sábado, 15 de maio de 2021

Alta Pressão - Capítulo 4

 


Alta

Pressão

Capítulo 4

 

No que me tornei? Logo eu, criado com todo o rigor por minha vó materna que exigia de mim disciplina e uma boa dose de espiritualidade. No que me tornei? Do que valeu todo o esforço de minha vó que só queria que o único neto tivesse um destino diferente dos pais que se foram cedo demais. Meus pais se deixaram levar pela vida desregrada, sem limites, empapada por doses e mais doses de álcool e droga pesada. Graças a minha vovó eu fui resgatado a tempo, antes de ser consumido também e tudo pra que? Hoje tenho minha cabeça a prêmio por um valor alto. Me desculpe, vó, não estou fazendo valer o seu esforço.

Dutra abriu bem devagar a janela do apartamento onde se encontra escondido desde quando soube que toda Viva Paz está a sua procura. Seu coração bateu um pouco mais aliviado ao ver os dois seguranças posicionados do outro lado da calçada. Enquanto os dois estiverem ali, suas noites de sono estarão garantidas — pelo menos é o que ele pensa. Tudo em paz lá fora, agora é hora de sentar- se com seu braço direito e traçar novos rumos. Viver escondido não é vida pra ninguém. Ele precisa admitir, dessa vez a polícia fez um golaço jogando a população contra ele. Porém ele precisa reagir.

— Posso entrar? — perguntou Sueco parado na porta.

— Está atrasado, hein! — lhe apontou uma das cadeiras.

— Ué? Acordou de ovo virado? É a vida meu brother.

— Já chega, eu não tenho o dia inteiro, preciso de uma solução e rápido.

Sueco olhou para Gilmar um pouco mais demorado. O companheirismo dos dois é de longa data, teve seu início no reformatório quando ambos tocavam o terror nos corredores estreitos e escuros da instituição. Dutra era o mais ousado. Certa ocasião ele invadiu a sala da direção e destruiu tudo o que estava a sua frente. Isso lhe custou quinze dias de detenção, sem falar nas intermináveis surras dadas pelo próprio diretor. Gilmar sofria por agir por ímpeto, por isso ele se juntou a Sueco para pensar por ele.

— Eu te avisei. Atacar a polícia é assinar atestado de burrice.

— Eu precisava dar uma resposta. — vociferou.

— Pois é e agora tem uma cidade inteira atrás de você.

Gilmar voltou a abrir de leve a janela.

— Você é a cabeça pensante do grupo. Me tire dessa enrascada.

 

*

Um trinta e oito na cintura. Uma jaqueta suja para cobrir a droga da arma e agora e só ir lá e pegar o sujeito. Simples. Assim sobrevive um caçador de recompensas. Ele é conhecido pelo vulgo Cacau, devido ao seu tom de pele. Cacau leva a vida matando bandidos por soma em dinheiro vivo. Assim que soube da recompensa a Gilmar Dutra, ele adiou os outros compromissos para tentar a sorte com o maior malfeitor de Viva Paz.

— Matar Gilmar Dutra? Você está louco, Cacau? A polícia também está a sua procura. — alertou um cidadão em situação de rua.

— Prometo que, seu conseguir pegar o merda do Dutra, irei lhe tirar dessa vida. Combinado?

O homem encardido cuspiu o pedaço de pão e sorriu mostrando uma arcada dentária apodrecida.

— Agora eu dou valor.

Cacau subiu em sua motocicleta barulhenta e disparou rua afora deixando poeira para trás.

 

*

 

O treinador propôs um curto treino ao ex campeão, coisa que Gustavo aceitou de imediato. A bola da vez foi um dos alunos da própria academia onde o marido de Lídia e dono. Enquanto Gustavo se prepara para o combate, ele observa seu o voluntário se aquecendo espancando o saco de bater.

— Ele tem um cruzado de esquerda potente. — falou.

— Pois é, fique distante, ele não é qualquer aluno, Júnior tem futuro, ouviu?

— Pode deixar. — colocou o protetor de cabeça. — vamos nessa.

A luta treino começou lenta com ambos se estudando. Gustavo segue a risca às orientações de seu treinador sem mantendo distante de júnior. Ao contrário do ex campeão, o jovem precisa mostrar serviço, por isso ele decidiu ser mais agressivo. Com um bom jogo de pernas Júnior disparou o cruzado que explodiu no rosto de Gustavo que desabou.

