quinta-feira, 26 de maio de 2016

HEMORRAGIA (Série completa)


O pecado


Ela tenta se livrar das mãos enormes que prendem seus braços. Com as pernas ela tenta acertar as partes baixas do homem que insiste em mordê-la no pescoço. A violência empregada no ataque fez com que a mulher caísse já sem defesa. Os machucados nos joelhos e cotovelos demonstram a voracidade do ataque da criatura. O que fazer agora? A luta pela vida deve continuar? Quero mesmo sobreviver? Enquanto gira a cabeça para não ser sugada, Miriam repassa sua vida em sua mente. Arrependimentos, decisões tomadas por puro ímpeto e amores que a fizeram chorar em todas as madrugadas. Qual o seu pecado então? Miriam cometeu diversos pecados. Um deles foi ter saído à noite mesmo sabendo do perigo que corria.

Tarde demais para voltar atrás. As presas do vampiro já entraram em contato com sua carne e agora os lábios da criatura sugam seu precioso sangue com força. Ainda há esperança para Miriam? Conseguiria ela se safar de tão mortal ataque? Ela tenta chutar mais uma vez as partes baixas do demônio, em vão. Deitado sobre ela o vampiro rosna ao sentir o sangue quente descer por sua garganta. Com certeza ela morrerá, disso ela não tem duvida. A questão é; para onde irei depois disso? Céu, ou inferno? Fui uma boa pessoa?

Sentindo sua vida se esvair, Miriam ainda tenta virar o pescoço. Um erro gravíssimo, aliás, mais um de seus erros na vida. A virada do pescoço só serviu para acender ainda mais o desejo do vampiro que a morde mais uma vez. Miriam não grita, sua voz não sai. A secura na garganta anuncia que seu fim está próximo. Os olhos reviram e a sequencia de espasmos se inicia. Adeus mundo maldito, adeus mãe, pai e irmão, adeus Marcos seu traste, obrigado por me fazer tão infeliz.

O corpo esbelto de Miriam é encontrado pela manhã por pessoas que circulam por aquele parque sucateado. Curiosos se aglomeram tentando dar uma espiada no presunto fresco. A policia chega e cobre a infeliz com um saco preto de corpos. Um policial abre sua bolsa tira colo e saca de lá o celular. O ultimo número para o qual a vitima ligou é discado. Ao terceiro toque um homem atende ainda sonolento.
              - Oi Miriam o que houve, fiquei te esperando a noite inteira?
              - Oi, bom dia, aqui é o policial Bastos...
Fim

A máscara


             O baile teve inicio exatamente às duas da manhã. A casa é imensa com seus lustres e móveis pra lá de luxuosos. O salão principal está repleto de convidados com suas indumentárias típica da época. As mulheres com seus vestidos decorados, pesados e rodados. Os homens com suas casacas batendo na altura da canela dançam elegantemente ao som de um violino bastante afinado. A comida é regada. Uma enorme mesa oferece aos convidados um banquete digno de rei. Todos estão à vontade na sala dançando com seus pares. Alguns degustam das delicias ali oferecidas. Mas, a maior atração da madrugada não é o baile e nem a comida. E sim o senhor da escuridão. O ser apavorante. Segundo a lenda ele surgirá descendo a escada e chamará a mais bela das mulheres para uma dança.

