quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Paredes | Capítulo final

 


Rodrigues ainda insistia com seu parceiro sobre a possibilidade de pedido de apoio quando Gilberto viu uma movimentação na parte da frente da casa. Carolina fez uso dos binóculos.

— Confirme se ele está portando uma arma. — orientou Pedrosa.

— Positivo! Uma Glock. — se virou para o colega. — eu falei que teríamos que solicitar apoio.

— Não será necessário. — sacou do coldre sua 45. — nós dois daremos conta desse bunda mole.

Nesse momento ouviu-se um grito. Rodrigues mais uma vez conferiu com o auxílio dos binóculos a situação logo a frente. Toni caído segurando suas partes íntimas e uma moça morena disparando em direção a saída.

— Fique com a garota e deixe ele comigo.

— Tenha cuidado.

Sentindo uma dor lancinante o aliciador ficou de pé ainda em tempo de ver sua presa correndo igual a uma louca pelo caminho de volta para a estrada. Nutrido por uma raiva infernal ele ignorou todo o incomodo que ainda sentia partindo atrás com sua arma em punho. Ela não pode escapar tão fácil assim, pensou correndo e tropeçando nas pedras soltas.

— Volte aqui! — gritou.

Gil o surpreendeu saindo de trás de uma árvore já lhe dando voz de prisão.

— Nem mais um passo, Toni.

— Mas, quem é você?

— Polícia de Cabo Verde, você está preso. — lhe mostrou o distintivo preso no cinto.

Com a adrenalina circulando a mil por hora nas veias, Toni Silva tomou a pior decisão de sua vida. Ele ignorou por completa a ordem dada pelo agente e atirou. A bala passou raspando o ombro direito de Gilberto que o acertou no braço da mão que segura a arma. Com o impacto o rapaz perdeu o equilíbrio indo ao chão.

— Solte a arma, seu merda.

Esvaindo em sangue o cabeludo esboçou uma reação, porém o detetive foi mais rápido e ágil lhe aplicando um forte chute no rosto. Toni perdeu a força no braço alvejado deixando a arma cair. Pedrosa a chutou para longe.

— Vamos, me leve até a casa. — Gil estava ofegante.

Rodrigues e Bruna voltavam apressadamente para junto do agente que empurrava Toni que tinha às mãos algemadas para trás.

— Gil, segundo a Bruna, lá dentro ainda há outros comparsas.

— Armados? — Pedrosa interrompeu o caminhada. Toni riu. — qual a piada?

— Vocês não podem prender a rainha.

Rodrigues e Bruna deixaram o investigador atualizado de tudo que acontece dentro da casa, tudo isso sob o sarcasmo incessante do aliciador de Sabrina. Gil autorizou a solicitação de reforço exigida por Rodrigues.

— Algo muito grave está acontecendo lá dentro, precisamos entrar lá já. — declarou Pedrosa.

*

Sabrina Fialho era pura excitação e mal conseguia manter suas mãos quietas. Bem a sua frente a dupla de sequestrados ainda hesitavam em começar de fato o show erótico.

— Como é que é? Eu quero sexo. E se você for bem, vou querer você pra mim, garota. — vociferou a rainha.

Sérgio tocou nos ombros de Michele sentindo todo o tremor de seu corpo. Logo ela que sempre sonhou em curtir sua lua de mel com o homem de sua vida a qual ela vem se guardando até o dia de hoje. Chorando, com um gesto de cabeça ela autorizou que Ornelas se aproximasse um pouco mais e a tocasse até que um barulho vindo da cozinha chamou mais a atenção de Sabrina.

— Vá ver. — estalou os dedos para outro súdito. — deve ser o Toni precisando de ajuda com a fujona.

— Sim, senhora minha rainha.

Ao deixar a sala e cruzar a porta da cozinha o jovem negro deu de frente com outro negro, porém este estava armado e tinha um distintivo da polícia civil fixado no cinto. Gil o pegou desprevenido e lhe aplicou um murro no rosto que o deixou fora de si.

— Saia da minha frente, vagabundo.

O cheiro de carne podre foi a primeira coisa que deixou o policial em alerta ao invadir a casa. A segunda, como não poderia ser diferente, foi a escuridão. Impossível não se revoltar com certas atitudes de maus feitores e viciados.

— Polícia de Cabo Verde, vocês estão cercados. — gritou.

Um dos comparsas numa tentativa de proteção ao reinado de Sabrina, partiu pra cima do agente segurando um estilete desferindo golpes a ermos sem sucesso. Pedrosa mesmo com dificuldade para enxergar aguardou o melhor momento para ataca-lo. O soco o fez cair sobre outros viciados. Sabrina ficou de pé em cima da poltrona.

— Vamos seus idiotas. Acabem com esse verme.

Para evitar um confronto ainda maior, Gilberto disparou para o alto afastando-os.

— Quero que todos vocês encostem naquela parede ali, agora. Você também. — disse a Sabrina.

— O que fez com o Toni? — questionou ainda de pé na poltrona.

— Ele está sob custódia lá fora, agora chega de papo, desça daí já.