— Nossa, que coice. — resmungou o treinador baixinho. — campeão, você está bem?

— Estou sim, eu só perdi o equilíbrio.

De volta ao combate Gustavo agora levará o treino um pouco mais a sério e encarar Júnior de igual para igual. De repente a luta ficou violenta demais com os lutadores trocando golpes fortes. Junior mandou outra vez seu cruzado de esquerda. Gustavo se esquivou. A guarda ficou imperfeita. O campeão aplicou um direto na ponta do queixo deixando o aluno sem rumo certo. Outra vez Gustavo o acertou e pronto, Júnior beijou a lona.

— É isso aí, Gustavo. — vibrou Baixinho. — Júnior, como você está?

— Apagado. — respondeu o treinador auxiliar.

Junior acordou e foi levado para a enfermaria. A autoconfiança de Gustavo ultrapassou o teto, mas ainda assim ele não consegue relaxar, isso porque ele conhece muito bem o potencial de seu adversário. Junior não é Jorge Touro, nem chega aos pés dele. Junior tem tudo para ser um ótimo pugilista, tem força, técnica, é rápido, mas Touro é o Touro. Depois das orientações de Baixinho, Gustavo tomou uma chuveirada para seguir com o trabalho na academia.

 

*

 

Além de bonita ela é extremamente inteligente, porém tem um único defeito; não é minha. Álvaro permitiu que pensamentos como esse lhe invadisse atrapalhando sua linha de raciocínio. Sua sala se transformou num verdadeiro auditório onde sua melhor policial discursa e estuda a melhor forma de se combater o crime organizado. Logo atrás dela está o mapa da cidade projetado com alguns pontos em vermelho. As regiões mais afetadas pela violência infelizmente são onde o estado de uma certa forma negligenciou.

— Vejam, senhores, são crianças, jovens e adultos que não são assistidos pelo estado os que mais estão inclinados ao crime. O crime os adota e eles aceitam porque? Alguém se habilita?

Álvaro pediu a palavra.

— Eles aceitam porque não há outra coisa a ser feita. Dinheiro fácil, dinheiro vivo. Imagine um menino de dez, quinze anos, louco por um tênis de marca ou videogame. A mãe e pai sequer conseguem alimenta-lo. A saída é o crime.

Lídia estalou os dedos.

— Certo! E, pessoas como Gilmar Dutra, se aproveitam do fato de serem pessoas pobres e necessitadas para alicia-las.

— A Liga Vermelha! — balbuciou o delegado. — o câncer de Viva Paz. — fechou o punho.

A reunião terminou. Álvaro voltou para sua mesa ainda embasbacado com a agente que simplesmente se encontra irresistível usado uma calça jeans justa, camisa preta, rabo de cavalo e com o distintivo pendurado. Lídia terminou de juntar suas coisas e olhou para o chefe.

— Sei que você quer dizer alguma coisa, Delegado Álvaro, pode dizer.

— Você foi perfeita. Pronto disse.

— Tem certeza? — pegou às pastas.

— Não. Gilmar declarou guerra ao estado. E agora que ele é o homem mais procurado da cidade, temos que levar em consideração que ele vai usar todo o seu poder de fogo contra nós. Não podemos só ficar nos defendendo.

— Então, o que o senhor está me propondo é...

— Isso mesmo. Uma ostensiva.

 

*

 

O último chute acertou com força a boca de Cacau lhe arrancando a sangue frio um canino. Sueco recolheu o dente do caçador de recompensas do chão e elogiou Dutra pelo feito.

— Rapaz, que bicuda foi essa. Desse jeito você vai ser convocado para a seleção hein.

— Vou arrancar todos os dentes desse otário. — outro chute no rosto.

Cacau se encontra amarrado com os braços para trás e deitado no chão e sofrendo os mais terríveis golpes pelo sapato de bico fino do rei do crime. A cada chute novos respingos de sangue. Seu rosto está desfigurado e ele já desmaiou algumas vezes.

— Legal. Mate esse imbecil e depois o coloque na porta do DPVP. Vamos dar um recado para os vermes.

 

 

 


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