O despertador pela quinta vez dispara executando um som estridente, porém o casal não desperta. Em cima do criado mudo as latas de cerveja denuncia a catástrofe da noite passada. De bruços o homem ronca e de sua boca envolvida por uma grossa barba sai uma baba que molha a fronha azul do travesseiro. Ela, semi nua com os seios médios a mostra, ainda segura uma lata de energético que por sorte o líquido derramou todo no chão e não na cama. Já são quase nove horas e até agora ninguém se mexeu. Parecem mortos. Alguém toca na porta duas vezes. Aos poucos ele vai abrindo os olhos e vendo tudo disforme. O som das batidas ainda soam longe. O gosto amargo em sua boca o faz voltar a si. As batidas ficam mais fortes e por fim ela se mexe.
- Wagner, estão batendo. – diz a mulher com voz de sono.
- Deve ser a arrumadeira enchendo o saco. – fala meio que enrolado.
Bem devagar Wagner se levanta e se alonga. Apesar dos 52 anos que carrega, o empresário consegue manter sua boa forma. Apenas de cueca ele atende.
- Bom dia senhor Wagner, vim trazer o café. – diz a funcionária do hotel toda sorridente.
- Bom dia, pode deixar ali mesmo. – responde aos bocejos.
A mulher baixinha natural do Ceará entra e não deixa de reparar em Wagner ostentando sensualidade. O quarto ainda cheira cerveja e outras bebidas. O carrinho é deixado no canto. Wagner se despede da mulher e se volta para a outra deitada na cama.
- Morgana, vem tomar café, os ovos vão esfriar. – boceja mais uma vez.
Morgana apenas acena dizendo para esperar. Impaciente Wagner vai até ela e a belisca nas nádegas.
- Ai amor, isso dói. – reclama.
- Venha logo mulher.
Morgana é um espetáculo de mulher. Mediana, morena, pele bronzeada, olhos claros e longos cabelos com luzes, ela arranca olhares por onde passa. Juntos eles tomam café da manhã. Enquanto Wagner se veste, Morgana toma um delicioso banho.
- Vou na frente, tenho que receber alguns clientes, você vai chegar lá que horas?
- Na parte da tarde depois do almoço, também tenho que receber alguns clientes, aqueles Chineses, lembra?
- Hum, lembro sim. – aperta a gravata. – me liga.
***
Na empresa, Wagner gesticula bastante apresentando alguns slides aos clientes que se encantam com o produto apresentando pelo empresário.
- Então é isso senhores, o que acharam?
- Eu fiquei pasmo, com certeza esse produto cairá como uma luva em minha empresa. – diz um dos clientes.
- Eu também, podemos fechar negócio agora mesmo. – afirma outro.
Todos os cinco homens ali na sala conversam empolgadamente com Wagner, um deles se aproxima e estende a mão.
- Senhor Wagner, me chamo Almeida e estou aqui representando minha empresa, infelizmente não poderei ficar para a confraternização, tenho outros fornecedores para visitar.
- Poxa, mais que pena, toma uma champanhe pelo menos.
- Não vai dar, tenho que ir, mas, posso tirar uma foto para marcar esse momento?
- Lógico!
Wagner se abraça ao representante e logo o flash o cega momentaneamente.
- Podemos marcar um almoço, ou coisa assim o que acha? – propõe Almeida.
- Acho ótimo, amanhã então?
- Perfeito!
Almeida se despede deixando Wagner com outros bebendo.
***
No restaurante, Wagner, Morgana e Almeida degustam lagosta fresquinha enquanto falam pacificamente sobre negócios. O representante não tira os olhos da morena sentada ao lado do empresário, principalmente do decote. Temendo ser pego, Almeida trata logo de se concentrar na conversa.
- Sua empresa, como anda meu caro Almeida?
- Bom, como já falei, estamos atravessando uma fase um pouco ruim, nada de tão grave, já tivemos em outras piores, vamos superar essa com certeza.
- Você acha que com o produto do Wagner vocês irão decolar? – indaga Morgana.
- Sem duvida. – Almeida entrelaça os dedos. – o seu produto é muito bom senhor Wagner, estamos acreditando nisso piamente.
- Ótimo, vamos comemorar pedindo mais uma dessa. – Wagner aponta para o que sobrou do crustáceo.
