Traição é um ato tão nojento, tão sujo, que há quem acredite que
possa ser passado de pai para filho. Uma maldição que se não for quebrada, gerações
inteiras podem ser assoladas por esse terrível mau. Gilberto deixou o
estacionamento do colégio com o coração disparado depois do telefonema de sua
ex mulher o pedindo que fosse aonde eles até certo tempo atrás chamavam de lar
dos Pedrosa. O que ela quer agora, terminar de jogar às coisas na minha
cara?
Estaria ele fadado a essa maldição até a sua saída desse
mundo? Seu filho Gerson também será mais um que destruirá sua vida conjugal por
um rabo de saia? O que vem sentindo na pele Gil não deseja nem para o seu mais
terrível inimigo. O carro parou na calçada. Na tentativa de controlar seu
nervosismo ele contou de um a dez e desceu. Bete o aguardava do lado de fora do
prédio. Sua expressão não era nada amistosa.
— Oi? — Gilberto manteve a distância.
— Prometo não tomar muito o seu tempo.
— Tudo bem. Vamos subir?
— A Carla está com as amigas resolvendo coisas da
apresentação na escola e o Gerson jogando no quarto com dois coleguinhas,
então...
— Você quer ir para algum lugar mais reservado?
Elisabete andou em direção ao veículo do ex marido.
— Vamos. Eu te falo no caminho.
Minutos depois lá estavam os dois caminhando lado a lado e em
silêncio pelos caminhos estreitos do parque de Cabo Verde onde nos finais de
semana ou feriados famílias inteiras passam o dia entre piqueniques e a prática
de esportes. A cada cinquenta metros há bancos de madeira pintados de branco e
um bebedouro ao lado. Por ser meio de semana e nem ser um dia festivo, o lugar
encontra-se vazio e silencioso. Os ex casados pararam perto de uma amendoeira e
ali ficaram. Bete não parecia muito a vontade, vez por outra ela olhava para
ambas as direções do parque. Gil era a tensão em pessoa. De repente ele viu a
mão dela vindo em direção ao seu rosto e se chocando contra ele. O tapa o
deixou sem rumo por alguns segundos.
— Posso saber o que significa isso? — perguntou esfregando o
local da agressão.
— Nossa! Que alívio, que sensação. Alma lavada.
Pedrosa tentava ao máximo processar o porque da agressão e
mesmo enfurecido ele se manteve com a guarda baixa. Quando seus pensamentos
ficaram em ordem ele a olhou nos olhos e não viu um pingo sequer de
arrependimento.
— O que foi isso, Bete? — perguntou com mansidão.
— Você é o pior ser humano da face da terra, Beto. — os olhos
começaram a umedecer. — você foi morar com ela.
Outra surpresa e em sequência outra confusão mental. Gil
estava pasmo, como as notícias voam.
— Quem lhe contou isso?
— Não interessa. Seja homem e fale a verdade. — o tom de voz
de Bete começara a se alterar.
— Fala baixo, por favor! Quem lhe contou realmente não me
interessa. O que de fato importa é: por que me trouxe aqui, para me agredir?
Elisabete mergulhou numa crise de choro tão comovente que
contagiou ao investigador. Bete queria parar mas era maior e mais forte do que
ela. O mal foi acreditar que, o
esbofeteando a dor, a mágoa, o ressentimento passariam instantaneamente,
mas o efeito foi contrário.
— Me leve de volta pra casa.
*
O lugar é uma galeria onde há mais centros de jogos
eletrônicos do que qualquer outra coisa. E aonde há modernidade, ali também há
um volume expressivo de jovens. Prato cheio para um aliciador como Toni Silva.
Especialmente hoje ele veio mais atraente que nós outros dias. Cabelos negros
soltos, camisa preta de mangas compridas, porém dobradas na altura dos cotovelos.
Calça jeans e sapatênis marrom. O cara estava irresistível. Ele olhava, ou
fingia olhar algo em seu telefone quando duas meninas de no máximo dezesseis
anos passaram esbanjando beleza e sensualidade a todos os presentes. Toni as
marcou e em seguida foi atrás. Para não dar pinta ele parou em um certo ponto
da loja de artigos femininos e simulou estar interessado em algumas maletas
completas de maquiagem. Uma das garotas passou e ele a abordou.
— Com licença! Qual dessas você levaria?
— Não sei! Talvez essa. — apontou para a mais cara.
— Nossa, mas o valor é alto.
Nesse ínterim a outra se juntou aos dois e ali Toni lançou
todo o seu poder de persuasão as fazendo acreditar que realmente ele estava ali
para a compra do produto. Uma hora depois de levá-las para lanchar e jogar
conversa fora o bonitão deixava o estabelecimento feliz por obter mais uma
“pescaria” com sucesso e põe sucesso nisso. Conseguir duas presas nunca foi tão
fácil.
— Para onde vamos agora? — perguntou a mais morena.
— Vou levá-las para uma viagem alucinante. — abriu a porta do
carro.
