sexta-feira, 29 de abril de 2016

Uma emboscada para o Diabo



 Gerson perdeu seu pai vitima da bebida, era uma dose dupla de manhã, á tarde antes do almoço e a noite, juntos com os amigos de bar. Ele também perdeu sua irmã, Maria que se perdeu na vida e se tornou uma das prostitutas mais requisitadas do interior. Seu irmão Afonso foi morto com vinte tiros por um matador de aluguel. Sua mãe, dona Jussara, morreu de desgosto. O coração de velha lavadeira não aguentou e explodiu e a velha foi encontrada morta no rio onde lavava as peças de roupa. Como um bom Cristão, Gerson não culpou Deus por todas essas desgraças em sua vida e sim o diabo. Convicto disso, Gerson se juntou a Beto, um rapaz loiro, magro e que sabe como ninguém manusear uma garrucha. Os dois querem acertar as contas com o diabo e ambos preparam uma emboscada. Gerson é o mais empolgado.
     - É hora desse cão miúdo pagar pelo mal que ele fez a todo mundo, Beto.
     - Como pensa em fazer isso Gerson, o diabo é um bicho esperto.
     - Pode deixar comigo companheiro, sei onde ele mora. – Beto arqueia uma das sobrancelhas.
     - Como assim, você sabe onde o bicho ruim mora?
     - Simples, lá perto das montanhas tem uma gruta horrível e desde pequeno minha falecida mãe, que Deus a tenha, dizia que o diabo morava lá, então fiado nisso vamos pra lá e esperar que o cão do inferno saia para fazer as maldades dele e ai então, você que atira bem mete uma bala na testa dele.
     - Você acha que será tão fácil assim?
     - Claro Beto, porque?
     - Porquê, vai dar certo homem não duvide não. Então tá combinado, a tardinha quando começar a escurecer vamos pra lá entendeu?
     - Sim.

***

    O céu já dá seu tom alaranjado esperando a noite assumir o dia de sol quente. Numa estrada de barro, dois homens caminham lado a lado. Um com uma espingarda apoiada no ombro e outro com uma cruz na mão direita feita de galho de árvore. O lugar é deserto e o pouco vento que corre por ali é quente. Gerson anda arrastando seu chinelo havaianas amarelo e branco junto com a calça desbotada marrom. O cheiro de suor já impregnou em suas vestes e seu chapéu torno na cabeça mostra que ele é um sujeito matuto típico do interior. Já Beto é diferente, usa calça jeans e camisa de manga curta. Na pouca luz os olhos do rapaz parecem menos azuis do que de costume. Beto é um garoto bonito para as características do lugar. Gerson o conheceu num bar perto de sua casa onde começaram a conversar e assim se tornaram amigos.
    A noite chegou e também os destemidos caçadores do diabo. Realmente o lugar é terrível. A gruta é de dar medo no mais valente homem daquelas bandas. Gerson sente frio mesmo sendo verão causticante. Os dois se olham.
    - Então Gerson, ainda quer prosseguir com o plano.
    - Claro, vamos subir e nos esconder.
    - Onde?
    - Lá, na porta da gruta. – Beto engole seco.
    - Você quem manda.

       Depois de muito suor e cansaço os dois heróis do sertão chegam á boca da gruta de onde vem ruídos horripilantes. Gerson e Beto se escondem atrás de uma rocha lascada. Imediatamente Beto carrega sua espingarda com uma rolimã novinha em folha. Gerson retira do bolso um maço de cigarro com dois últimos cigarros.
      - Quer um parceiro?
      - Claro uai. – Um pássaro noturno os assusta e Gerson empurra Beto que se jogou em cima dele.
      - Sai pra lá homem, se ainda fosse uma cabrocha peituda ainda ia.- os dois riem baixinho
      O tempo vai passando e a paciência também. Gerson olha atentamente para a gruta e Beto se recosta na rocha fumando seu cigarro.
      - Gerson. – chama Beto.
      - Fala cabra!
      - Trouxe a cachaça?
      - Eita caramba esqueci, foi mal.
      - Merda!
      - Lá vem ele Beto, já escuto os passos, se prepare. – Beto se vira e aponta a espingarda na direção da gruta. As respirações se misturam e o barulho dos passos chegam a boca da caverna assombrada. – você vai pagar pelo que fez com a minha família seu cão miúdo da disgrama, mata ele agora Beto. – o som da espingarda disparando ecoa nas montanhas e o que se vê depois é o corpo de Gerson caído com a cabeça esfacelada vazando miolo cinza. Beto se levanta e chama seu cachorro feroz que mais parece um urso de dentro da gruta. Sua face já não é dócil como de antes. Em sua testa duas saliências se formaram, uma em cada ponta, um pequeno chifre. Seus olhos de azuis passaram a ser vermelhos e os dentes pontiagudos como de peixe. O cão do inferno chega e começa a lamber o ferimento do pobre Gerson.
    - Agora você vê só, um rola bosta como esse querer me punir, ra, ra,ra. Nunca.
    Na estrada um homem em seu cavalo ruma em direção á cidadezinha. Beto o olha e rir.
    - Entre furioso, o papai vai trazer mais carne fresca pra você mais tarde.

Fim

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