quinta-feira, 19 de maio de 2016

O misterioso quadro do General Sampaio Paiva


É madrugada. A viúva desperta do sono devido a uma crise de tosse. Sente sede. Hesita em se levantar por causa da forte dor nas costas. Neuza se revira na cama até poder tocar seus pés no chão gelado. Mais tosse e ela se curva para se apoiar na cabeceira. Passando pela sala ela dá uma olhada para o quadro que ocupa metade da parede. Pintado com perfeição está seu finado marido, o general Sampaio Paiva. Cabelos cortados rente ao couro cabeludo. Bem barbeado e vestindo seu traje de gala do exército Brasileiro. Para Neuza ele sempre será o Augusto, o grande amor de sua vida.
         Ao voltar da cozinha trazendo na mão o copo com água, Neuza volta a olhar para o quadro com uma certa tristeza – por que você se foi? – o general parece sorrir para ela. Neuza não se espanta, pelo contrario, adora quando ele faz isso.
          A velha Neuza volta para a solidão do quarto e se deita. Logo as lembranças gostosas vêem a tona lhe fazendo rir. Augusto era durão com seus comandados, porém dentro de casa não passava de um marido amoroso e um pai dedicado.
           Em 1940 eles se conheceram. O jovem e futuro general ostentava uma bela forma física, coisa que encantou a exuberante Neuza. Faziam sexo todos os dias escondidos dos pais dela. Até que a jovem engravidou e teve que deixar o lar para morar com Augusto.
           A espera de seu primeiro filho, Augusto, numa das muitas declarações de amor falou que o seu amor por ela atravessaria a linha da morte, e ela acreditou, acredita até hoje. Em reuniões de família, Neuza sempre declara que seu amado irá voltar para seus braços. Todos acham que tudo não passa de uma ilusão, que Neuza está esclerosada devido à idade.
           - Mamãe precisa fazer um tratamento. – diz o filho caçula.
           - Que nada, é coisa de velho mesmo. – fala o mais velho.
           - Acho que ela não pode mais viver sozinha nessa casa enorme. – completa a filha do meio.
           Neuza escuta os cochichos e repreende os filhos.
           - Não estou louca se é o que estão pensando, o pai de vocês me prometeu que voltaria. – a filha a abraça.
           - Mãe, por favor, o pai morreu, ninguém volta da morte, aceite isso.
           - O general Sampaio Paiva vai voltar. – resmunga a velha.

           O relógio marca três da madrugada e finalmente Neuza cria coragem para se levantar mais uma vez. Chegando a sala ela olha para o quadro. O general agora tem uma expressão fria. Ela alisa o rosto e olha mais uma vez. Sampaio Paiva agora tem a face mais tranquila:
           - Criei coragem meu amor. – afasta o quadro revelando um pequeno cofre. – confesso que ainda estou receosa. - Ela gira a chave seletora para direita e depois duas vezes para esquerda. Num estalido surdo o cofre se abre e ela pega um pedaço de papel. O observa por alguns segundos. Vai até a cozinha e pega uma vela. Volta para a sala e abre a janela. O vento fresco da madrugada deixa seus cabelos esvoaçantes. Neuza acende a vela e começa a recitar o que está escrito no papel:
          - Que ao queimar, a fumaça o traga de volta. – queima o papel e a fumaça é levada pelo vento até desaparecer.
          Depois de fechar a janela, Neuza volta para a cama e fecha os olhos. Minutos depois alguém bate com força na porta duas vezes. Ela sorrir e se levanta o mais rápido que pode. Com as mãos trêmulas ele enfia a chave na fechadura e gira. Neuza abre a porta e em pé, parado, com seu uniforme de gala do exército com o qual foi sepultado está o general Sampaio Paiva.  FIM        


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