Sabrina deu uma longa olhada no terrível cenário ao seu redor e pela primeira vez em muito tempo ela não se sentia tão impotente. Tudo havia ruído. Lentamente ela foi descendo de seu “trono” quase que aos prantos olhando para a quarenta e cinco de Gil Pedrosa apontada para ela. Sabrina se juntou aos demais sentados aos pés da parede. Rodrigues e mais outros sete PMs entraram já dando voz de comando aos detidos.

— Tudo sob controle pessoal, temos que achar os reféns. — Pedrosa se dirigiu a Sabrina. — aonde eles estão? — vociferou.

Quando a rainha criou coragem para falar, um dos policiais anunciou a descoberta do cativeiro.

— Eles estão aqui. — gritou.

Sérgio Ornelas e Michele foram separados dos demais e levados para fora da casa. Imediatamente às janelas foram sendo abertas dissipando as trevas daquele lugar. A luz natural do dia revelou um caos ainda pior. Analisando com cuidado era possível ver ossadas de animais, sem falar em resquícios de vômitos. Rodrigues juntou-se ao colega abismada.

— O que o vício é capaz de fazer com um ser humano. — pôs às mãos na cintura.

— Triste verdade! Encontraram mais alguma coisa?

— Sim! A causa desse odor forte...

Gilberto não esperou que sua parceira completasse a fala.

— Homicídio! — guardou a arma no coldre.

— Acho que não. A pessoa deve ter falecido de overdose e seu corpo foi deixado em outro cômodo da casa. Que loucura, meu Deus. — meneou a cabeça.

Sabrina era a única que encarava os policiais sentada de qualquer jeito no chão.

— Toni Silva e essa rastafari tem muito o que explicar. Vamos levá-la.

Toni voltou a sentir os raios solares em seu rosto quando a parte de trás da viatura foi aberta e sua rainha foi posta lá dentro juntamente com ele. Assim como Toni, Sabrina tinha às mãos algemadas para trás. Só agora ele pode perceber o quanto foi tolo ao se submeter a uma pessoa tão suja e tão digna de pena como ela.

Sérgio Ornelas, Michele, Bruna e Letícia foram levados por dois policiais em uma viatura descaracterizada da polícia civil para o departamento de Cabo Verde onde seus familiares os aguardam. Gil campanha o isolamento da casa ao lado de Carolina. Todo o espaço foi cuidadosamente isolado por fitas amarelas.

— Belo trabalho. Parabéns. — disse Rodrigues batendo no ombro do companheiro.

— Obrigado!

— O trabalho ainda está no início, quantas coisas aquelas paredes esconderam, não é?

— Sexo, drogas e bebidas. Um prato cheio para uma juventude sem estrutura. Lamento muito. Quem erra tem que pagar. Vamos.

*

Em seu depoimento, Toni Silva abriu o jogo contando tudo o que acontecia dentro da casa e também ajudou a esclarecer sobre a permanência de um corpo dentro do recinto. Segundo ele era uma forma de intimidação aos novos membros do reino.

— Então foi overdose mesmo? — questionou Gilberto.

— Sim!

Já Sabrina Fialho se manteve calada durante seu depoimento, disse que só falaria alguma coisa na presença de um advogado. A única dúvida era: qual advogado? A polícia fez um levantamento e descobriu que nem “Caboverdense” ela é. Sabrina saiu da casa dos pais ainda na adolescência e nem completou os estudos. Sua situação é realmente complicada.

— Acabamos por aqui. — Gil se levantou. — agora cabe ao juiz decidir.

 

A noite, depois de uma bela transa com Luana, Pedrosa voltava do banho para o segundo tempo com sua amante quando foi pego de surpresa por uma pergunta.

— Já conseguiu um lugar para ficar?

— Quer mesmo se livrar de mim pelo jeito.

— Não seja tão dramático agente Pedrosa. Você ficando aqui, com o tempo vai se tornar meu marido e eu não quero perder meu namorado, entendeu agora? — Luana se enrolou no lençol.

— Você tem razão. Amanhã estarei saindo daqui e alugando um apartamento. Mas enquanto isso... — deitou-se. — vamos encerrar com chave de ouro.

 

No outro dia, na parte da tarde, Gilberto e seus filhos abriam juntos a porta do novo lar do papai. O policial agora possuí um novo endereço fixo de frente para a avenida mais famosa da cidade. Claro que a adolescente amou o lugar onde ela passará os finais de semana com seu irmão.

— Caramba, pai, gostei. — disse Gerson correndo pelo corredor.

Pedrosa só era sorrisos ao vislumbrar a alegria dos meninos.

— É verdade, pai, isso aqui é incrível. — completou Carla.

— Que bom que gostaram. Podem vir quando quiserem, combinado?

Gerson voltou do quarto já com uma proposta.

— Que tal uma pizza gigante para comemorar?

Carla e Gil se olharam concordando.

— Vou ligar para a dona Bete e dizer que o senhor vai nos levar depois do  horário combinado, se não ela vira uma fera. — pegou o celular na bolsa.

Elisabete faz falta, porém Gilberto terá que aprender a conviver com isso e também com a culpa. Dívidas precisam ser pagas e erros reparados. FIM.

 

 

 

 

 

 


Um comentário:

  1. Muito bom, meu amigo! Vc sempre nos surpreendendo com uma história boa de ler e que nos impacta, prendendo a atenção. Sou fã! Já quero novos lançamentos

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