           Todas as mulheres capricharam na vestimenta e abusaram do decote deixando os homens com água na boca só de olhar. O relógio marca três e até agora nada do mestre da noite. Todos dançam e conversam. Uma donzela de olhos azuis como o céu e pele branca macia olha para a escada e seus olhos contemplam um homem de pé. Uma máscara oculta seu rosto. Sem fôlego ela alerta aos demais quanto à presença marcante da figura. A musica para e os passos de dança também. O silêncio é sepulcral. Todos prendem a respiração enquanto o homem mediano desce lentamente as escadas. A capa negra vem varrendo todo o chão lustroso. Os cabelos umedecidos com um tipo de óleo o deixa mais atraente. Pela máscara ele vislumbra Marta a menina de olhos azuis como o céu. As outras donzelas aguardam o desenrolar da situação. O homem se aproxima de Marta e a toca no queixo.
           - Quer ser minha esposa?
           Marta engole em seco e nada responde.
           - Você se tornará minha condessa e viverá eternamente.
           Marta abre um sorriso tímido.
           - Posso ver seu rosto?
           Insatisfeito com o pedido o tal homem tenta convencê-la a mudar de ideia.
           - Veja o lado bom minha cara, você não precisará mais de ninguém, serás rica a meu lado, jamais morreremos.
           - Ah, meu caro conde, como eu gostaria de passar toda a eternidade a seu lado.
           - Qual o seu nome minha condessa?
           - Marta!
           Com um estalar de falanges do mascarado a música volta e ele a convida para dançar. Próximo das quatro da manhã o mascarado vocifera.
           - É chegado o grande momento em que eu, conde Drácula irei me casar. – com delicadeza ele tomba a cabeça deixando pescoço de Marta livre e quase salivando ele vê a jugular pulsando. O violinista toca uma canção frenética enquanto Drácula crava seus dentes na pele branca de Marta que faz uma expressão de dor. O vampiro rei suga apenas o suficiente para matar a sede. Outra vez ele estala as falanges e a música frenética para abruptamente.
           - Seja bem vinda ao mundo dos mortos minha condessa.
           Após essas palavras todos inclusive o violinista se transformam em criaturas horrendas e voam tomando o céu negro pelas janelas. Drácula e sua condessa permanecem no salão.
           - Uma dança minha esposa?
           - Sem música?
           - A música tem esse poder, você pode imaginá-la.
           Lentamente eles dançam no silêncio no salão vazio numa noite tenebrosa.
Fim

A meretriz

           Seu verdadeiro nome é Lucia, porém como profissional do sexo é Loba. Depois de atender seu segundo cliente da noite seu celular toca e uma voz rouca a faz imaginar coisas:
           - Alô, quem deseja os serviços da Loba?
           - Boa noite, quanto está para uma hora?
           - Só uma hora com a Loba? – cospe o chiclete.
           - Sim!
           - Cem reais. – acende mais um cigarro.
           - Feito, eu estou na rua 15 apartamento 8

            Abandonando seu apartamento ela se desloca com seu andar de modelo e seu vestido justo. O lugar não é muito distante, durante o percurso ele rejeita vários outros programas dando prioridade à voz misteriosa.
            Finalmente Loba chega ao local. Um prédio modesto. Ela passa pela portaria sem ser percebida. Não há elevador. Loba xinga. No quarto andar ela já está com um palmo de língua pra fora. Resultado de alguns anos de fumo. Finalmente o oitavo andar. Seus grandes olhos negros contemplam o apartamento oito. Seus dedos finos tocam a campainha berrante. Alguns segundos depois um homem alto, pálido e de olhos azuis atende nu.
           - Opa, já estamos assim? – Loba comenta com sua voz aguda enjoada.
           - Entre e antes que eu me esqueça, toma aqui seu dinheiro.
           - Gostei de você, branco, tenho certeza que você não irá se arrepender.

           O programa demorou além do acordado. Pra falar a verdade Loba passou a noite ali. O misterioso homem a possuiu até a mulher morrer de exaustão. A policia a encontrou em um estado lastimável, com os olhos saltados e língua para fora da boca. Uma imagem terrível. Além de duas perfurações no pescoço.

