Fome, muita fome. Ele para e olha para trás e só vê...nada, mais uma vez ele sente uma onda de medo circular por seu corpo. Tira a mochila das costas e se apóia nos joelhos. Por incrível que pareça ele sente saudade do grupo barulhento e mal educado “onde estarão?”
Mais meia hora de caminhada ele avista uma casinha, uma cabana na realidade. De longe é possível ver um ponto de luz e algo ou alguém se movimentando lá dentro. À hora é avançada e ele precisa descansar. Ele se aproxima da cerca de arame farpado e bate palma. Ninguém responde. Mais uma vez ele bate palma e mesmo no escuro ele consegue ver alguém na janela. Apenas a silueta. Ele acena e logo a pessoa desaparece. A porta da cabana se abre e um senhor de pele negra segurando uma lamparina caseira o atende:
- Oi moço, é um pouco tarde o senhor não acha?
- Me desculpe senhor, eu não tenho onde passar a noite, eu me perdi do meu grupo.
- Você é turista?
- Sim, sou, será que eu não poderia descansar na sua cabana? – o velho de barba totalmente branca coça a cabeça por cima do chapéu. – por favor, essa estrada é muito perigosa e não sei onde ela vai dar.
- Gosta de carne de porco?
Mesmo sem entender ele diz que sim com a cabeça.
- Então entre, vai ser bom ter companhia para variar. – o velho rir exibindo os dentes podres e cheios de resíduos de fumo.
A cabana fede a suor e fumo. Não há cama, apenas uma mesa de madeira, um banco e uma rede. Ele deixa a mochila no canto menos sujo e se acomoda no banco. O velho acende outra lamparina.
- Então você é turista?
- Sim, moramos no Rio de Janeiro e estamos passeando no interior.
- Ta gostando, moço? – o sotaque do velho é forte.
- Adorando, o Brasil realmente é lindo e ainda não nos demos conta disso.
- Pois é. – o velho acende o cachimbo.
- O senhor vive aqui sozinho nesse lugar deserto distante de tudo?
- Sim! – dá uma tragada.
- Não sente medo?
- Não, não ligo para essas coisas. Como chama o moço?
- Roberto, mas, pode me chamar de Beto.
- Hum. Então, quer comer?
- Adoraria. – alisa a barriga.
- Vou colocar no prato pro moço então.
Minutos depois o velho volta da cozinha com um prato feito de madeira com um pedaço generoso de carne suína suculenta.
- Bom apetite moço.
- Obrigado.
Beto come com voracidade. Ele deve confessar, tudo muito gorduroso, mas não importa, o que vale é encher a pança.
- Obrigado, eu estava mesmo com fome.
- Bom, agora vamos dormir, a hora já é avançada não é mesmo? – mais uma vez o velho negro rir mostrando os dentes. Beto sente um forte enjoo.
O velho dormiu na rede e Beto se acomodou no banco duro. Em menos de vinte minutos ele pega no sono. Beto praticamente desmaiou devido ao cansaço.
Beto sonha profundamente quando ele sente alguém o cutucar. Lentamente ele abre os olhos e contempla um homem de quepe e uniforme. Olha pela janela e já é dia:
- Moço, o senhor por um acaso chama-se Roberto?
- Sim, por que?
- Ufa, por fim o encontramos. – o homem grita. – ele está aqui, podem entrar.
- Passei a noite aqui com o velho.
- Velho? Qual velho? – o homem franze a testa.
- Um velho negro de barba branca com os dentes podres fumando cachimbo.
Nesse momento o grupo de Beto entra e sua namorada o abraça.
- Amor por onde andou, tivemos que chamar a policia local para lhe procurar.
- Passei a noite aqui com um velho. – o policial rir.
- Roberto, ninguém mora aqui tem mais de cem anos, aqui foi residência de um escravo, morava sozinho depois que a escravidão acabou. – Beto coça a cabeça.
- Mas, mas ele conversou comigo, eu não estou louco, ele me deu comida, carne de porco.
- Sim, tal escravo criava porcos aqui, mas isso tem mais de cem anos. – indaga o policial. – vamos embora, nosso serviço por aqui terminou, vamos.
Beto sai da casa e se junta ao seu grupo. Entra na van e pela janela contempla a cabana feia, velha e sombria. FIM.
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