- Que tal uma foto? – propõe Almeida.
- O senhor adora mesmo fotos hein senhor Almeida. – diz Wagner.
- Olha, se eu não fosse seguir a carreira executiva, juro que estaria por ai registrando as mais belas imagens.
***
Depois de mais uma noite de amor os dois dormem profundamente. Próximo da uma da manhã o celular de Wagner toca, no visor o nome Almeida. Morgana acorda e atende.
- É um pouco tarde para ligações o senhor não acha, Almeida?
- Mil perdões senhora Morgana, preciso falar com o senhor Wagner urgente.
- Ele está dormindo! – diz Morgana impaciente.
- Mil desculpas, mas, é urgente, a senhora poderia passar o celular para ele?
- Tudo bem. – bufa chamando o homem desmaiado na cama. Meio bêbado Wagner atende.
- Qual foi Almeida? – esfrega o rosto.
- Nossa empresa infelizmente terá que romper com o contrato, eu sinto muito senhor.
- Por mim tudo bem, já tenho dinheiro o suficiente para dez gerações. Boa noite Almeida, foi um prazer conhecê-lo.
- O prazer foi todo meu senhor Wagner.
***
Quando finalmente Wagner acordou Morgana já não estava mais. Um recadinho em cima do criado mudo dizia que ela tinha que chegar cedo a empresa para resolver questões burocráticas. Bocejando ele vai até a geladeira coçando as partes baixas por cima do short de dormir. Alguém toca a porta. Ele olha o relógio na parede. Quase dez. Morgana com certeza pediu mais um café para as dez. ainda bocejando ele atende a porta e ao abri-la ele quase enfarta.
- Ruth?
- Oi Wagner, bom dia!
- Olha, eu só não passei a noite em casa por que... – diz gaguejando.
- Por que passou a noite com aquela vagabunda não é?
- Que vagabunda? Vai começar com aquele papo de novo, Ruth, eu já falei que eu não tenho mulher na rua. – Wagner se afasta da porta.
- Ah, não? Vai me dizer que você dormiu nesse hotel chique sozinho?
- Claro que sim.
- E a Morgana? – Ruth encara seu marido.
- Eu não tenho nada a ver com ela, Morgana é só minha funcionária eu mal falo com ela.
Ruth abre a bolsa e puxa uma foto.
- Não fala, mas, sai com ela para comer não é? – mostra a foto de Wagner abraçado com Morgana no restaurante.
- Foi uma comemoração nesse dia.
- Hum! – Ruth franze a testa. – e você pagou lagosta para todos os funcionários?
Wagner engole em seco. Por um instante ele olha para a foto e percebe o ambiente ao redor e de repente seus olhos são abertos, foi Almeida quem bateu essa foto!
- Como conseguiu essa foto? Quem lhe deu? – pergunta tremendo os lábios.
- Não interessa. – Ruth vocifera.
- Isso não prova nada, Ruth, eu não tenho nada com a Morgana. – vocifera também.
- A é espertalhão. – puxa da bolsa um gravador. – escute isso.
- "É um pouco tarde para ligações o senhor não acha Almeida?"
Ruth olha para o marido que perde a cor.
- Devo continuar? - Ruth aperta o play.
- "Mil perdões senhora Morgana, preciso conversar com o senhor Wagner urgente!"
Ruth continua olhando feio para Wagner.
- Então você não tem nada com a Morgana?
Em sinal de puro desespero, Wagner se descabela ainda mais e depois de muito relutar ele assume a traição.
- Tudo bem, tudo bem, eu me relaciono com a Morgana sim, já algum tempo. Pronto falei.
- Pela primeira vez você tomou uma atitude de homem. – diz Ruth ainda com o gravador na mão. – vou por um ponto final nisso tudo, quero o divórcio e o quero já, parte de seus bens são meus.
- Que bens, que bens, estou quebrado, a empresa vai fechar, estou falido Ruth.
Mais uma vez Ruth aperta o play
- "Por mim tudo bem, tenho dinheiro o suficiente para dez gerações"
Wagner mais uma vez se descabela. Provavelmente Ruth já procurou os meios legais para se divorciar. Wagner deixou o quarto daquele hotel odiando a todos, principalmente a Almeida. FIM
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