  – quando começaremos a retaliação?
   - Agora mesmo! – diz Prado com ímpeto.

***

   Abrantes e seu amigo Hugo olham de dentro do canil todo o movimento do mundo sem luz. Hugo percebe a preocupação no rosto fino de seu líder e se volta para os homens reunidos ao redor do lugar.
  - Abrantes? Peço aos soldados que se transformem?
  - Sim, Prado já deve está a caminho com seus morcegos malditos.
  Com uma ordem todos os homens se transformam em criaturas horrendas com pêlos por todo o corpo. O cheiro é de causar engulhos em qualquer um. Eles uivam numa melodia sinistra. Lobisomens furiosos desejosos por carne fresca. Abrantes e Hugo permanecem em suas formas humanas no alto do canil. O vento morno do final de tarde deixa os cabelos loiros do chefe esvoaçante lhe tapando a visão do exército de noturnos se aproximando.
   - A guerra vai começar.

***

   A revoada dos noturnos aos olhos de quem vê parece como nuvens de chuva que antecedem uma torrencial tempestade. A frente do funesto exército, está o terrível Conde Prado com seu rosto transformado num demônio com suas garras e dentes pontiagudos sedentos por sangue quente. Sião aos gritos coordena a massa de vampiros que rosnam e salivam. O mundo sem luz está preste a ver a mais terrível e sangrenta das batalhas. Vampiros vs lobisomens, uma guerra entre o mal, entre o inferno.
   Abrantes permite que seu rosto jovem e longilíneo se transforme numa terrível criatura uivante. A seu lado Hugo com seus enormes braços musculosos também segue o exemplo do líder e se torna num ser gigante com pêlos. Os uivos dos homens lobo ecoam nos montes além chegando aos ouvidos de Prado que escarneia.
   - Os cachorros estão a nossa espera. Vamos – vocifera.
   O primeiro ataque foi algo inesperado, pelo menos para o vampiro da extremidade. O salto digno de um atleta do lobisomem deixou o noturno com parte do pescoço dilacerado. O sangue pútrido do vampiro jorra e ele aos poucos vai se tornando uma bola de cinzas incandescente. Conde não gosta do que vê e pede mais atenção a seus soldados.
   - Sião, oriente seus homens.
   - Sim senhor.
   O pouso forçado dos vampiros foi algo desastroso e barulhento causando irritação em Sião.
   - Seus idiotas, ataquem.
   A ordem foi dada e no mesmo instante uma carnificina geral foi iniciada. Os lobos gigantes mordem pra valer rasgando a carne fazendo os vampiros gritarem. O sangue vivo espirra e derrama no chão rústico do mundo sombrio. Um lobisomem se distrai e tem uma das orelhas arrancada, como um cão ele choraminga de dor e rodopia para alivia-la. Outro vampiro aproveitando-se de sua vulnerabilidade o morde com voracidade. A morte do lobisomem acontece em segundos.
   O ruído da batalha é uma mistura de rosnados, grunhidos, gritos e até de brados. Em cada extremidade os lideres se encaram, o confronto final entre eles é inevitável, Conde Prado deseja sugar o sangue de Lobisomem até o seu final, já Abrantes quer despedaça-lo, deixa-lo em migalhas. Sião, o vampiro braço direito de Prado usa de sua habilidade e agilidade para atacar dois, três, quatro lobos de uma só vez. Hugo o maior dos lobisomens é feroz e um guerreiro fora do comum. Ele segura um noturno pelo pescoço e o esmaga com suas patas enormes, o seu lema é matar, isso o nutre.
   O mundo sem luz é palco de uma guerra inédita e inescrupulosa onde não há mocinhos e nem bandidos, todos são terríveis criaturas, todos pertencem ao mundo das chamas. Prado, enquanto mata mais um lobo, olha friamente para seu adversário e isso faz acender um ódio quase tangível.
  - Abrantes. – vocifera. – você é meu! – salta com suas unhas afiadas e prontas para fatiarem a carne fresca do cão raivoso.
  Abrantes sente que o perigo se aproxima, gira e o acerta no rosto com suas patas traseiras. O vampiro rei voa em alta velocidade com o rosto queimando devido ao forte golpe.
  - Maldito! – esbraveja Prado.
  Prado pousa e fica frente a frente com Abrantes que uiva. O sangue escorre do ferimento no rosto. O vampiro ainda meio tonto ensaia uma dança e uma canção, em seguida ele se transforma numa criatura com asas de morcego e cabeça similar a de um dragão. Estupefato, Abrantes trata logo de se defender, a briga a partir de agora é coisa de gente grande, muito grande.
   Sião e Hugo também se enfrentam e o bajulador de Prado leva a pior. Com uma dentada o braço esquerdo do vampiro é quase amputado a sangue frio. O vampiro ainda tenta correr mais a fúria do lobisomem é maior, Hugo experimenta da carne e gosta de seu gosto. Enquanto é devorado, Sião amaldiçoa toda a geração do lobo a plenos pulmões.