Guerra

             A noite começa vencer o dia. O dia foi chuvoso, cinzento. O líder da resistência humana contra os noturnos se reúne com seus homens. Alguns armados com crucifixos e outros com armas de bala de prata. Será o ultimo depois de alguns longos anos de agonia. Anos sem poder sair à noite com tranqüilidade. Anos sofrendo com essa casta maldita de sugadores de sangue. Hoje os humanos resolveram dar fim a todo esse sofrimento. Venâncio fala com veemência com seus liderados e pede atitude e gana.
             - Só assim sairemos vencedores!
             Já em seus veículos, os homens deixam a base para irem de encontro aos demônios da noite. Alguns deles rezam pedindo proteção aos céus por suas vidas. Outros vibram declarando vitória antes o tempo. O condutor do carro de Venâncio pilota com se fosse um fugitivo.

             No aguardo do combate estão os malignos vampiros com seus dentes pontiagudos. Dessa vez não haverá misericórdia e nem compaixão, se é que um dia houve. Hoje será diferente, o ultimo combate, a ultima guerra, será forte demais. Já é possível ouvir o barulho dos motores se aproximando ensurdecedores. O sangue vai jorrar.

             Da arma de Venâncio é disparada a primeira de muitas balas de prata acertando o demônio na cabeça. O corpo cai e se transforma em cinzas incandescentes. Os homens vibram.
              - O primeiro já foi pro saco.
              Em seguida uma revoada tem inicio. Como pássaros cobrindo o céu, os vampiros contra atacam os humanos. Logo o confronto se mostra violento e sem controle. Um dos guerreiros de Venâncio tem o braço mordido quase decepado. Gritando horrores o homem cai do carro segurando o que restou de seu membro superior. Um deles com uma facão banhado de prata atinge o noturno no alto do crânio espalhando massa por todo lado. Dois vampiros devoram um senhor que mesmo com suas carnes na boca dos malditos, ainda tenta lutar, porém a dor é maior e ele se entrega.

              Um sujeito negro mal encarado possuindo uma foice também banhada na prata, usa de sua habilidade cortando dois vampiros com um só golpe. Outros dois noturnos se aproximam. O negro gira o corpo e decepa a cabeça de um deles. O outro ele soca a cara quebrando lhe o nariz e em seguida crava a foice em seu tórax.
               As armas disparam sem parar derrubando dezenas de uma só vez. Claro que a baixa humana é significativa, mas a diabólica é maior. Cortes profundos, mordidas mortais, golpes violentos na cabeça e muita gritaria. Observando com cuidado é possível ver um garoto cravando descontroladamente sua lança improvisada varias vezes num maldito já em cinzas. O ódio rege sua vida.

              Venâncio briga feio com um vampiro magrelo cheio de veias negras no rosto fino. O bicho por varias vezes tentou sugá-lo. Venâncio o acertou bem no queixo deslocando seu maxilar. O vampiro gritou ao sentir a força do golpe. Logo o líder sacou sua arma e atirou no olho do verme que caiu em espasmos. Enquanto partia para o próximo embate, Venâncio foi surpreendido por um ser alto, forte que tinha chamas nos olhos, quem seria ele? O soco no rosto do chefe foi tão intenso que foi possível ouvir o estalido do osso. Venâncio cai segurando o rosto inchado. O gancho o faz girar e cair novamente. O sangue escorre do nariz e boca do líder que sente uma forte dor na cabeça. Um, dois, três, quatro socos fortíssimos e os olhos do homem começam a ficar turvos. Venâncio está fora de combate não falando coisa com coisa. Vendo seu oponente se aproximar para finalizá-lo ele ora entregando sua vida nas mãos de Deus. o ser o puxa pelos cabelos e o ergue até ficar cara a cara.
             - Nem Deus te livrará da morte. – a voz do bicho é pastosa e grave.
             O bicho vai socando, socando até não existir mais rosto. O corpo do chefe é deixado no chão. Como era previsto os humanos foram perdendo as forças. Devorados até os ossos, os homens perdem a guerra para os vampiros. Os que restaram foram levados cativos. Certamente vão se tornar vampiros como eles. Teria a humanidade alguma chance?

Esse foi o ultimo capítulo da série HEMORRAGIA. Obrigado a cada um que acompanhou.      



Nenhum comentário:

Postar um comentário