— Tem certeza, eu não curto drogas. — retrucou a loira.
— E quem falou em drogas? O meu lance é drinks, gata. Entra
aí, pode confiar.
Elas embarcaram no Fiat Punto preto de Toni sendo observadas bem
de longe por Gil Pedrosa que já havia anotado a placa e até batido algumas
fotos. Tudo isso feito, ele ligou para Rodrigues.
— Localizei o Toni.
— Tem certeza?
— Tudo leva a crer que sim. Já te enviei às fotos. Vou
precisar de apoio.
— Positivo! Estou vendo elas aqui e é bem parecido com o
desenho que temos. Te encontro aonde?
— Eles estão saindo. No caminho lhe mando minha localização.
— No aguardo.
*
O veículo de Toni deixou a avenida principal e entrou numa
via sentido zona de mata de Cabo Verde. Dez minutos depois o carro quebrou para
uma estrada de barro e parou cinco minutos após adentrar a imensidão verde.
— O que aconteceu, por que paramos aqui? — questionou a
morena.
— A partir desse ponto temos que seguir a pé. — Toni desligou
o motor do carro e desceu.
— Hum! Não estou gostando nada dessa história. — continuou a
morena.
— Ah, para de ser chata, já estamos aqui mesmo. Vamos.
A outra olhou para Toni Silva e deu de ombros. O trio seguiu
estrada a cima até chegarem em uma casa abandona com suas paredes bem
deterioradas.
— Chegamos! — comemorou Toni com os braços abertos.
— O que, chegamos aonde, é aqui que você mora? — outra vez a
moreninha.
Toni começava a perder a paciência com ela, mas de forma
alguma ele demonstrou isso.
— Não! Claro que não. Aqui é aonde me divirto com meus
melhores amigos.
A cada passo dado a casa se mostra cada vez mais sombria e
intrigante. No alto do que um dia fora uma varanda há o ano de sua construção:
1920. Bota tempo nisso. Às duas mocinhas não se desgrudavam imaginando que tipo
de gente viveu ali e como era viver nos anos vinte. Ao subirem os cinco degraus
da escada que leva a porta de entrada Toni girou nos calcanhares e às advertiu.
— Vocês estão prestes a vislumbrar o maior reino já constituído
entre essas paredes, meninas. Peço que contenham seus olhares e evitem tecer
algum comentário estamos entendidos?
Assentiram simultaneamente.
— Ótimo! — com os nós dos dedos o cabeludo tocou cinco vez na
madeira bruta da porta.
Aos poucos a porta foi se abrindo e lá de dentro uma mistura
horrenda de odores fez com que uma das garotas fosse acometida por fortes
náuseas.
— Sem manifestações desse tipo, por favor, recomponha-se. —
abriu passagem.
Nicotina, maconha e carne apodrecida, sem falar da escuridão e
o abafamento. Essas coisas eram quase palpáveis ali dentro. A verdadeira
antessala do inferno. Quando seus olhos se adaptaram ao breu foi possível constatar
a presença de pessoas amontoadas ao redor de uma poltrona onde há algo ou
alguém acomodado. Toni, sem pedir licença pisoteou algumas pessoas como se elas
fossem tapete até conseguir se aproximar de quem estava na poltrona.
— Temos visita minha rainha.
A mais morena estreitou bem os olhos e viu que se tratava de
uma mulher usando drag e rosto minúsculo.
— Rainha? — estranhou a mais clara.
Toni se afastou do “ trono” e andou apressadamente tropeçando
nos corpos deitados naquele chão nojento e às repreendeu duramente.
— A rainha Sabrina detesta que façam esses tipos de
comentários, pelo visto vocês não entenderam minhas recomendações, não é?
— Podemos saber o que está acontecendo aqui? — vociferou a
morena.
Nesse momento a porta de entrada logo atrás delas foi fechada
trazendo ao ambiente a sensação de estar literalmente no inferno. Às duas
garotas se agarram aos gritos irritando ao súdito de Sabrina que as tomou pelos
braços.
— Já chega desse espetáculo. Venham comigo agora.
— Para onde vai nos levar? — questionou a morena.
— Eu já estou cansada de vocês. — disse bem perto do seu
rosto.
Imediatamente alguns dos que estavam presentes ali na sala
saíram em auxílio a Toni Silva conduzindo aos empurrões as meninas até um outro
cômodo onde o mau cheiro era ainda pior que o da sala.
— Meu Deus, o que tem aqui dentro? — cuspiu.
— Vocês ficarão quietinhas aqui enquanto eu converso com
nossa rainha.
A morena tentou resistir ao cárcere porém sofreu uma agressão
no rosto que, devido ao breu ela não soube se defender, muito menos soube quem
a agrediu. Elas foram jogadas dentro daquele lugar imundo de chão molhado e
paredes frias. Se arrependimento matasse...
Bete vingou todas nós com esse tapão no Gil kkkkk pena que isso não adianta muita coisa! Tá boa demais essa história!
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