***

   Conde Prado e Abrantes, vampiro e lobisomem. Por um instante Prado volta a sua forma natural.
    - Há mais de 600 anos anseio por esse dia, quero um combate limpo e sinceramente, que vença o melhor. – Abrantes por sua vez volta a ser aquele homem atraente de face serena.
   - Patético! – imediatamente Abrantes se transforma do terrível lobisomem e parte pra cima do noturno.
   Mordidas, dentadas violentas, socos, arranhões profundos e muito sangue, esse é o quadro do combate entre os dois poderosos lideres do mundo sem luz. O lobo gigante se mostra mais prejudicado e de seu focinho desce uma mistura de saliva com sangue. O vampiro tem parte de suas asas quebradas e uma enorme ferida no tórax. As respirações são fortes e irregulares. Abrantes salta meio que desastrosamente e é mordido no pescoço por Prado que mais uma vez toma de seu sangue. O uivo de dor do cão é penoso. Hugo pensa em interferir, mas, hesita. Prado continua ali sugando, se alimentando da morte de seu rival. As forças do lobo se esvaindo. Aos poucos o corpo peludo de Abrantes vai tocando o chão. Os outros lobos uivam sentindo a derrota do líder. A ultima gota de sangue deixa Prado excitado. Ele deixa que o corpo já sem vida de seu adversário caia e seus olhos ficam flamejantes.
   - Eu venci. – grita seguido por seu exército.
   Hugo volta a sua forma de homem e se volta para seus companheiros.
   - Bater em retirada. – de repente a voz do Conde é ouvida.
   - Não precisam fugir com o rabo entre as pernas, o império dos vampiros permitirá que vocês caminhem rumo a outro mundo. – faz uma pausa e volta a ser o belo homem de pele pálida. – nós vampiros provamos que somos superiores aos lobos, por isso, eu como o senhor supremo desse mundo maldito lanço meu primeiro decreto; os lobisomens, devido a sua derrota, estão proibidos de se apresentarem aos quatro cantos, já tenho dito. – com uma gargalhada repugnante, Prado levanta vôo rumo a seu castelo.

***

  Deitado no meio de cinco vampiras, Conde Prado se delicia beijando uma por uma e tomado seu vinho. Do lado de fora Sâmela se amofina olhando pela janela a eterna noite do mundo sem luz. Com a morte de Sião, o vampiro escalado para o lugar é Arthur, um sujeito perigoso e fiel.
   - Senhora Condessa. – a reverencia. – me desculpe a intransigência, mas, posso sabe o que há?
   - Eu o odeio Arthur, o odeio com todas as minhas forças.
   - Senhora Condessa, me desculpe mais uma vez, mais a senhora sabia que o Conde agora é o supremo de todo esse mundo, é natural que todas sejam dele. – Sâmela se vira e olha os lustrosos olhos verdes de Arthur.
  - Logo eu sou dona de todos não é, Arthur? – o vampiro engole seco.
  - Naturalmente senhora.
  - Muito bem, vou para meus aposentos. – sorrir. – apresente-se lá em meia hora. – se afasta e depois gira os calcanhares. – isso é uma ordem.
  - Sim senhora. – responde com ar de riso.

***

  O canil está repleto de homens feridos e com os semblantes decaídos. Alguns tentam se manter de pé mais a dor os deixa no chão. Hugo olha para o céu vermelho igual a sangue e um dos súditos se aproxima.
  - Senhor, o que pensas? – Hugo olha friamente e responde.
  - Contra ataque!!
FIM

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